Diversidade de gênero no papel e na prática: os desafios das mulheres na celulose

Tradicionalmente dominado por homens, o setor florestal, que engloba desde o plantio até a produção industrial, tem registrado nas últimas décadas uma presença crescente, mas ainda desigual, de mulheres. Segundo a Embrapa, em 2021, 17,6% dos empregos na cadeia produtiva florestal em Mato Grosso do Sul eram ocupados por mulheres. Embora esse número simbolize uma conquista, permanece abaixo da paridade, e as faixas salariais elevadas seguem concentradas entre os homens.

Dados da Rede Mulher Florestal complicam o panorama: apesar de um incremento de 4% para 7% de mulheres em cargos de diretoria entre 2021 e 2023, a participação feminina em cargos de CEO caiu de 12% para 10% no mesmo período. Além disso, a presença feminina em viveiros diminuiu de 51% para 41%. Esses números mostram avanços em alguns degraus, mas evidenciam retrocessos em outros.

A trajetória de mulheres que ocupam funções tradicionalmente masculinas mostra o potencial transformador da inclusão. Na Suzano, em Mato Grosso do Sul, 849 mulheres foram contratadas apenas em 2024, representando 32% do total de novas admissões. A empresa já contabiliza cerca de 1.400 colaboradoras no estado e vem ampliando a presença feminina em cargos de liderança, que hoje somam 21% do quadro, com meta de atingir 30% até 2025.

Entre essas mulheres está Ester Storck, engenheira florestal de 33 anos, que se tornou a primeira supervisora de colheita florestal da Suzano em Três Lagoas (MS). “Meu gerente comentou que eu era a primeira supervisora mulher de colheita de Mato Grosso do Sul, o que me deu um frio na barriga, mas também uma enorme satisfação em poder abrir caminho para outras mulheres”, relatou. Outra profissional que tem inspirado mudanças é Palloma Vigiani, primeira mulher contratada na área industrial da unidade de Ribas do Rio Pardo (MS), também da Suzano, cuja atuação tem servido de referência para novas colaboradoras.

Iniciativas como essas são impulsionadas por programas corporativos voltados à inclusão de gênero. A Suzano, também desenvolve o Programa Cultivar, que oferece capacitação exclusiva para mulheres em operações florestais, com possibilidade de contratação após a formação.

A Veracel Celulose é outro exemplo de esforço estruturado, oferecendo cursos técnicos em parceria com o SENAI voltados exclusivamente a mulheres interessadas em operar máquinas florestais e tem mantido programas internos de mentoria para preparar lideranças femininas. Em sua página oficial, a empresa disponibiliza um canal dedicado à atração de currículos de mulheres, como forma de promover um ambiente mais inclusivo desde o processo seletivo.

BARREIRAS ESTRUTURAIS

Apesar desses avanços, as barreiras persistem. A cultura organizacional ainda carrega traços machistas, e relatos de discriminação, desconfiança sobre a capacidade técnica das mulheres e falta de estrutura ainda são comuns. Muitas profissionais também relatam dificuldades após a maternidade, com falta de suporte à reintegração e à conciliação entre jornada de trabalho e cuidados familiares.

A leitura crítica da evolução feminina na indústria florestal evidencia a necessidade de propostas mais contundentes. Além de metas para ampliar a representatividade em cargos de liderança, é fundamental que as empresas promovam uma revisão de suas estruturas físicas e culturais, oferecendo igualdade real de condições para o exercício profissional. Isso inclui investimento em capacitação técnica, combate efetivo ao assédio, políticas claras de progressão de carreira e apoio integral à maternidade.

É preciso ainda olhar com mais atenção para mulheres negras, indígenas e de áreas periféricas, cuja inclusão demanda esforços específicos de acesso, formação e permanência. Projetos regionais em parceria com instituições de ensino técnico, programas de mentoria intergeracional e cotas para bolsas de formação podem acelerar esse processo e garantir que a diversidade não seja apenas um discurso, mas parte da estratégia de futuro do setor.

O avanço da presença feminina no setor de celulose é uma conquista coletiva, mas ainda inacabada. O potencial de transformação social, produtiva e ambiental que essa diversidade carrega é imenso, e só poderá ser plenamente realizado se as empresas se comprometerem com mudanças profundas e duradouras. Afinal, não há inovação ou sustentabilidade possíveis sem equidade.

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