
Você já ouviu falar em estelionato sentimental? O termo pode até soar estranho, mas infelizmente, descreve uma realidade mais comum do que se imagina que tem atingido as mulheres. É quando a promessa de amor esconde, na verdade, um golpe financeiro — uma violência silenciosa, disfarçada de afeto, que deixa marcas no bolso, na autoestima e na vida das vítimas.
A mulher acreditava estar construindo um futuro ao lado de um homem que dizia viver em situação difícil ou que já tem tudo, muito bem sucedido. Aos poucos, veem os pedidos de ajuda financeira, sob alegação de dívidas, inclusive, pode haver relatos de envolvimento com pessoas perigosas. Sensibilizada, ela passa a custear despesas. Quando a ficha vai cair é quando o golpe de estelionato já foi aplicado. Além dos danos materiais, ficam os emocionais difíceis de mensurar.
O crime por trás do romance
Mas afinal, isso é crime? A delegada Lorena Almeida, titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) de Feira de Santana, explicou que apesar de não ter uma tipificação específica no Código Penal com o nome de estelionato sentimental, o crime está enquadrado no artigo 171, o famoso “estelionato”.

“Esse é um crime que ele não está previsto em nosso ordenamento jurídico em um tipo específico, chamado estelionato sentimental. Na verdade, é o crime de estelionato que é previsto no artigo 171 do Código Penal. Só que ele tem esse pano de fundo específico de ser praticado no contexto de um relacionamento amoroso”, explicou.
Além disso, o golpe também se enquadra como violência patrimonial, uma das formas de violência previstas na Lei Maria da Penha. “São aquelas situações em que a mulher tem um prejuízo financeiro. Então o homem, se valendo da condição de vulnerabilidade da mulher, pratica um furto ou até um golpe contra ela”, detalhou a delegada.
Já o estelionato é um crime de obter vantagens ilícitas através de algum prejuízo que a vítima vai sofrer quando ela está sendo induzida ao erro.
Como funciona o golpe?
O roteiro costuma ser parecido:
- O golpista se apresenta como alguém bem-sucedido, carismático, companheiro — exatamente o que a vítima sonha.
- Depois que a confiança é construída, surge uma história de dificuldade financeira repentina: uma dívida inesperada, problemas com a ex, negócios que supostamente deram errado.
- Ele envolve a vítima emocionalmente, dizendo que a situação é temporária, que o dinheiro será devolvido, que é um investimento para o futuro dos dois.
- A vítima, muitas vezes fragilizada por traumas anteriores ou buscando construir um relacionamento, cede, ajuda financeiramente e acredita nas promessas.
“Então ele fala, já investi tanto nisso e agora estou precisando investir mais, mas é uma coisa que vai dar muito certo, que eu vou ganhar muito dinheiro e esse dinheiro vai ser nosso ou ele fala que está passando por grande dificuldade, que sofreu algum golpe. Ele vai apresentar uma história que não procede e a mulher vai se sentir na obrigação de ajudar ele porque ele está prestando todo o auxílio emocional a ela.”
Mas, infelizmente, o final da história não é de amor e sim de golpe. Por isso, a delegada faz um alerta para mulheres, que já são violentadas e subestimadas de tantas formas, não prestem nenhum tipo de ajuda financeira em um relacionamento novo.
“Se você tá começando um relacionamento novo, você tem que ter todo o cuidado. Todas as pessoas podem sim se apaixonar rapidamente, isso acontece. Mas é importante ter cuidado. Você deve conhecer o histórico da pessoa, buscar conhecer familiares, os amigos, saber qual é o passado daquela pessoa. Se você não conhece o passado daquela pessoa, você não pode se jogar de cabeça a ponto de emprestar dinheiro, de fazer um investimento”, alertou a delegada.

Segundo a delegada Lorena, geralmente, esses estelionatários repetem os mesmos golpes em novos relacionamentos.
“Mulheres, tenham todo o cuidado, porque os homens vão aproveitar da situação de vulnerabilidade da mulher, que toda mulher tem seus momentos, sim, de vulnerabilidade. É normal. Isso não é errado. Não é o objetivo julgar, nem dizer que a mulher foi burra. Que a mulher não deveria ter caído naquilo. O objetivo é se preservar. Cuidado mulheres que têm filhos. É muito importante preservar seus filhos. E conhecer aos poucos e entender qual é o contexto daquela pessoa antes de passar qualquer valor”, alertou Lorena.
Mas como reconhecer essa violência?
- A pessoa começa a pedir dinheiro com frequência.
- Relata dívidas, problemas urgentes ou situações de risco.
- Promete devolver, mas nunca cumpre.
- Começa a se esquivar, evita responder mensagens ou ligações.
- Dá desculpas constantes e conversa sempre atravessada ou confusa.
Se você percebeu esses sinais, sofreu prejuízo financeiro e percebeu que a pessoa simplesmente sumiu ou mudou de comportamento, é fundamental registrar um boletim de ocorrência na Delegacia da Mulher.
“Sempre que possível, não empreste dinheiro, não forneça CPF para fazer qualquer tipo de empréstimo, não tenha esse tipo de atitude, porque relacionamentos novos eles podem sim dar certo de cara, mas infelizmente o que mais acontece são esses atos de extrema intensidade em um relacionamento novo não terminarem bem, infelizmente é o mais comum”, reforçou.
A delegada ainda alerta que a denúncia é essencial para que o crime seja investigado e o autor responsabilizado.
Além disso, é importante entender que o amor nunca deve ser usado como ferramenta de pressão, chantagem ou exploração. Fique atenta: amor não é dívida, não é chantagem e nem manipulação. Se algo parecer errado, confie no seu instinto e busque ajuda.
Com informações do repórter Ney Silva Acorda Cidade
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