Exportadores ainda negociam inclusão do café na lista de isenções dos EUA

Foto: Reprodução/Redes sociais @realdonaldtrump

Apesar de ter poupado uma extensa lista de produtos brasileiros, como suco de laranja, aeronaves civis e fertilizantes, a tarifa de 50% imposta pelos Estados Unidos deve atingir em cheio alguns dos principais setores exportadores do Brasil.

No entanto, segmentos importantes como carne e café não foram incluídos na lista de exceções e agora enfrentam um cenário de incertezas. A partir de 6 de agosto, quando as taxas devem entrar em vigor, as exportações para os EUA podem se tornar inviáveis para muitos setores.

Diante desse quadro, representantes do agronegócio defendem a manutenção do diálogo com o governo americano nos próximos dias, na tentativa de incluir os produtos brasileiros na lista de exceções.

O mercado de café, por exemplo, já vinha enfrentando volatilidade. O Brasil é o maior exportador de café do mundo, e os Estados Unidos são historicamente um de seus principais destinos. Em 2024, o país exportou quase US$ 2 bilhões em café para os EUA, o que representou 16,7% do total embarcado.

O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) foi uma das entidades que se manifestaram sobre a nova taxação. A instituição informou que continuará em tratativas com parceiros nos Estados Unidos, como a National Coffee Association (NCA), para tentar incluir o café na lista de isenções do governo americano.

“Na relação comercial cafeeira entre EUA e Brasil, as nações são imprescindíveis uma à outra, uma vez que os cafés brasileiros representam uma fatia superior a 30% do mercado cafeeiro norte-americano, sendo o principal fornecedor ao país, ao passo que os EUA respondem por 16% das exportações do produto nacional, sendo o principal destino de nossas exportações”, destacou em nota o Cecafé.

A relevância do café para os EUA também é destacada por dados da NCA. Segundo um estudo realizado pela consultoria Technomic em 2022, 76% dos norte-americanos consomem café regularmente. A indústria cafeeira movimenta cerca de US$ 110 bilhões por ano, o equivalente a US$ 301 milhões por dia, e representa mais de 8% de toda a indústria de serviços alimentícios do país.

De acordo com o Cecafé, o setor nos Estados Unidos emprega mais de 2,2 milhões de pessoas e gera US$ 101 bilhões em salários. “A cada US$ 1 importado em café, são injetados outros US$ 43 na economia americana, o que movimenta US$ 343 bilhões por ano, cerca de 1,2% do PIB dos EUA”, afirmou o presidente do Cecafé, Márcio Cândido Ferreira.

Com esses números, a entidade alerta para o risco de inflação e aumento de preços nos EUA, caso a taxação sobre os cafés brasileiros se mantenha. “Seguiremos trabalhando junto aos nossos parceiros norte-americanos para que o café seja incluído entre os produtos isentos da tarifa de 50%”, acrescenta a nota assinada por Ferreira e pelo diretor-geral do Cecafé, Marcos Matos.

Cafés especiais também impactados

A Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) também expressou preocupação com os efeitos da medida. Segundo a entidade, os EUA são o maior importador de cafés especiais do Brasil, comprando cerca de 2 milhões de sacas por ano, com receita superior a US$ 550 milhões.

“Se mantida, essa medida impactará toda a comunidade global envolvida com cafés de qualidade, especialmente o Brasil como principal fornecedor, e os EUA, como principal consumidor”, declarou a BSCA. A associação reforça a importância do diálogo entre os países para preservar empregos, renda e uma parceria comercial construída ao longo de décadas.

Setor de café solúvel alerta para perda de mercado

A Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (Abics) também se manifestou contra a medida que impõe a tarifa de 50% às importações de café solúvel brasileiro. Em 2024, os EUA importaram cerca de 780 mil sacas de 60 kg do produto, o que corresponde a 20% das exportações brasileiras do segmento — sendo o país o principal comprador do café solúvel do Brasil.

“Voltando os olhos para o mercado norte-americano, o café solúvel brasileiro responde por mais de 25% do volume importado pelos EUA, sendo o segundo maior fornecedor a esse mercado. Diante da ordem assinada pelo presidente Trump, o Brasil, entre os principais fornecedores do produto aos Estados Unidos, é o país que sofrerá a maior tarifa, o que deverá prejudicar sobremaneira a nossa competitividade”, alertaram Fábio Sato e Aguinaldo Lima, presidente e diretor-executivo da Abics, respectivamente.

A associação teme perder mercado para concorrentes que sofrerão tarifas menores, como o México, que pode continuar exportando sem taxação, e outros países que pagarão de 10% a 27%. Por isso, a Abics também reforça sua atuação junto à NCA e autoridades brasileiras para reverter a decisão.

Impacto direto na cafeicultura capixaba

No Espírito Santo, estado que tem o café como principal atividade do agronegócio, a apreensão é ainda maior. Os Estados Unidos foram, no primeiro semestre de 2025, o destino de 41% do café solúvel e de 6% do café cru (arábica e conilon) exportados pelo estado.

Em entrevista ao ES no Ar, o vice-governador Ricardo Ferraço afirmou que o governo estadual acredita na possibilidade de o café ser incluído na lista de exceções, devido ao impacto não apenas na economia capixaba, mas também na norte-americana.

O secretário de Agricultura, Enio Bergoli, reforçou a preocupação. “O impacto pode ser significativo, já que o conilon é a base do café solúvel. Mas acreditamos na força da diplomacia e no interesse mútuo do setor privado dos dois países em manter esse comércio”, disse ao Folha Business.

Segundo ele, o governo do Espírito Santo tem enviado informações ao governo federal para embasar as negociações com os Estados Unidos. A expectativa é que o apoio do setor privado norte-americano, altamente dependente do café brasileiro, contribua para a retirada do produto da lista de taxação.

O vice-presidente do Centro de Comércio de Café de Vitória (CCCV), Jorge Nicchio, contou à coluna que todos os embarques previstos para julho foram realizados normalmente, sem cancelamentos ou adiamentos. No entanto, destacou que, desde o anúncio da tarifa, o mercado travou.

“Os embarques de julho ocorreram como previsto, mas desde o anúncio da tarifa de 50%, não se negocia mais café com os Estados Unidos”, afirmou Nicchio. Segundo ele, as vendas realizadas diariamente para embarques nos meses seguintes — agosto, setembro e outubro — foram suspensas.

O Brasil é o principal fornecedor de café para os Estados Unidos, o maior consumidor mundial do produto, com demanda anual de 24 milhões de sacas. Em 2024, mais de 8 milhões dessas sacas foram embarcadas pelo Brasil, sendo cerca de 20% com origem no Espírito Santo.

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