Estudantes da Ufba se mobilizam para nomear praça em homenagem a Milton Santos, que neste mês faria 99 anos

Como forma de homenagear a memória e o legado de um dos maiores intelectuais do Brasil e do mundo, estudantes de Direito da Universidade Federal da Bahia (Ufba) lançaram no mês de maio um abaixo-assinado reivindicando a renomeação da Praça das Artes da Faculdade de Direito (FDUFBA) para Praça das Artes Professor Milton Santos. A mobilização, que já conta com mais de 100 assinaturas, também pretende fortalecer o enfrentamento ao racismo institucional e ampliar o debate sobre a representação dos corpos negros no campo jurídico.

Nascido em Brotas de Macaúbas (BA), Milton Santos foi geógrafo, escritor, cientista, jornalista, advogado e professor universitário. Com mais de 40 livros publicados e tendo recebido 20 títulos de Doutor Honoris Causa em universidades nacionais e internacionais, o pesquisador é o único geógrafo latino-americano a ganhar o “Nobel da geografia mundial”, o Prêmio Vautrin Lud. A despeito dessa notoriedade, estudantes da FDUFBA, faculdade em que Santos se graduou em Direito, questionam a ausência de homenagens nos espaços da instituição à memória do intelectual e de outras referências negras.

“Enquanto existe uma saturação de homenagens à homens brancos nos espaços da FDUFBA, é (quase que) inexistente marcos, referências e espaços que reconhecem o legado, a luta, as produções e os acúmulos dos discentes, docentes e colaboradores negros e negras que se formaram e/ou atuaram nesta casa e, portanto, a afetou, disputou e constituiu”, aponta o manifesto divulgado por meio das redes sociais.

Aquilombamento para enfrentar o racismo

Tássio Silva, estudante de Direito da Ufba e membro do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular do Serviço de Apoio Jurídico (Najup/Saju) da instituição, explica que a mobilização surgiu como uma iniciativa de membros do Saju a partir do projeto Redes Antirracistas, promovido pelo Ministério da Igualdade Racial (Mir) em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), que tem fortalecido a articulação de estudantes negros e o debate racial.

“Por meio do projeto, e como o próprio nome sugere, está se constituindo uma rede entre os núcleos de assessorias de práticas jurídicas das universidades públicas em que estamos nos aquilombando e tendo ideias e conspirações para reinvindicação de um direito que não seja dissociado da justiça social, racial, de gênero e justiça epistêmica também”, aponta.

Membros do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular do Serviço de Apoio Jurídico (Najup/Saju) da Ufba, espaço de onde partiu a mobilização – Saju

O manifesto também denuncia que, recentemente, duas intervenções propostas por estudantes negros na FDUFBA foram “sequestradas”. A primeira, um banner com o Estatuto da Igualdade Racial da Faculdade de Direito da UFBA; a segunda, a intervenção artística “Anos de Luta da Ocupação Carlos Marighella”, idealizada pelo artista Rafael Moreno, moradores da ocupação e integrantes do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), instalada ao lado da sala do Saju. Diante dessas violações, Silva ressalta que o abaixo-assinado também é um instrumento de luta para mudar as estruturas da universidade.

“O povo negro sempre precisa andar unido, sobretudo quando caminha nesses espaços que foram negados para nós ao longo da história. Esse abaixo-assinado se torna uma munição para nós, para que a gente reivindique no âmbito institucional da universidade que nós nos vejamos nela. Pois nós não só a ocupamos, mas a transformamos, a construímos.”

Articulação de lutas

Em abril deste ano, um outro caso na Ufba também ganhou repercussão e ampliou o debate sobre racismo institucional. Uma decisão judicial havia determinado o cancelamento da convocação da professora Irma Ferreira Santos, aprovada de acordo com a Lei de Cotas em concurso da universidade, para lecionar na Escola de Música. Após mobilização dos estudantes, atuação da reitoria e do Sindicato dos Professores das Instituições Federais de Ensino Superior da Bahia (Apub), a docente conseguiu ser readmitida. Para Tássio Silva, a luta em defesa da professora e a mobilização pelo legado de Milton Santos também estão conectadas.

“A mobilização que surge a partir da violência que aconteceu com a professora Irma na Escola de Música é uma mobilização que se conecta com a que estamos dando corpo agora na Faculdade de Direito da Ufba e outras que nos antecederam e outras que ainda vão existir. São mobilizações que reivindicam se ver no espaço da universidade, que deve ser plural. Porque a partir da pluralidade é fomentada uma confluência de saberes para a construção de um verdadeiro conhecimento”, ressalta.

O abaixo-assinado foi lançado no dia 3 de maio, data em que Milton Santos completaria 99 anos. O formulário segue aberto até o fim do mês e pode ser preenchido através do link.

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