Um levantamento inédito do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS) revela um cenário alarmante: a maior parte dos 497 municípios gaúchos segue despreparada para enfrentar eventos climáticos extremos, como enchentes, deslizamentos e enxurradas. Mesmo após a catástrofe de abril e maio de 2024, que deixou 183 mortos e prejuízos estimados em R$ 87 bilhões, as defesas civis municipais continuam operando com estruturas frágeis, ausência de planejamento e recursos escassos.
O estudo, conduzido por meio de um questionário enviado às prefeituras, obteve resposta de 485 municípios, o equivalente a 97,6% do total. A análise integra a estratégia orientadora e fiscalizatória do TCE-RS e visa subsidiar ações corretivas e fortalecer a resiliência das comunidades.

Segundo a equipe técnica do TCE-RS, o objetivo do levantamento foi diagnosticar a estrutura e a capacidade de resposta das defesas civis, com foco na prevenção. A motivação está na crescente frequência e gravidade dos eventos climáticos no estado. “Tais ocorrências revelaram a necessidade de um diagnóstico que orientasse o aprimoramento da fiscalização dessa política pública”, explicam os técnicos, destacando que o Tribunal atuou de forma proativa para induzir melhorias na administração pública.
O levantamento identificou fragilidades como falta de planos de contingência atualizados, ausência de mapeamentos de risco, carência de infraestrutura e inexistência de recursos orçamentários específicos. Em boa parte dos municípios, o enfrentamento a eventos extremos ainda é reativo, apontam os técnicos, o que limita a efetividade da resposta e amplia a vulnerabilidade da população.

Dados que preocupam
Segundo o diagnóstico da equipe técnica, 32 municípios (6,6%) não possuem legislação local sobre política de proteção e defesa civil; 87 municípios (17,9%) não têm plano de contingência; outros 215 têm planos desatualizados. Já 65 municípios (13,4%) não possuem órgão exclusivo de Defesa Civil, 94 municípios (19,4%) não têm nenhum servidor designado para a área e 175 municípios (36,1%) não contam com estrutura básica, como viaturas, barcos ou EPIs. Outros 184 municípios (37,9%) não reservaram recursos no orçamento de 2024 para prevenção e preparação.
Conforme ressalta o órgão, a situação é crítica inclusive nos 143 municípios considerados mais vulneráveis a desastres. Embora apresentem desempenho ligeiramente superior à média, as fragilidades persistem: 24 não possuem plano de contingência e 64 operam com planos desatualizados. Enquanto isso, 29 não contam com estrutura física ou operacional mínima e 54 não previram recursos orçamentários em 2024 para prevenção e resposta.
Tribunal atuará com recomendações a prefeitos
O TCE-RS anunciou que as fragilidades diagnosticadas serão abordadas nos processos de contas dos prefeitos, por meio de recomendações e alertas formais. “A importância do trabalho reside na constatação de que a vulnerabilidade da população frente a eventos extremos está diretamente ligada à ausência de planejamento e de estruturas adequadas”, afirma a equipe técnica.
“É imprescindível que os municípios desenvolvam políticas permanentes de gestão de riscos, com foco em prevenção, preparação e mitigação. As propostas incluem a capacitação de coordenadores, a elaboração de planos de contingência com participação social e a criação de estruturas com pessoal e orçamento adequados”, ressalta a entidade.
O diagnóstico aponta que, sem mudanças urgentes, o custo humano e material das próximas tragédias pode ser ainda maior. “O futuro da proteção e defesa civil no Rio Grande do Sul começa em cada município. E o tempo de agir é agora.”

Governo do estado fala em investimento recorde e capacitação
Procurado pelo Brasil de Fato RS, o governo do estado, por meio da Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa Civil, classificou o levantamento do TCE-RS como “de grande relevância” e afirmou que os dados irão apoiar diagnósticos e ações já em desenvolvimento.
Em nota, destacou que o investimento na área cresceu exponencialmente, saltando de R$ 900 mil em 2018 para uma dotação de R$ 559,1 milhões em 2025, em grande parte financiado pelo Fundo do Plano Rio Grande (Funrigs). “O fortalecimento da Defesa Civil é um dos pilares do Plano Rio Grande”, afirmou o governo.
Sobre a principal fragilidade apontada , a falta de planos de contingência, a Defesa Civil Estadual informou que realizou cursos de capacitação para todos os 497 municípios e que a existência do plano é hoje um requisito para o repasse de verbas “Fundo a Fundo”. Segundo o órgão, já há 420 planos na base de dados estadual. Ainda assim, o governo ressaltou que, pela legislação, os municípios são os protagonistas na gestão de riscos e desastres. Uma nova Plataforma Estadual de Gestão Integrada de Riscos e Desastres (PEGIRD) está sendo desenvolvida para auxiliar os gestores municipais no aperfeiçoamento desses planos.
O Brasil de Fato RS também procurou a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) para comentar o levantamento, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto para manifestação.
O relatório completo pode ser acessado neste link.

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