
Hoje, Voz da Inclusão apresenta a segunda parte da entrevista com a psicóloga Renata Teixeira (leia a primeira parte aqui).
Ela, que é autista nível de suporte 1, recebeu o diagnóstico já adulta, e depois de formada. Você pode encontrá-la no Instagram (@renatautista.psi), e o guia “Sou autista, e agora?” pode ser comprado aqui.
1 – Temos falado cada vez mais sobre o diagnóstico de autismo em adultos. Isso ajuda a desmistificar a questão, reduz o preconceito?
Sim, mas ainda temos um longo caminho pela frente. Falar sobre o autismo na vida adulta ajuda a quebrar aquela ideia ultrapassada de que o autismo tem “cara de criança” ou que só se manifesta de uma forma específica. Mostrar diferentes vivências, inclusive de pessoas que trabalham, se relacionam e vivem de forma considerada “funcional”, contribui muito para ampliar a compreensão social sobre o espectro.
Representatividade importa, e muito! Isso fica mais claro ainda com os feedbacks que eu recebo no meu Instagram. Muitas pessoas autistas já diagnosticadas, mas que não se aceitavam, viram no meu perfil uma versão do espectro que fez sentido para as suas vivências. Com isso, passaram a se entender melhor e se acolher dentro do transtorno, com todas as suas dificuldades, mas também potenciais.
2 – Muitas vezes o nível 1 de suporte no autismo é alvo de certo desdém, dizem que “é leve, não tem problema”. Como psicóloga e como pessoa com autismo nível 1 de suporte, o que você tem a dizer sobre isso?
Essa ideia de “leve” costuma minimizar o sofrimento real de quem precisa se esforçar o tempo todo para se encaixar num mundo que não foi feito para nós. O nível de suporte não define o impacto subjetivo nas nossas vidas. Nível de suporte não é equivalente a nível de sofrimento. Muitos estudos indicam que o autista nível 1 e 2 de suporte pode ter um grau de sofrimento psicológico muito maior se comparado ao nível 3, pois entende a cobrança da sociedade e se sente diferente e excluído. A maioria de nós vive em constante estado de adaptação e camuflagem, o que pode levar à exaustão, crises, depressão, ansiedade e até pensamentos suicidas.
Pessoas autistas têm um risco quatro vezes maior de tirarem a própria vida quando comparadas a pessoas não autistas. O que falta é empatia para entender que o que parece “funcional” externamente pode esconder um esforço imenso e silencioso. Afinal, não existe autismo nível zero de suporte. Para ser considerada autista, a pessoa precisa ter prejuízos significativos em várias áreas da vida.
3 – Alguma mensagem para nossos leitores?
Sim: não subestime o poder do autoconhecimento! Se você está desconfiando de que pode ter algum diagnóstico e sente que certas peças não se encaixam, tudo bem investigar isso, independentemente da sua idade ou trajetória. E, se você for uma pessoa neurotípica, procure escutar de verdade as vivências de pessoas autistas adultas. A inclusão começa na escuta genuína e na compreensão de que estamos em constante aprendizado e evolução.
Receber o diagnóstico de autismo não é receber um rótulo. O nome “autismo” somente explica quem você já é, e sempre foi. Dar um nome ao que sentimos é um passo importante para buscarmos ajuda profissional e para que possamos entender melhor as nossas dificuldades, limitações e características. Tudo bem você ter um limite diferente do que as outras pessoas. O mundo é um lugar para todo mundo, e o que nos faz uma espécie tão bem evoluída são as nossas diferenças.