Servidores e estudantes tomam as ruas de Porto Alegre por salários, saúde e educação

Na manhã desta sexta-feira (15), Porto Alegre foi palco de um ato unificado que reuniu centenas de servidores públicos estaduais e estudantes. Mesmo com chuva, a concentração começou em frente à sede do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (Cpers Sindicato) e seguiu em caminhada até o Palácio Piratini. A mobilização, organizada pela Frente dos Servidores Públicos do RS (FSP/RS), levou à Capital demandas que vêm sendo discutidas em atividades regionais desde o início do ano em cidades como Santo Ângelo, Passo Fundo, Pelotas e Santa Maria.

O principal foco do protesto foi a reposição salarial de 12,14% para todas as categorias, reivindicação que, segundo os organizadores, busca corrigir anos de perdas no poder de compra. “O Rio Grande do Sul, neste último semestre, registrou um acréscimo de 11% da arrecadação de ICMS. Portanto, o nosso 12,14% de reajuste que estamos reivindicando desde março, ele já está defasado”, afirmou Érico Corrêa, do Sindicato dos Servidores do Quadro Especial da Secretaria da Administração e Recursos Humanos (Sindicaixa). Ele destacou que o estado está em último lugar no país em reajuste para servidores nos últimos cinco anos.

Para Alexandre Luzzi, da Associação dos Órgãos Centrais da Fazenda Estadual (Afocefe), o argumento de falta de recursos não se sustenta. “Nós temos margem para dar esse reajuste. Nós estamos dentro do limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal”, disse, questionando por que reajustes maiores só ocorrem em anos eleitorais.

Já Anuar Mello, presidente do Sindicato dos Servidores do Detran/RS (Sindet), apontou que servidores de nível médio do órgão acumulam mais de 70% de defasagem e ficaram de fora da última reestruturação. “Os nossos servidores de nível médio não receberam reajustes nessa reestruturação, ficaram com zero. Depois de 10 anos em mais de 70% de defasagem salarial ficaram com zero”, alertou.

A situação foi descrita por Sérgio Kumpfer, da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), como um sinal do tratamento dado pelo governo ao funcionalismo: “É uma humilhação para esse estado isso que está acontecendo com o funcionalismo público”.

Aurélia Alves, do Sindicato dos Servidores Públicos do Estado do Rio Grande do Sul (Sindsepe), lembrou que há categorias com salários baixos e não contempladas em reestruturações recentes.

Manifestantes caminham pelo centro de Porto Alegre durante ato unificado de servidores e estudantes – Foto: Rafa Dotti

IPE Saúde no centro das críticas

Além da reposição salarial, a defesa do IPE Saúde foi uma das pautas centrais. Servidores denunciaram limitações no atendimento e falta de médicos credenciados, apesar do financiamento do plano ser feito diretamente pelos trabalhadores. Érico Corrêa criticou a instrução normativa que restringe o número de dias de internação, afirmando que “o serviço segue sob ataque”.

Representando o Comitê em Defesa do IPE Saúde, Sargento Dutra cobrou mudanças imediatas: “Pare de destruir o IPE Saúde, porque nós precisamos de saúde. Não queremos ir pra fila do SUS. Somos funcionários públicos, estamos pagando bastante. Então, nós queremos atendimento de qualidade, credenciamento de mais médicos em todos os municípios do estado do Rio Grande do Sul”. Ele também defendeu renegociação com santas casas e mais transparência nas contas.

A deputada federal Maria do Rosário (PT) questionou as motivações por trás do que chamou de desmonte: “Qual é a intenção de destruir dia a dia o IPE Saúde? O IPE é uma estrutura fundamental para a dignidade e o respeito do servidor público, da servidora e das famílias”.

Nem a chuva desmobilizou estudantes e trabalhadores de ocuparem a Praça da Matriz em frente ao Palácio Piratini por educação e saúde – Foto: Rafa Dotti

Educação pública e a disputa sobre o futuro das escolas

A mobilização também se concentrou nas políticas estaduais para a educação. Rosane Zan, presidenta do Cpers, disse que o governo cria divisões no funcionalismo e prejudica o setor. “O governo Leite cria um grande poço em termos de divisão dentro do serviço público e principalmente na educação”.

Para a deputada estadual Luciana Genro (Psol), a melhoria da qualidade de ensino passa pela valorização de quem trabalha nas escolas: “Se o governo realmente quisesse melhorar a educação, a primeira coisa que ele tinha que fazer é dar reajuste salarial para os educadores, porque não se faz educação de qualidade com educadores mal pagos, precarizados, endividados, desesperados”.

Fetching content

O deputado estadual Halley Lino de Souza (PT) afirmou que o governo não cumpre o piso constitucional de 25% para a educação e que aposentados sofrem um descompasso salarial. Sindicalistas também criticaram a proposta de um 14º salário condicionado a metas, que, segundo eles, não vêm acompanhadas das condições necessárias para alcançá-las. “É uma farsa, pois não se dão as condições nas escolas”, afirmou Neiva Lazzarotto, da Intersindical.

Helenir Aguiar Schurer, ex-presidenta do Cpers e secretária de formação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), alertou para orientações do governo que estimulariam a aprovação de alunos sem que estejam preparados, o que poderia “gerar uma sociedade semianalfabeta”.

Estudantes também se posicionaram. “A gente está junto porque se não tem a valorização da comunidade escolar, não tem como o estudante estar dentro da sala de aula, não tem como o ensino ser de qualidade para os nossos estudantes”, disse Gabryelle da Silva, presidenta da União Metropolitana dos Estudantes Secundários de Porto Alegre (Umespa). Alejandro Guerrero, presidente da União Estadual dos Estudantes do Rio Grande do Sul (UEE/RS), defendeu a destinação de 10% do PIB para a educação e a implementação de cotas para pessoas trans nas universidades.

Servidores exibem faixas e cartazes cobrando reposição salarial de 12,14% e defesa do IPE Saúde – Foto: Rafa Dotti

Avaliação sobre a gestão estadual

Ao longo do ato, falas direcionaram críticas à condução do governo estadual, apontado como responsável por cortes e privatizações. Fabiano Salazar, do Sindicato dos Servidores da Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (Sindjus), afirmou que há falta de solidariedade com servidores penalizados.

“O governador é muito cruel com os funcionários e um péssimo gestor. Está pelando o estado do Rio Grande do Sul e massacrando o funcionalismo e deprimindo serviços públicos para a população”, completou Sérgio Kumpfer, da CNTE.

Jodar Pedroso Prates, do Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (Simpe/RS), disse que o vice-governador prometeu diálogo, mas não cumpriu. “Queremos o fim da destruição do IPE”, reforçou. Anuar Mello, do Sindicato do Detran, acusou o governo de dividir as categorias para enfraquecer a mobilização.

Conjuntura e unidade de lutas

Alguns discursos ampliaram a análise para o cenário nacional e internacional. Alex Saratt, vice-presidente do Cpers e representante da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), criticou a aproximação entre Donald Trump e Jair Bolsonaro, chamando-os de “dois fascistas, dois genocidas, dois golpistas que merecem o repúdio da consciência e da atitude das trabalhadoras e trabalhadores”. Alejandro Guerrero defendeu que o Brasil taxe grandes fortunas como contraponto à intenção de Trump de impor tarifas ao país.

A deputada federal Fernanda Melchionna (Psol/RS) alertou para o avanço da proposta de reforma administrativa, que, segundo ela, ameaça a estabilidade e visa privatizar serviços públicos. “É preciso lutar contra ela em todo o país”, disse, apontando também a importância de barrar a taxação de aposentadorias. A deputada federal Maria do Rosário (PT/RS) contextualizou o momento como “parte de uma agenda neoliberal internacional que atinge a autonomia científica e tecnológica do Brasil”. Neiva Lazzarotto reforçou a necessidade de atuação do governo federal para impedir a reforma.

Para Fabiano Salazar, a aliança entre trabalhadores e estudantes é central: “A unidade da classe trabalhadora, movimentos sociais e estudantes é o caminho para virar esse jogo no país e no estado”. Tiago Pedroso, do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região (SindBancários), defendeu a resistência contra o fechamento de autarquias e o desmonte do patrimônio público.

Ao encerrar o ato, Rosane Zan resumiu o espírito da mobilização: “Não vamos deixar que esse governo, que no último período massacra o serviço público, ache que a unidade aqui vai se desfazer”. – Foto: Rafa Dotti

A expectativa de diálogo com o governador não se concretizou. “Isso mostra o descaso do governador. Ficamos aqui esperando, aguardando, na expectativa que foi criada, que foi gerada e foi frustrada”, relatou Fabiano Salazar. Ele informou que um ofício foi protocolado para tentar agendar nova reunião, mas sem grandes expectativas.

Ao encerrar o ato, Rosane Zan resumiu o espírito da mobilização: “Não vamos deixar que esse governo, que no último período massacra o serviço público, ache que a unidade aqui vai se desfazer. Nós queremos 12,14% de aumento, queremos o IPE Saúde que realmente nos dê retorno, porque o IP é nosso. Vamos continuar nessa luta”.

O post Servidores e estudantes tomam as ruas de Porto Alegre por salários, saúde e educação apareceu primeiro em Brasil de Fato.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.