O uso da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para espionar adversários políticos no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) escancara o que o cientista político Paulo Niccoli Ramirez chama de “feições fascistas” da extrema direita brasileira. Em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, o professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) fez um paralelo entre a agência nas mãos de bolsonaristas e a gestapo, a polícia secreta oficial da Alemanha Nazista.
“Os bolsonaristas transformaram a Abin quase numa gestapo, num serviço secreto de posições fascistas, de controle da própria liberdade de expressão, da possibilidade de criticar os governos”, compara. Para ele, a perseguição a opositores “tem feições obviamente fascistas e é um crime previsto em lei, afinal de contas o papel da Abin é de garantir a segurança nacional, e não a segurança de meia dúzia de políticos que querem eliminar a oposição”.
A Polícia Federal (PF) indiciou nesta terça-feira (17) Bolsonaro; o seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ); e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin, pelo uso ilegal de ferramentas de monitoramento dentro do órgão. Segundo o relatório do inquérito sobre o caso que ficou conhecido como “Abin Paralela”, os indiciados fizeram uso do sistema israelense de geolocalização FirstMile para espionagem ilegal de políticos, jornalistas, advogados e críticos do governo Bolsonaro.
Ramirez também denunciou o envolvimento de empresários do agronegócio no financiamento de ações golpistas e alertou para possíveis novas “sabotagens” do Congresso Nacional aos projetos do governo caso o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) seja reeleito em 2026. “Essas sabotagens fazem parte de indivíduos que não sabem jogar o jogo democrático”, critica.
Para o professor, a tentativa de desmantelar instituições e perseguir a imprensa fez o Brasil despencar no ranking global de liberdade de expressão. “Agora [a posição no ranking] voltou a subir porque temos instituições que respeitam essa diversidade, e que, com a Justiça, tentam controlar grupos que atacam a democracia”, indica.
Indulto improvável e delação ‘cascata’
Sobre um indulto a Bolsonaro, atualmente inelegível, em caso de condenação, Ramirez avalia como improvável. A possibilidade foi mencionada pelo filho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), durante uma entrevista. “Os ministros do STF [Supremo Tribunal Federal] já afirmaram que indultos a Bolsonaro serão derrubados um a um”, diz. “A fala de Flávio Bolsonaro me parece muito mais desesperada”, complementa.
Para o professor, o maior temor do clã é que uma eventual delação premiada de Bolsonaro provoque um “efeito cascata” e envolva outros membros da família e aliados políticos, como generais e figuras do Centrão. “Eles buscam uma anistia generalizada, um calar de boca da Justiça, para que as investigações não sigam adiante e, assim, salvem a própria pele”, avalia.
Ele também considera que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, é visto com desconfiança pela família Bolsonaro, apesar de ser apontado como sucessor na próxima eleição. “Tarcísio foi quem mais traiu o bolsonarismo. Até mesmo participou de eventos junto ao governo Lula, fez elogios à reforma tributária do [ministro da Fazenda, Fernando] Haddad e conseguiu verbas públicas federais para a construção do túnel que liga Santos a Guarujá”, explica.
Para ouvir e assistir
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