A base aliada do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) registra o menor índice de fidelidade nas votações nominais da Câmara dos Deputados desde 1995. Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo revela que apenas 72% dos votos de parlamentares de partidos com ministérios acompanharam as orientações do governo em votações de interesse do Planalto.
O dado empata com o pior momento do segundo mandato da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), durante o processo que resultaria no golpe. Para efeito de comparação, governos anteriores alcançaram níveis de apoio mais altos: Fernando Henrique Cardoso (PSDB) chegou a 95% de fidelidade no primeiro mandato, Lula 1 teve 91% e Lula 2, 92%. Jair Bolsonaro (PL) fechou seu governo com 90% de votos alinhados.
Entre as derrotas recentes, está a aprovação do projeto que derrubou o decreto do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mesmo com votos de partidos que controlam doze ministérios, como União Brasil, MDB, PSD, Republicanos, PP, PDT e PSB. A pauta foi colocada em votação de forma inesperada pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e contou com apoio de 63% dos parlamentares dessas siglas.
A mudança das regras de liberação de emendas parlamentares, determinada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino, é um dos fatores importantes nesta análise. Deputados do centrão criticam os atrasos nos repasses e veem uma tentativa de enfraquecer o poder do Congresso sobre o Orçamento federal. Dino é ex-ministro da Justiça de Lula e foi indicado ao STF pelo próprio presidente.
As consequências desse arranjo foram tema de audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF) na sexta-feira (27). Convocada pelo ministro Flávio Dino, a sessão discutiu a constitucionalidade das emendas parlamentares e o impacto sobre o presidencialismo. Representantes do Congresso defenderam o modelo, enquanto pesquisadores o classificaram como “presidencialismo de cooptação”. A pesquisadora Juliana Sakai alertou para a criação de feudos eleitorais e o enfraquecimento de políticas públicas estruturantes. Já o economista Felipe Salto apontou que a rigidez orçamentária imposta pelas emendas compromete a capacidade do governo de gerir os recursos e produzir superávit.
Durante a audiência, Dino argumentou que o atual modelo orçamentário está em desacordo com a centralidade do Executivo prevista na Constituição de 1988 e ironizou: “Se é para cortar, corte dos menos consagrados pela sorte ou pelos privilégios. E se é para tributar, tribute também eles”. O ministro afirmou que o Supremo não atua de forma isolada e que todas as decisões relativas ao tema foram referendadas pelo plenário da Corte. Para críticos do atual sistema, como os advogados do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), a desconstrução das atribuições presidenciais representa um esvaziamento da soberania popular e da governabilidade democrática.
Com dificuldades crescentes para formar maiorias e aprovar pautas prioritárias, o Planalto corre contra o tempo para tentar reverter o desgaste antes das eleições de 2026. Entre os principais projetos em pauta estão a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, medidas de segurança pública e políticas sociais como o programa Gás para Todos.