
Peixes-boi são devolvidos à natureza em Santarém, no PA
Foi realizada nesta quarta-feira (16) na comunidade Igarapé do Costa em Santarém, no oeste do Pará, a soltura de 6 peixes-boi reabilitados. A soltura faz parte de um dos maiores projetos do Brasil voltados para a conservação da espécie.
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A embarcação que transportou os animais saiu da orla de Santarém por volta das 9h da manhã com integrantes do Projeto Peixe-Boi da Amazônia, além de representantes de instituições e empresas parceiras, órgãos municipais, estaduais e federais.
O Projeto Peixe-Boi da Amazônia é desenvolvido pelo ZooUnama desde 2008. O diretor do zoológico e biólogo, Hipócrates Chalkidis, explicou que durante todos esses anos de atividade, mais de 150 animais já foram resgatados, promovendo a conservação da espécie que é ameaçada de extinção.
Chalkids avaliou de forma positiva a ação e falou sobre a importância de ampliação do projeto, não só com os Peixes-boi, mas quem sabe no futuro com outras espécies.
“O peixe de boi é conhecido como o jardineiro das águas. Ele nos fornece diversos serviços desde o controle das plantas aquáticas até a liberação de fertilizantes e assim por diante. Então isso pra gente é motivo de muito orgulho e ao mesmo tempo um senso de responsabilidade muito grande porque agora nós estamos adicionando novos parceiros, parceiros esses que vêm também com novas ideias, mas todos eles emanados em prol de uma espécie. Quem sabe no futuro próximo possamos fazer muito mais por mais espécies. Mas a priore entender a biologia, entender a história natural de peixe boi é caro, custa muito pra nossa instituição e compartilhar esse custo com as demais vai nos permitir crescer, conhecer muito mais e proteger mais ainda”, contou Chalkids.
Seis animais foram devolvidos à natureza em Santarém
Dominique Cavaleiro/g1
Entre os órgãos envolvidos na soltura dos peixes-boi, está o Ibama, que viabilizou recursos para a ação por meio de projetos de licenciamento ambiental e também a partir da conversão de multas de processos administrativos.
O Superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Alex Lacerda, participou da ação, avaliou de forma positiva e contou que a expectativa é que outros projetos da região possam receber o apoio do órgão.
“É um passo importante para o Projeto, mas é mais importante ainda para a conservação da espécie que demonstra a possibilidade efetiva da gente devolver esses animais em uma qualidade considerável e que isso é viável. Então isso demonstra para a sociedade e também para os parceiros que a gente pode fazer isso, deve fazer isso com uma frequência muito maior e vamos estabelecer nas outras bases o mesmo procedimento para que a gente possa devolver no menor tempo possível a maior quantidade de animais, garantindo a reprodução da espécie”, disse Alex Lacerda.
Nesta reportagem você vai ver:
Quem são os peixes-boi que foram devolvidos à natureza
Jardineiro da Amazônia: porque é importante conservar os peixes-boi?
Do resgate à soltura
Contribuições do Ibama no Projeto
Projeto Peixe-Boi da Amazônia: um dos maiores do Brasil
Conheça Jairo, o veterinário que cuida pessoalmente dos peixes-boi
Peixe-boi pronto para ser devolvido à natureza
Dominique Cavaleiro/g1
1. Quem são os peixes-boi que foram devolvidos à natureza?
A ação tinha como objetivo realizar a soltura de 8 peixes-boi, mas no momento da captura do tanque para a soltura, só foi possível retirar 6.
Isso porque um deles, a Adria, será levada para a região de Soure, já que ela é da região do estuário do Amazonas, no Amapá, portanto ela deve ser aclimatada e solta em uma região próxima no recinto de aclimatação na região da ilha do Marajó, em Soure.
Em Soure, um tanque está sendo construído por meio do Projeto de Conservação de Peixes-boi no Pará, que faz parte de uma condicionante de licenciamento conduzido pelo Ibama e executado pelo Instituto Bicho D’água com o apoio do TGS.
Outro animal que não pôde ser devolvido à natureza foi o Mirim. O animal simplesmente “se recusou” a sair do tanque flutuante. Ele deverá ser solto em outra ocasião.
Foram devolvidos à natureza:
Araraú – Macho resgatado em 2021 na comunidade Araraú Alenquer;
Ruck – Macho resgatado em 2013 na Comunidade Irateua, em Óbidos;
Tapiri – Femêa resgatada em 2014 na Comunidade Tapará Mirim, em Santarém;
Pacoval – macho resgatado em 2014 na Comunidade Pacoval;
Itarim – Macho resgatado em 2016 no Lago do Itarim, Rio Amazonas, em Santarém;
Piracaoera – Femea resgatada em 2016 na Comunidade Piracoera de Cima, em Santarém.
Geralmente, quando são resgatados, os animais recebem o nome da comunidade em que foram encontrados. Em alguns casos, os ribeirinhos que encontraram os animais colocam o nome dos filhos ou de familiares, como forma de homenagem.
2. Jardineiro da Amazônia: porque é importante conservar os peixes-boi
Integrante da equipe técnica do Zoounama e do Projeto Peixe-boi da Amazônia, Jairo Moura explica que o animal historicamente é ameaçado por diversos fatores: a carne extremamente saborosa e nutritiva, a banha com poder anti-inflamatório e o couro. A ação humana colocou em risco a espécie, que é considerada o “jardineiro da Amazônia”.
De acordo com Jairo, na Amazônia o Peixe-boi é responsável por fazer o controle da população de plantas aquáticas, também conhecida pelo nome de macrófagos aquáticas.
“Eles chegam a comer até 10, 12, 13% de quantidade de planta aquática proporcional ao peso. É muito. Isso é importante. Por quê? Porque a partir do momento que ele come muito, ele defeca muito. Então as fezes vão servir de nutrientes para zooplâncton e para fitoplâncton, que são micro-organismos que ficam dentro da dieta aquática, que vão servir de nutrientes para outros animais. Indiretamente, o peixe-boi faz com que outros organismos dentro do ecossistema aquático tenham a sua supervivência garantida”, explicou Jairo.
3. Do resgate à soltura
Comunidade Igarapé do Costa, em Santarém
Dominique Cavaleiro/g1
O Médico Veterinário, Jairo Moura, explica que após ser resgatado, o peixe-boi passar por um longo período de amamentação que pode levar até 2 anos.
“O cuidado parental do peixe-boi é longo, em média, dois anos. Então, se nos primeiros meses de vida ele não tiver esse leite materno, ele fica com seu sistema imunológico comprometido. Daí, a importância que o nosso projeto tem. Fazer o cuidado desses filhotes órgãos de peixes-bois que são apreendidos pelos órgãos da fiscalização. Se tudo der certo, esse filhote vai sendo cuidado, ele vai crescendo, vai ter aumento de massa corporal, vai tendo contato com planta aquática e a partir dos dois anos, dois anos e meio, inicia-se o desmame, que é a diminuição gradativa do leite, com um aumento da oferta de plantas aquáticas”, explicou Jairo.
Depois disso, o peixe-boi entra para a segunda etapa: a aclimatação. Nesse estágio os animais são levados da piscina do zoológico para o tanque flutuante na comunidade Igarapé do Costa.
Esse processo dura de 1 a 3 anos e é importante para o animal se adaptar ao clima e características da água do rio, além de ter contato com a água corrente e maré.
“E se tudo der certo, em um período de espaço de tempo, ele é translocado para a base flutuante, feito hoje que isso aconteceu. Ele estando na base flutuante, o peixe-boi vai ter contato com a água do rio, que tem um pH, uma turbidez, que tem características físico-químicas diferentes das águas das piscinas, após esse período de aclimatação”, continuou.
Já no tanque flutuante, os Peixes-boi são avaliados bimestralmente, onde são observados diversos fatores, incluindo: o peso, que é medido pela biometria, as condições clínicas que são avaliadas pelo veterinário e exames laboratoriais.
A partir desta avaliação, os animais podem ser devolvidos à natureza. O Projeto Peixe-Boi da Amazônia já realizou 3 solturas: uma em 2019, outra em 2022 e agora em 2025.
“Eles sendo acompanhados, tendo crescimento de marcia corpórea e estando saudáveis, eles são sendo devolvidos para a natureza”, concluiu Jairo.
Os animais geralmente são soltos em áreas na comunidade Igarapé do Costa com grande quantidade de plantas aquáticas para que esses peixes-boi possam ter alimentação disponível na natureza.
4. Contribuições do Ibama no Projeto
Entre as diversas instituições que participaram da soltura dos Peixes-boi estava o Ibama. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) foi o responsável por captar recursos financeiros para a ação de soltura dos animais.
Isso porque no processo de licenciamento ambiental, o Ibama determina condicionantes aos empreendimentos na área ambiental, por conta dos impactos causados ao Meio Ambiente.
Essas condicionantes podem ser ações de reparação ao Meio Ambiente ou investimentos em projetos que já realizam um trabalho de conservação ambiental na região, como foi o caso do Projeto Peixe-boi, de Santarém.
A Diretora de licenciamento Ambiental, Cláudia Barros, explica que a empresa que direcionou recursos para a ação de soltura de Peixes-boi está realizando pesquisas sísmicas na região do Pará e Maranhão e a condicionante foi o apoio à ação.
“Quando tem impacto, a gente estabelece medidas, ou de controle para diminuir o impacto, ou quando não consegue conter, estabelecemos medidas para compensar. Então, a gente está aqui hoje, porque em uma licença que a gente deu à empresa, a gente botou uma condicionante que foi o apoio ao Projeto Peixe-Boi, pois a gente sabia que precisava desse suporte”, explicou Claudia.
O gerente da TGS no Brasil, João Carlos Corrêa, participou da programação e pôde ver de perto todo o trabalho realizado pelo Projeto Peixe-Boi da Amazônia. Além da ação em Santarém, a empresa também está apoiando o Projeto do Instituto Bicho D’água, que também atua na conservação da espécie.
“Valeu super a pena. Na verdade, a minha participação aqui é para assistir, pois nós estamos com essa condicionante. Como o Ibama observou que existe muitas ocorrências envolvendo os Peixes-boi, então a gente veio para fortalecer isso e transformar as estruturas que nós já temos no Pará e utilizar essas estruturas para proporcionar a soltura de mais peixes-boi”, disse João Carlos Corrêa.
5. Projeto Peixe-Boi da Amazônia: um dos maiores do Brasil
Soltura aconteceu na Comunidade Igarapé do Costa, em Santarém
Dominique Cavaleiro/g1
O Projeto Peixe-Boi da Amazônia é realizado pelo Zoounama que é uma instituição sem fins lucrativos, localizada no oeste do Pará. A instituição tem se destacado na reabilitação de animais silvestres da fauna local, oferecendo suporte técnico especializado e estruturas adequadas para o recebimento e tratamento de animais em perigo.
Atuando na reabilitação de filhotes órfãos de peixe-boi-da-Amazônia, tornando-se uma referência no estado do Pará. O local possui uma área exclusiva para a manutenção de mamíferos aquáticos, equipada com piscinas apropriadas para o tamanho de cada animal, e conta com uma equipe formada por profissionais de medicina veterinária, biologia e tratadores especializados.
Todas as ocorrências de resgate de peixes-boi na região são coordenadas pelos órgãos ambientais: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), 4º Grupamento de Bombeiro Militar (4º GBM), Capitania Fluvial de Santarém (CFSTM), 1ª Companhia de Policiamento Ambiental (1ª CIPAMB) e Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Santarém (Semma). Os espécimes resgatados são encaminhados ao centro de tratamento veterinário do projeto de peixe-boi do ZooUnama.
6. Conheça Jairo, o veterinário que cuida pessoalmente dos peixes-boi
Médico Veterinário Jairo Moura
Divulgação
Natural de Pernambuco, o Médico Veterinário Jairo Moura integra a equipe técnica do Projeto Peixe-boi desde 2009. Aos 62 anos, Jairo é formado em medicina veterinária pela Universidade Federal Rural do Pernambuco e possui especialização em manejo, conservação e produção de animal silvestres pela Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra).
Ele conta que se formou para trabalhar com a vida humana, mas admite que o trabalho com os Peixe-boi foi um divisor de águas na sua vida e carreira profissional.
“Conhecer a Amazônia de imagem, de foto, é uma coisa. Você viver dentro da Amazônia, sentir o calor, a umidade, a temperatura, a cultura, o povo da Amazônia, é outra coisa. Quando eu vim do interior de Pernambuco, em 1996, que eu vim para Belém, para fazer essa especialização em manejo de conservação e produção da Amazônia, a meta era fazer e depois voltar. Até hoje que eu estou por aqui, que até dando ênfase àquela frase que é muito comum por aqui, que fala o seguinte, ‘quem veio ao Pará parou, tomou açaí ficou. Agora, em outubro deste ano, eu completo 29 anos de estado”, disse Jairo.
O profissional cuida pessoalmente de cada um dos animais atendidos pelo projeto e reconhece pelas manchas na barriga cada um deles. Desde as técnicas para aplicação de pomadas, à temperatura ideal para exposição dos animais, Jairo relembra que a trajetória foi marcada por erros e acertos.
Jairo conta ainda que jamais imaginou que o Projeto tomaria a proporção que tomou e acredita que com a conscientização ambiental e apoio de entidades públicas e privadas, será possível estender cada vez mais as ações de conservação dos Peixes-boi.
“A gente que faz o curso da medicina veterinária, quando a gente abraça essa profissão, é para trabalhar com vida animal. Você jamais poderia imaginar que eu fosse trabalhar com uma espécie ameaçada, jamais poderia imaginar que eu fosse trabalhar com um peixe-boi. E tem uma coisa interessante, eu não sei se vocês lembram que em novembro de 2007 uma baleia apareceu aqui pelo rio Tapajós, e mesmo estando em Belém já na época, eu vim para cá, eu jamais na minha vida eu pensei que eu fosse fazer necrópsia em uma baleia dentro da Amazônia, dentro de Santarém”, finalizou.
Jairo Moura, Médico Veterinário do Projeto Peixe-Boi da Amazônia
Divulgação
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