Caminhada das Flores prestou solidariedade aos atingidos um ano após tragédia climática no RS

No sábado, dia 3 de maio, foi realizada a Caminhada das Flores, como uma homenagem aos atingidos, aos voluntários e a todos que resistiram ao desastre climático de 2024. O ato clamou por uma cidade mais resiliente e atenta às mudanças climáticas, com a participação de representantes de diversas instituições da capital gaúcha. 

A iniciativa do Coletivo POA Inquieta partiu do Paço Municipal, indo pela Avenida Mauá até a escultura em homenagem aos Heróis Voluntários, próxima à Usina do Gasômetro. Na chegada, Beatriz Gonçalves Pereira, mais conhecida como Mãe Bia, liderança comunitária da Ilha da Pintada, convidou a todos a entoar o Canto das Três Raças, eternizado na voz de Clara Nunes.

Depois do momento emocionante conduzido pela Mestra Yalorixá, todos colocaram suas flores ao pé da escultura, simbolizando as intenções da caminhada. Foi um ato que reuniu gente de vários lugares da cidade, do Morro da Cruz às Três Figueiras. Cerca de uma centena de pessoas participou da atividade.

Caminhada reuniu gente de vários lugares da cidade, do Morro da Cruz às Três Figueiras – Foto: Jorge Leão

Vários voluntários que atuaram em projetos durante a inundação marcaram presença, entre eles, representantes da Reafro, do Ilhota Hub, do Abrigo Emergencial 60+, do Brasil sem Frestas, da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Grupo Vagalumes de psicólogas voluntárias, Associação de Mulheres Executivas do Turismo, do Pacto Alegre, Associação dos Usuários de Informática e Telecomunicações do RS, entre outras.

O Coletivo POA Inquieta tem como propósito unir pessoas que querem fazer algo positivo pela cidade. Durante a inundação de 2024, foi um hub de conexões no qual surgiram várias iniciativas para amenizar a dor de muita gente. Um dos projetos foi o “Escuta que faz bem”, no qual mil pessoas foram atendidas em tendas montadas em diversos pontos de Porto Alegre e região. Com base na experiência de Medellin, nas tendas, conhecidas como “escuchaderos”, as escutadoras faziam o acolhimento de pessoas, ouvindo seus desabafos perante o momento. Mais de 80 escutadoras participaram desse movimento.

César Paz, articulador do grupo e um dos organizadores do ato, explicou que o evento teve dois objetivos principais: prestar solidariedade às pessoas atingidas pelas enchentes e chamar a atenção para a urgência de tornar Porto Alegre uma cidade resiliente. “Gostaríamos que, um ano depois, se uma enchente como a de 2024 ocorresse novamente, a cidade não fosse afetada da mesma forma. Mas sabemos que essa ainda não é a realidade”, afirmou.

César Paz é articulador do Coletivo POA Inquieta e um dos organizadores do ato – Foto: Jorge Leão

Segundo ele, embora os discursos sobre reconstrução e prevenção estejam presentes, os avanços na infraestrutura urbana seguem lentos. César destacou que a crítica não é direcionada a um governo específico, mas sim ao conjunto das esferas de poder que, segundo ele, tem sido ineficientes. “Um ano depois, ainda carecemos, do ponto de vista da infraestrutura, de condições reais para resistir às cheias. Lamentamos que tudo demore tanto”, disse.

Ele concluiu dizendo que os efeitos das enchentes não são apenas naturais, mas também sociais, e que é preciso alertar constantemente para isso. Com esperança, acredita que movimentos cívicos como o do dia 3 podem contribuir para que, em um futuro próximo, Porto Alegre se torne verdadeiramente preparada para enfrentar eventos extremos.

Para Cesar Paz, a ideia é repetir o programa o ano que vem para que ninguém se esqueça do que aconteceu na cidade. “Em 2026, vamos fazer essa caminhada ser o grande amálgama de todas as lideranças que amam nossa cidade. Será uma oportunidade única, pois vale sonhar ter todos juntos numa caminhada cívica que só o POA Inquieta pode propor”, declarou o empresário e ativista social.

Carla Elisabeth Stelter, responsável por trazer o projeto Brasil Sem Frestas para Porto Alegre em 2021, contou que o grupo atuou de forma significativa durante a enchente, principalmente ao fornecer placas de caixa de leite para proteger colchões em ginásios, devido à alta umidade nos abrigos. Após a crise, a iniciativa continuou atendendo não apenas as vítimas da enchente, mas todas as famílias em casas precárias de madeira com frestas.

Carla Elisabeth Stelter é responsável por trazer o projeto Brasil Sem Frestas para Porto Alegre em 2021 – Foto: Jorge Leão

“Encontramos muitas pessoas que, mesmo com suas casas invadidas pela água, voltaram a morar nelas. Muitas não tiveram apoio, ou o apoio não chegou diretamente. Por isso, temos sido chamados para revestir essas casinhas precárias, melhorando um pouco as condições de vida, evitando o frio, a umidade e até a entrada de insetos”, explicou Carla. “Basicamente, esse é o nosso trabalho hoje. A gente continua atendendo a população em geral e pretende continuar auxiliando, da maneira que puder, essas pessoas que, infelizmente, ainda não têm condições dignas de vida.”

Moradora da Ilha da Pintada, no bairro Arquipélago, Beatriz Gonçalves Pereira, conhecida como Bia da Ilha, relata que, mesmo um ano após a grande cheia, os impactos seguem evidentes no cotidiano das famílias atingidas. Para ela, a tragédia deixou marcas profundas e exigiu aprendizado, mas ainda há muito por ser feito, principalmente por parte do poder público.

Beatriz Gonçalves Pereira, conhecida como Bia da Ilha, relata que, mesmo um ano após a grande cheia, os impactos seguem evidentes no cotidiano das famílias atingidas – Foto: Jorge Leão

“Após um ano dessa inundação, dessa cheia, aqui estamos nós. Para dizer a verdade para vocês, foi um aprendizado. Um ano, e muitas coisas ainda não foram resolvidas. Muitas coisas por fazer. Muitas vidas ainda estão perdidas em abrigos. Muitas famílias ainda esperando e pensando o que poderão fazer das suas vidas”, desabafou Bia.

Ela conta que, assim como outras famílias da região, ainda tenta se recompor. “Falta muita coisa para fazer nos bairros e na cidade. Os governos terão que ter uma atenção maior, trabalhar melhor essa questão ambiental. Porto Alegre já está dizendo: é água”, alertou.

E questiona: “Como nós faremos daqui para frente? O que será feito daqui para frente, já que tantos bilhões e milhões vieram para o nosso estado? O que está sendo feito? O que eu vi até agora, muito pouco”.

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