Família denuncia negligência após morte de bebê em pronto-socorro infantil de Arujá


Alice da Silva Oliveira ficou 25 horas em observação na unidade
Reprodução/TV Diário
Alice da Silva Oliveira, de apenas 20 dias, morreu após permanecer 25 horas em observação no Pronto Atendimento Pró-Criança Maria Aparecida Bueno Mendonça, em Arujá. 
A avó paterna da criança, Rafaela Fernanda da Silva, acompanhou o atendimento e denuncia negligência por parte da unidade.
O atestado de óbito aponta como causas da morte: inflamação gastrointestinal, broncopneumonia e desidratação. O caso foi registrado como morte natural na delegacia de Arujá.
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A Prefeitura de Arujá informou que foi aberta uma sindicância pela Secretaria de Saúde e pela organização social Mahatma Gandhi, responsável pela gestão da unidade, para apurar os fatos (leia abaixo a nota completa da Prefeitura).
O g1 solicitou informações à Mahatma Gandhi, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
Complicações e histórico médico
A mãe de Alice, Jéssica Aparecida da Silva, de 27 anos, precisou ser internada no Hospital Regional de Ferraz de Vasconcelos após complicações da cesariana. Como estava em tratamento com antibióticos, não pôde amamentar a filha. A pediatra recomendou o uso de fórmula como substituição ao leite materno.
Segundo Rafaela, a família percebeu que as fezes da bebê estavam muito líquidas e entrou em contato com a pediatra, que orientou aguardar dez dias. No mesmo dia, à noite, Alice apresentou feição abatida e vomitou após tomar a fórmula. “Ela ficou mole. Pensei que estava desidratada”, relatou a avó.
Alice deu entrada no Pró-Criança às 0h30 do dia 18 de junho, com sintomas de diarreia e vômito. A primeira médica que a atendeu afirmou que a moleira estava normal e que o estado de saúde era estável.
No entanto, segundo Rafaela, 25 horas depois, a bebê continuava com sinais de desidratação, o que culminou em uma parada cardiorrespiratória e levou à morte.
Ela era a primeira filha de Jéssica e Eduardo Rikelme da Silva Oliveira, de 23 anos. Segundo Rafaela, a família pretende entrar na Justiça contra a unidade de saúde. “De verdade, só queremos que outras Alices não passem por isso”.
Alice morreu após passar por atendimento no Pró-Criança de Arujá
Rafaela Fernanda da Silva/Arquivo Pessoal
Atendimento no Pró-Criança
A avó da criança, Rafaela Fernanda da Silva, decidiu levar a bebê ao Pró-Criança por causa dos sinais de desidratação.
“A pediatra mediu a temperatura dela, a saturação e viu que ela estava fria. O pé e a mão estavam roxos. O coração estava bom. A temperatura dela estava 35 °C. Eles sempre falaram pra mim que ela estava estável. Eu expliquei que trouxe a bebê, porque ela não estava normal […] a médica disse que a neném ia ficar em observação”, contou a avó.
Rafaela relatou que a neta foi colocada em isolamento na unidade, devido à alta nos casos de bronquiolite. Em seguida, a recém-nascida recebeu o primeiro soro. “Eu perguntei se podia dar o leite, a médica disse que podia dar ele mesmo”, explicou.
Já o segundo soro prescrito, segundo a avó, veio com um dispositivo conhecido como bomba de infusão, que controla a absorção do líquido pelo organismo. Rafaela verificou que a bomba havia disparado e chamou o enfermeiro para ajudar.
“Eu perguntei pra enfermeira se era normal, a enfermeira disse que era normal. Eu questionei de novo que o leite que a menina estava tomando não fazia bem pra ela. Eles deram um leite deles. Nenhum médico examinou mesmo a criança”.
De acordo com Rafaela, os médicos não a informaram sobre o real diagnóstico da criança e sempre diziam que o estado de saúde de Alice era estável.
No entanto, após a morte da menina, por meio do prontuário médico, a família descobriu que a unidade tentou transferir Alice para o Hospital Regional de Ferraz de Vasconcelos. Foram três tentativas de transferência, umas às 15h, outra às 18h e a última às 20h.
“Nesse dia, eles começaram a tirar o soro da menina. Eles não disseram o porquê não conseguiram transferir. Eles não deram e se negaram a dizer pra gente que ela estava mal. A única coisa que estava alterada era icterícia, eles disseram. A gente teve acesso aos exames que mostravam que o potássio e o sódio estavam altíssimos”.
Rafaela contou que, durante as 25 horas em que a menina esteve em observação na unidade, três equipes de plantão a atenderam. Uma das equipes queria trocar a segunda bolsa de soro de 2000 mililitros, afirmando que era recomendação do médico. Entretanto, de acordo com a avó, Alice tinha tomado apenas metade da bolsa.
“A máquina que controla o soro estava quebrada. Eles [enfermeiros] não sabiam mexer na máquina. Uma enfermeira chegou e disse que sabia mexer e a máquina começou a funcionar. A Alice, então, passou a receber o soro novamente e começou a dar uma leve animadinha. Ela ficou das 3h até 18h sem tomar o soro, porque ele não estava saindo”, relembrou.
De acordo com a avó, os médicos e enfermeiros durante todo o tempo em que a menina estava sem receber o soro, apenas mediam a saturação da criança e diziam que ela estava bem.
A avó contou que só depois que a máquina de soro voltou a funcionar é que um médico examinou a criança e a colocou no dispositivo de medição de batimentos cardíacos e de saturação. E uma enfermeira enfaixou as mãos e os pés da bebê que estava gelada.
“A enfermeira disse que, como ela estava melhorando, deram dipirona e luftal. No horário da visita, os familiares disseram que ela [Alice] estava muito diferente. O médico disse que ela estava em situação severa e foi pra uma moderada. Em nenhum momento, eles me falavam que ela estava grave”.
Uma das enfermeiras aconselhou que a avó tomasse um banho ou comesse algo. Quando retornou em dez minutos, viu que a enfermeira estava dando mamadeira para Alice.
“A enfermeira disse que ela podia tomar o leite. Depois a gente descobriu que o pulmão estava comprometido e ela deveria ter tomado por sonda”.
Rafaela disse que nas horas seguintes a criança ficou agitada e com os batimentos cardíacos fracos e os enfermeiros acionaram o médico, que a levou para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
A avó recebeu a notícia da morte da neta às 1h32, do dia 19 de junho.
“Ela passou por seis auxiliares de enfermagem, três técnicos de enfermagem, cinco médicos, três assistentes sociais e uma psicóloga. No total, foram 21 profissionais da saúde. Ela passou 25 horas dentro do hospital, eu falei: vocês não fizeram nada, ela foi morrendo aos poucos. Escrevi uma carta sobre a negligência, da falta de experiência dos médicos e deixei lá”, contou comovida.
O que diz a prefeitura
Por meio de nota, a Prefeitura de Arujá informou que:
“Em 18/06/2025, a bebê Alice, com 19 dias de vida, deu entrada no Pró-Criança, apresentando quadro de desidratação grave. Diante da gravidade, foi imediatamente internada e recebeu todo o suporte necessário por parte de nossa equipe médica.
Alice foi mantida em berço aquecido, com hidratação contínua por bomba de infusão e monitoramento constante. Permaneceu todo tempo acompanhada de sua avó paterna, que presenciou todo o cuidado prestado por nossa equipe.
Na madrugada de 19/06/2025, a paciente sofreu súbita parada cardiorrespiratória, tendo sido realizados todos os procedimentos e intervenções para reverter o quadro, mas, infelizmente, não foi possível evitar o falecimento.
Desde a chegada da pequena paciente, todos os recursos técnicos, humanos e estruturais foram empregados para oferecer o melhor cuidado à mesma. De toda forma, diante do recente posicionamento dos familiares, foi aberta sindicância pela Secretaria de Saúde de Arujá e, também, pela OS responsável pela gestão da unidade, para apuração ainda detalhada dos fatos.
Manifestamos profundo pesar e solidariedade à família neste momento de dor, colocando-nos à inteira disposição para quaisquer esclarecimentos”.
Avó de Alice denuncia negligência no atendimento do Pró-Criança
Rafaela Fernanda da Silva/Arquivo Pessoal
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