‘Escrevo pra existir’: Jô Freitas e a literatura que transforma a periferia

Das raízes sertanejas da Bahia às periferias de São Paulo, Jô Freitas construiu sua trajetória com palavras que ressoam como resistência. Atriz, poeta e escritora, é autora de Goela Seca, obra finalista do Prêmio Jabuti 2024 na categoria Contos — um marco não apenas pessoal, mas coletivo: “a periferia não apenas entra na literatura, ela a transforma”.

No mês do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, celebrado em 25 de julho, o Bem Viver, programa do Brasil de Fato, destaca os versos e a potência da trajetória de Jô Freitas, que transforma vivências em arte e debate social.

Sua escrita carrega a oralidade típica do sertão e a força de quem viveu na pele as violências estruturais que denuncia. “No Nordeste, brincar com as palavras é algo natural, cotidiano. Com o tempo, isso vira arte”, conta Jô. A poesia, para ela, nasceu como um ‘desembolorar da mente’, uma herança de seu pai, violeiro autodidata. Mais tarde, a escrita se tornaria instrumento de sobrevivência, resistência e reconstrução de identidade.

A primeira publicação, Flores, nasceu em meio ao luto. Após o assassinato de seu companheiro, Jô chegou a abandonar a escrita. “Não fazia mais sentido fazer arte. A arte não salvou da violência que ele sofreu.” Foi graças ao incentivo da ilustradora Rebeca Anitta, que entrou em contato com Jô desde o Japão, que a obra ganhou forma. “Comecei a escrever como se estivesse falando com ele. Era como dizer o que não deu tempo.” Flores se tornou um livro de despedida, mas também de renascimento, costurado por afetos e reconstrução.

Além da literatura, foram os saraus periféricos — como o Pretas Peri, Sarau das Pretas e O Que Dizem os Umbigos? — que moldaram sua formação política e poética. “Foi nos saraus que percebi que o que eu escrevia poderia ter leitores. E mais do que isso: me formaram como poeta e como pessoa. A arte não é para que todo mundo seja artista, mas para que consigamos enxergar o outro com os nossos próprios olhos”, afirma.

A vivência nos espaços de poesia falada a despertou também para as desigualdades raciais e de acesso no mercado literário. “Tem muita gente talentosa que não chega a grandes editoras por falta de oportunidade, não por falta de qualidade. Isso me forma politicamente. A literatura me ajuda a existir.”

Goela Seca, lançado em 2023, é uma obra marcada por esse atravessamento entre o pessoal e o político. Jô a define como um “pré-romance”, e já trabalha em novos projetos literários. “Ser finalista do Jabuti foi um passo enorme. É acessar um meio literário onde a periferia quase nunca entra. Estar lá foi um ato político e poético.”

A artista também atua com formação em cenopoesia, integrando palavra, cena e corpo em suas apresentações e oficinas. Sua arte tem como eixo central a escuta sensível, a ancestralidade e o pertencimento.

Mais do que reconhecimento, a arte para Jô é um modo de viver e dar sentido ao mundo. Em uma metáfora comovente, cita um conto de Eduardo Galeano: “Um menino queria ver o mar, mas o mar era tão grande que ele disse ao pai: ‘me ajuda a enxergar o mar’. É isso que a arte faz comigo. Me ajuda a enxergar.”

Jô Freitas segue escrevendo para se manter viva — e para que outras mulheres pretas e periféricas também possam se reconhecer, reexistir e florescer em meio ao concreto.

Os livros de Jô Freitas, incluindo Goela Seca e Flores, estão disponíveis no site: www.jofreitas.com.br

E tem mais…

Da cura da palavra à medicina da floresta. Enquanto tratores avançam sobre o Cerrado, o Bem Viver traz as raizeiras, mestras griôs de raízes e memórias, que respondem com redes de cura e resistência. Com mãos calejadas de terra e história, elas guardam o que os livros não escreveram: a ciência negra e indígena que permanece viva no chão do bioma.

Já em Porto Alegre (RS), um grupo de amigos negros apaixonados por corrida percebeu que a população negra é minoria nos espaços ao ar livre de prática de esporte da cidade. Em 2023, criaram o coletivo Corre Preto, que vem crescendo a cada edição e proporcionando saúde, pertencimento e representatividade a negras e negros de todas as idades.

Tem também receita com a chefe Gema Soto. Aprenda um delicioso arroz com curry.

E a Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto dá um salve sobre as práticas de cuidado com a terra no sul da Bahia.

Quando e onde assistir?

No YouTube do Brasil de Fato todo sábado às 12h55, tem programa inédito. Basta clicar aqui.

Na TV Brasil (EBC), sexta-feira às 6h30.

Na TVT: sábado às 13h; com reprise domingo às 6h30 e terça-feira às 20h no canal 44.1 – sinal digital HD aberto na Grande São Paulo e canal 512 NET HD-ABC.

TV UFMA Maranhão: quinta-feira às 18h20, no canal aberto 16.1, Sky 316, TVN 16 e Claro 17. 

Na TVE Bahia: sábado às 12h30, com reprise quinta-feira às 7h30, no canal 30 (7.1 no aparelho) do sinal digital. 

Na TVCom Maceió: sábado às 10h30, com reprise domingo às 10h, no canal 12 da NET. 

Na TV Floripa: sábado às 13h30, reprises ao longo da programação, no canal 12 da NET. 

Na TVU Recife: sábados às 12h30, com reprise terça-feira às 21h, no canal 40 UHF digital. 

Na UnBTV: sextas-feiras às 10h30 e 16h30, em Brasília no Canal 15 da NET. 

Sintonize

No rádio, o programa Bem Viver vai ao ar de segunda a sexta-feira, das 7h às 8h, com reprise aos domingos, às 10h, na Rádio Brasil de Fato. A sintonia é 98,9 FM na Grande São Paulo. Além de ser transmitido pela Rádio Agência Brasil de Fato.

O programa conta também com uma versão especial em podcast, o Conversa Bem Viver , transmitido pelas plataformas Spotify, Google Podcasts, iTunes, Pocket Casts e Deezer.

Assim como os demais conteúdos, o Brasil de Fato disponibiliza o programa Bem Viver de forma gratuita para rádios comunitárias, rádios-poste e outras emissoras que manifestarem interesse em veicular o conteúdo. Para ser incluído na nossa lista de distribuição, entre em contato por meio do formulário.

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