
Imagine lembrar com clareza absoluta do dia em que aprendeu a andar, ou da sensação exata de um momento embaraçoso ocorrido décadas atrás. Para a maioria de nós, memórias antigas desbotam, confundem-se ou somem.
Mas para um grupo minúsculo de pessoas no mundo, incluindo as australianas Rebecca Sharrock e Emily Nash, esquecer é um conceito estranho. Elas vivem com uma condição neurológica raríssima chamada Memória Autobiográfica Altamente Superior (HSAM), também conhecida como Hipertimesia.
A HSAM é muito mais do que uma simples boa memória. Médicos e cientistas a definem como uma habilidade extraordinária que permite recordar praticamente todos os eventos da própria vida com um nível impressionante de detalhes e precisão. Não se trata de memorizar dados aleatórios, mas sim da própria história pessoal, dia após dia.
Emily Nash descreve seu funcionamento mental de uma maneira fascinante. Para ela, o cérebro opera como um calendário perfeito. Cada data específica corresponde a uma espécie de filme mental, completo, que ela pode revisitar à vontade: rebobinar para ver o início, avançar para chegar a partes específicas, pausar para observar minúcias.
Quanto mais ela “navega” para dentro de um dia particular, mais detalhes ela consegue resgatar – cores, sons, cheiros, sensações. Ela relata, por exemplo, recordar vívida e precisamente o processo de aprender a andar ainda bebê, incluindo a empolgação que a fez começar a correr pela casa, levando os pais a correrem atrás dela. Detalhes tão antigos e nítidos são incompreensíveis para a maioria.
Rebecca Sharrock convive com a HSAM desde sempre, mas só compreendeu o motivo de sua memória infalível há cerca de doze anos, quando recebeu o diagnóstico formal. Sua capacidade abrange tudo, desde os primeiros meses de vida, ainda bebê, até o presente, como adulta. Questionada se lembra de cada minuto, ela estima recordar pelo menos 95% do tempo.
No entanto, essa capacidade extraordinária tem um custo elevado. Rebecca fala abertamente sobre o lado sombrio. Flashbacks aleatórios e intrusivos são uma constante em sua vida. Memórias, sem aviso prévio, invadem sua mente a qualquer hora, dia e noite, causando distrações intensas e frequentes. Ela se refere à condição como uma “maldição”, especialmente devido ao impacto emocional.
O maior desafio talvez seja a intensidade das emoções revividas. Quando Rebecca acessa uma memória, especialmente uma negativa, estressante ou triste, ela não apenas se recorda do evento – ela revive a intensidade emocional original.
Se o acontecimento ocorreu aos três anos de idade, sua reação emocional é exatamente como a de uma criança de três anos, mesmo que sua mente consciente e racional seja a de uma adulta. Reviver medos infantis, tristezas profundas ou humilhações com toda a força original é exaustivo e perturbador. Ela enfrenta a incompreensão de quem acredita que ela simplesmente “não quer superar” ou que fica remoendo o passado de propósito.
Além do peso emocional, há o isolamento de ser uma exceção médica. A HSAM é tão rara que existem pouquíssimas pessoas diagnosticadas no mundo. Isso significa que poucos entendem verdadeiramente a experiência, e há uma escassez significativa de tratamentos ou estratégias terapêuticas específicas desenvolvidas para ajudar a gerenciar os aspectos mais difíceis da condição.
Para Rebecca, apesar de todos os desafios, essa maneira intensa e detalhada de lembrar é simplesmente sua realidade normal, a única que ela conhece. A vida sem esquecimento é uma jornada única, repleta de clareza, mas também de uma carga emocional constante e pesada.
Esse Mulher que faz parte dos 0,00001% da população mundial que se lembra de cada momento da sua vida explica como é viver com essa condição extremamente rara foi publicado primeiro no Misterios do Mundo. Cópias não são autorizadas.