
Assaltos à luz do dia, celulares roubados dentro de ônibus, ação de traficantes, assassinatos. Para combater esses crimes, não há dúvida de que a polícia precisa estar nas ruas, fazendo rondas e abordando suspeitos.
No entanto, há armas na área de segurança pública que não são visíveis às pessoas, mas que têm feito diferença para transformar a realidade de um Estado que já foi o segundo mais violento do Brasil: tecnologia e inteligência.
Com reconhecimento facial, drones e rastreamento em tempo real, o Espírito Santo aposta na estratégia policial de se antecipar aos crimes e desmontar quadrilhas.
Um exemplo dessa estratégia é o caso da aposentada Creuza Griffo, que teve o celular furtado dentro de um ônibus logo após deixar o Terminal de Laranjeiras, na Serra.
“Puxaram meu celular de dentro da minha bolsa. Aproveitaram que o ônibus estava cheio e eu só percebi quando vagou um lugar e fui me sentar. Fiz boletim de ocorrência, mas sem esperanças”, conta.
Três meses após o furto, Creuza recebeu uma notícia que a surpreendeu:
Uma policial me ligou para avisar que tinham recuperado meu celular. Eu gritei de alegria. Até a policial me confessou que se arrepiou toda e também ficou muito feliz por mim.
Outra que também conseguiu recuperar o celular roubado foi a carpinteira Christina Santos. “Eu me tremi toda! Iria pagar oito prestações sem ter mais o celular, mas agora vou pagar com o aparelho em mãos. Não acredito até agora que recuperei o meu telefone, é um sonho”, celebra.
Christina e Creuza conseguiram os celulares de volta a partir do trabalho do Projeto Recupera, ferramenta para inibir roubos e furtos de aparelhos. O Recupera usa tecnologias avançadas de rastreamento e identificação para localizar os celulares.

ES já foi o segundo mais violento do país
O Espírito Santo já figurou como um dos estados com maior índice de violência, chegando a ser o segundo mais violento em 2011 – atrás somente de Alagoas. Na época, eram 48,2 homicídios por 100 mil habitantes.
Em 2024, o Estado chegou a 20,8 homicídios por 100 mil habitantes. Apesar de ainda expressivo, o dado representa 50% de redução em 13 anos.
Segundo o governo capixaba, a redução na violência se deve aos investimentos no trabalho de inteligência com embasamento técnico e científico. De 2019 para cá, cerca de R$ 1 bilhão foi investido no combate ao crime.
O delegado-geral da Polícia Civil do Espírito Santo, José Darcy Arruda, destaca principalmente o trabalho na área de tecnologia e de inteligência:
Nós tiramos a Polícia Civil do analógico e trouxemos para o digital. Nosso objetivo é entregar para a sociedade o nosso produto, que é justamente o inquérito policial muito bem feito para que aquela pessoa que cometeu um crime, que mata um ente querido, que rouba, que faz tráfico, pague pelo que cometeu.
Criminoso mais procurado é preso
O trabalho de inteligência policial possibilitou, por exemplo, realizar prisões importantes, como a registrada em março de 2024, quando o traficante Fernando Moraes Pereira Pimenta, o “Marujo”, foi preso no bairro Bonfim, em Vitória.

Marujo era considerado o criminoso mais procurado do Espírito Santo e há anos estava foragido. Ele é apontado pela polícia como o chefe do grupo criminoso que comanda o tráfico de drogas no Complexo da Penha e uma das lideranças do Primeiro Comando de Vitória (PCV).
Mais de um ano depois, em abril deste ano, a partir do trabalho de inteligência policial, forças de Segurança Pública deflagraram a operação Marujada para desarticular a organização criminosa liderada por Marujo.
Foram presos quatro subordinados do traficante, entre eles Jean Finamore Bento, conhecido como “Boca de Lata“. Ele é apontado pela polícia como gerente do tráfico de drogas no Bairro da Penha, em Vitória, e também estava na lista dos mais procurados do Estado.
Ferramentas para combate ao crime
Uma das táticas nas operações de inteligência é atuar com diversas forças de segurança de forma integrada.
A operação Marujada, por exemplo, contou com policiais do Centro de Inteligência e Análise Telemática (Ciat), das Delegacias Especializadas e da Subsecretaria de Inteligência (Sei) da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp), e também equipes da Coordenadoria de Operações e Recursos Especiais (Core) e da Polícia Penal do Espírito Santo (PPES).
O delegado-geral da Polícia Civil avalia como grande aliado o trabalho de inteligência da Telemática, que é um centro voltado ao enfrentamento do crime organizado com base em investigações mais sofisticadas
“Hoje a ocorrência chega em uma regional, o policial abre a tela, imediatamente é chamado aqui na Central. O delegado abre e faz o flagrante por teleconferência. Então, o flagrante que levava uma média de duas a três horas de confecção, hoje leva 40 minutos”, explica Arruda.

Cerco Inteligente: mais de 100 presos a partir das câmeras
Uma outra importante ferramenta da Secretaria da Segurança Pública do Espírito Santo é o chamado Cerco Inteligente, um sistema de monitoramento baseado em câmeras equipadas com inteligência artificial, instaladas em vias de grande circulação.
Os algoritmos instalados nesses equipamentos são capazes de ler placas de veículos, identificar pessoas, características específicas e captar detalhes que contribuem diretamente para investigações e localização de automóveis com restrição de circulação.
O subsecretário de Estado da Segurança Pública, Romualdo Gianordoli, afirma que essa estrutura tecnológica foi ampliada com a implementação do reconhecimento facial.
Com isso, foragidos da Justiça e condenados que circulavam livremente passaram a ser identificados em tempo real. Romulado Gianordoli comemora o número de prisões a partir dessa estratégia.
Já foram mais de 100 prisões a partir do Cerco inteligente. Então, é uma ferramenta realmente que acaba com aquela coisa de um analista ficar olhando para a tela esperando alguém com mandado de prisão aparecer. A tecnologia faz essa varredura. O rosto de qualquer pessoa vira um algoritmo e ela faz cálculos aritméticos para verificar se aquela pessoa que passou é a mesmo que está na nossa base de dados com mandado de prisão em aberto.

Viaturas blindadas, drones e armas importadas
Na Polícia Militar, o reforço veio por meio da aquisição de armamentos importados, viaturas blindadas, drones com alta capacidade tecnológica, além de capacetes e coletes balísticos.
Segundo a Sesp, de 2019 até agora, o efetivo da PM também cresceu, sendo incorporados 1.821 novos militares, e foi feita a reativação do Batalhão de Missões Especiais (BME). Com o fortalecimento das forças táticas, aumentou o número de operações e ainda a capacidade de resposta da corporação.
No mesmo período, na Polícia Civil, 351 novos servidores foram contratados, houve a aquisição de armamentos modernos, renovação da frota de viaturas e reformas em unidades policiais, além da construção de novas sedes.
A Secretaria de Estado da Segurança destaca, dentre as inovações, a criação da Central de Teleflagrantes, que mudou a forma como os flagrantes são recebidos no Estado, e também o Centro de Inteligência e Análise Telemática.
Um dos reflexos diretos desse aparato foi a Operação Baest, que resultou na retenção de mais de R$ 40 milhões provenientes de lavagem de dinheiro ligada ao tráfico de drogas, segundo dados da Sesp.

Unindo tecnologia Na operação também foram apreendidos veículos de luxo e jóias em imóveis em áreas nobres, em um esforço para atingir o crime organizado em suas estruturas financeiras.
Mais de 400 celulares roubados voltam para os donos
A tecnologia e inteligência trabalhando juntas também gerou frutos no combate aos crimes contra o patrimônio, especialmente o roubo de celulares. O Projeto Recupera usa tecnologias avançadas de rastreamento e identificação para localizar e devolver aos donos os celulares roubados.
Na prática, quem estiver com celulares identificados como furtados ou roubados é intimado por meio de mensagens via WhatsApp, enviadas exclusivamente pelo número (27) 99849-4228. A pessoa tem que ir a uma unidade policial, com data e horário marcados, para devolver o aparelho.
Entre julho e setembro de 2024, o projeto recuperou 424 aparelhos em todo o Estado, representando um aumento de 76,6% em relação ao mesmo período de 2023. Além disso, dados da Sesp mostram que o número de roubos e furtos de celulares caiu 20%, passando de 5.489 ocorrências em 2023 para 4.388 em 2024.
Outro avanço citado pela Secretaria de Segurança Pública é a criação da Polícia Científica, voltada à produção de provas técnicas para investigações.
Lançada oficialmente em 2023, a corporação passou a integrar a estrutura da Sesp já com investimentos robustos em tecnologia. Um dos destaques é o Sistema de Microcomparação Balística, que permite aos peritos comprovar tecnicamente a relação de uma arma de fogo com crimes, como homicídios.
“A gente tem uma lista de possibilidades e o perito, experiente em confronto balístico, vai analisar peça a peça, uma a uma, para ver se realmente trata-se de um resultado positivo ou não”, afirma a chefe do Departamento de Balística Forense, Fernanda Silveira.

A Polícia Científica também passou a operar com o Sistema de Identificação Biométrica, responsável pela digitalização dos bancos de dados civis e criminais.
Essa digitalização permite prevenir fraudes em documentos como carteiras de identidade. dificultando que criminosos utilizem nomes falsos ou identidades de terceiros.