O Brasil já gastou R$ 449 milhões, só em 2024, com internações pelo Sistema Único de Saúde (SUS) relacionadas a acidentes de trânsito. O valor é quase quatro vezes maior que o previsto no Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para a compra de ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). De acordo com levantamento inédito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os gastos cresceram mais de 50% desde 1998.
Para o técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho, os dados revelam um modelo de mobilidade falido e que afeta toda a rede hospitalar do país. “Há cerca de 35 mil mortes por ano envolvidas em sinistros de trânsito e mais de 300 mil pessoas com lesões graves. Grande parte da nossa rede hospitalar está comprometida em função desses atendimentos. E a maior parte, hoje em dia, de lesões geradas em sinistro de trânsito está ligada a motociclistas”, afirma, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato.
O especialista explica que essas vítimas costumam ser jovens e provedores das suas casas, o que também impacta a Previdência e leva ao empobrecimento de milhares de famílias. Além disso, critica a extinção do Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (DPVAT), que desde 2020 deixou de arrecadar cerca de R$ 580 milhões por ano para o SUS.
“Na década passada chegou a R$ 3 bilhões por ano de recursos. Então isso, sem dúvida nenhuma, prejudica muito os atendimentos. Hoje não tem recurso nenhum passando para o SUS. O único recurso que tinha do setor de mobilidade urbana voltado para compensação desses custos era realmente o DPVAT”, lamenta.
O fim do seguro, somado à falta de investimentos em prevenção, afeta diretamente a sustentabilidade do sistema público de saúde. “Se tivesse zero vítimas de trânsito, teria que ter uma rede hospitalar muito menor do que tem hoje. Isso custa dinheiro. É uma política que deveria ser repensada. O custo anual do seguro, quando repartido entre motoristas, era relativamente baixo”, defende.
Políticas necessárias
Carvalho também aponta a ausência de políticas efetivas para reduzir a mortalidade no trânsito. Ele menciona como urgentes o barateamento da habilitação, a melhoria das vias e campanhas permanentes sobre segurança. “Hoje, o que mais mata no trânsito brasileiro são usuários de motocicleta. Cerca de 40% das mortes estão associadas à motocicleta. E grande parte desses usuários não tem habilitação, porque ela é cara. Então tem que pensar em políticas para baratear isso também”, sugere.
Além disso, o técnico chama atenção para o uso indevido de verbas arrecadadas com multas. “Na prática, grande parte desses recursos está sendo utilizada para superávit fiscal, para ajuste das contas públicas. E quando se negligencia investimentos em infraestrutura e educação, impacta a saúde, porque aumenta a ocorrência desses eventos trágicos”, denuncia.
Segundo o Ipea, o aumento das vendas de motos deve agravar a situação nos próximos anos. E, sem medidas concretas, o custo recairá cada vez mais sobre os mais pobres. “Quando não se tem mais nenhuma compensação para o sistema de saúde pelos atendimentos, está cobrando de toda a sociedade. Os mais pobres ficam duplamente prejudicados: recebem um péssimo atendimento por falta de recursos e ainda pagam a conta, já que grande parte dos impostos no Brasil são indiretos”, critica.
Para ouvir e assistir
O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira, uma às 9h e outra às 17h, na Rádio Brasil de Fato, 98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.
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