Ancelotti é ‘bola dentro’ de Ednaldo na CBF, mas pode servir de cortina de fumaça, avalia José Trajano

A confirmação do italiano Carlo Ancelotti como o novo técnico da seleção brasileira foi recebida com entusiasmo pelo jornalista e comentarista esportivo José Trajano, mas também com cautela. Para ele, embora a escolha represente uma guinada positiva em meio à crise técnica e de identidade do futebol nacional, não se pode descartar que a contratação tenha sido usada como “cortina de fumaça” por Ednaldo Rodrigues, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), para desviar o foco das pressões por sua saída do cargo.

“Ednaldo é o mestre da ruindade, mas ele está dando uma bola dentro pela primeira vez. Talvez [a contratação] seja uma cortina de fumaça para apagar a possibilidade dele até ser destituído do cargo de presidente da CBF”, avaliou Trajano, em entrevista ao programa Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato.

O comentarista lembrou que a entidade vive uma de suas piores fases, com sucessivas gestões marcadas por escândalos e falta de rumo. “Ele fez certo, mas isso não apaga os desmandos escalados que existem na CBF”, pondera. 

Ancelotti será o quarto estrangeiro a comandar a seleção canarinho, e o primeiro em quase seis décadas. Apesar de seu vasto currículo à frente de clubes como Real Madrid, Milan e Bayern de Munique, o italiano jamais treinou uma seleção nacional. “É diferente ser técnico de time e ser técnico de seleção. Mas ele sabe administrar elencos estrelados”, analisou.

Fim de linha para os técnicos brasileiros?

A escolha de um estrangeiro reacendeu o debate sobre a desvalorização dos treinadores brasileiros. Trajano reconhece o incômodo de parte da opinião pública, mas defende que o momento exigia uma mudança.

“Tivemos uma série de treinadores brasileiros que não deram conta de comandar a seleção brasileira”, afirmou. Para ele, nomes como Dorival Júnior, recentemente demitido da seleção, ou Fernando Diniz, não apresentaram resultados nem carisma suficientes. “Pior do que está, não fica”, brinca. “Dorival saiu e ainda vai ganhar R$ 1 milhão por mês até a Copa. Aí vem o Ancelotti, que vai receber R$ 5 milhões. É escandaloso? É. O futebol é escandaloso mesmo.”

Embora Ancelotti nunca tenha comandado uma seleção, Trajano aponta uma vantagem: ele conhece parte do elenco brasileiro por já ter treinado jogadores como Vinícius Júnior, Rodrygo, Militão e Endrick no Real Madrid. “Facilita porque os jogadores falam bem dele, isso mostra que ele tem um convívio legal com esses jogadores”, reflete.

Sobre o atual momento da seleção, o comentarista é direto: “O torcedor brasileiro está distante da seleção brasileira. É claro que a seleção vai para a Copa, mas porque para a Copa do Mundo hoje até o time aqui da rua vai. […] A camisa mais pesada do mundo hoje em dia já perdeu muito da sua identidade.”

Apesar de preferir, em um primeiro momento, o português Jorge Jesus, que “conhece mais o futebol brasileiro, já esteve por aqui, foi vitorioso no Flamengo e é conhecido por grande parte da torcida brasileira”, Trajano acredita que o momento pede pragmatismo. “Não é que eu morra de amores por Carlo Ancelotti, mas acho que era necessário uma balançada, uma mudança, porque as coisas não estavam indo bem. Então veio um sujeito sóbrio, vencedor, que não tem experiência em seleção, mas tem muita experiência no futebol.”

A estreia de Ancelotti ainda não será imediata. Nos próximos amistosos contra Equador e Paraguai, a convocação contará com apoio da comissão permanente da CBF. “Vamos ver o que dá”, finaliza Trajano.

Avanço das casas de apostas ‘não tem volta’

O comentarista José Trajano também comentou o domínio das casas de apostas sobre o futebol nacional. Para ele, essa questão atingiu um ponto irreversível. “Eu encaro com tristeza isso que está acontecendo. Eu acho que não tem volta. Os clubes dependem disso, a CBF depende disso”, afirma. Ele critica o fato de que praticamente todas as equipes da Série A e a própria CBF estão patrocinadas por essas empresas. “A empresa esportiva tá coalhada disso, os anúncios estão por toda parte”, aponta.

Trajano também alerta para os impactos sociais da banalização das apostas. “Tem muitos casos de gente que entrou nessa achando que ia se dar bem e perdeu tudo. Isso mexe com a saúde mental, não é brincadeira”, disse. Segundo ele, o dinheiro das apostas tem gerado uma distorção no mercado esportivo, inflando patrocínios e criando desigualdades. “Essas casas contam com o apoio de gente muito poderosa”, lamenta. Enquanto isso, ele destaca, a promoção das casas de apostas “está levando o povo brasileiro a perder o seu dinheirinho sagrado do mês”.

Para ouvir e assistir

O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira, uma às 9h e outra às 17h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.

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