Fusão PSDB-Podemos: extinção ou um novo voo para os tucanos?

Criado por dissidentes do PMDB em 1988, durante a redemocratização do País, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) nasceu com o ideário de construir um estado moderno, que unisse o liberalismo econômico com o bem-estar social.

“Longe das benesses oficiais, mas perto do pulsar das ruas” era o lema do novo partido, que adotara um tucano como símbolo. O mascote ocupava lugar de destaque na mesa de autoridades no dia do lançamento da legenda, no auditório Nereu Ramos da Câmara Federal, em Brasília.

A ave foi escolhida por ser nativa brasileira e representar a defesa do meio ambiente. As cores do tucano – amarela e azul – eram uma referência à campanha das “Diretas Já”.

Na década de 90, o PSDB protagonizou transformações estruturais no País, liderando um processo de estabilização econômica com o Plano Real – seu principal legado – diante de um cenário de inflação galopante.

A implantação do Plano Real foi liderada por Fernando Henrique Cardoso, um dos fundadores da legenda, que primeiro foi ministro da Fazenda no governo de Itamar Franco e depois se tornou presidente da República por dois mandatos (1995-2002) – fase em que o PSDB viveu seu apogeu.

O governo tucano impulsionou a privatização de estatais, fortaleceu a responsabilidade fiscal e promoveu reformas no Estado – como a Reforma da Previdência de 1998.

Fora do governo, o PSDB teve papel de destaque na oposição durante os anos de hegemonia petista (2003-2016), sendo a principal voz questionadora dos governos de Lula e Dilma. Ocupava o posto da direita, na disputa com a esquerda (PT), pela influência política e comando dos rumos do País.

Mas, apesar de ter deixado marcas relevantes na construção do Estado moderno brasileiro e na política brasileira, o PSDB já, há algum tempo, não ocupa mais o espaço de liderança que um dia teve.

Por uma série de motivos que a coluna não vai destrinchar aqui, o PSDB, principalmente de 2010 para cá, perdeu muito de sua força eleitoral, de suas referências e até mesmo de sua identidade.

E, agora, o partido caminha para encerrar um ciclo como legenda independente. Caso a fusão com o Podemos se confirme, a tendência é que o “45” seja aposentado das urnas e o tucano – símbolo de um partido que um dia foi potência – extinto.

Fim ou renascimento?

Na última terça-feira, a Executiva nacional do PSDB aprovou, por unanimidade, a fusão com o Podemos. A decisão precisa ser ratificada pela convenção nacional – já marcada para o dia 5 de junho –, mas há uma concordância, pelo menos da maioria do partido, de que a fusão é o melhor caminho a seguir. Talvez, o único caminho.

Nas últimas eleições, o PSDB, que já ocupou 99 cadeiras na Câmara Federal, perdeu um espaço significativo. Elegeu apenas 13 deputados federais em 2022 – o pior desempenho de toda sua história. E isso mesmo estando federado com o Cidadania.

Com um resultado pífio das urnas, o PSDB ficou bem próximo de ser alcançado pela cláusula de barreira. Para o ano que vem, a cláusula vai exigir que os partidos elejam ao menos 13 deputados federais, mas de nove estados diferentes – os 13 do PSDB estão concentrados em oito estados.

Para 2026 também, a federação com o Cidadania deve ser encerrada. O diretório nacional do Cidadania se reuniu no dia 16 de março e decidiu não renovar a parceria com os tucanos.

Diante desse cenário, só restou ao PSDB buscar o caminho da fusão com o Podemos, não só por estratégia eleitoral, mas por sobrevivência política.

Já de imediato, com a fusão, o novo partido – que a princípio será chamado de “PSDB+Podemos” – passará a contar com 28 deputados e sete senadores e poderá, pelo menos por ora, respirar mais aliviado.

Tucanos capixabas a favor

Vandinho Leite / crédito: Ellen Campanharo

No Estado, as principais lideranças do ninho tucano são a favor da fusão. O presidente estadual da legenda, deputado Vandinho Leite, disse que a fusão vem em boa hora.

“Importante para montar chapas de deputados federais nos estados, porque o número de deputados federais é imprescindível num processo de fortalecimento pensando no futuro do partido (…) Acho que vem em boa hora. Ainda precisa ser aprovado em convenção, mas meu sentimento é que será aprovado”, afirmou o deputado estadual.

Se a fusão vingar, no Estado, quem presidirá a nova legenda é o deputado federal Gilson Daniel, atual presidente estadual do Podemos – conforme já noticiado pela coluna.

“A relação com o Gilson é muito boa e acredito que (o novo partido) vai se transformar numa grande potência, será o segundo maior partido (em número de prefeitos), atrás apenas do PSB. Acho que fica uma força muito bacana e vamos trabalhar o processo em conjunto”.

Sobre a possibilidade do PSDB acabar perdendo identidade e legado com a fusão, Vandinho descartou. “Acho que não descaracteriza. São dois partidos com visões semelhantes, de centro, um centro mais à direita”, avaliou. Vandinho está no PSDB desde 2015.

Projeto longe dos extremistas”

Luiz Paulo (foto: Chrystian Henrique)

O ex-prefeito de Vitória Luiz Paulo Vellozo Lucas, que preside o PSDB na Capital e faz parte da Executiva nacional da legenda, participou da reunião da última terça-feira e votou a favor da fusão. “O clima da reunião foi espetacular. Há muito tempo que eu não vejo uma reunião do partido com um clima tão positivo como esse”, disse à coluna.

Ele também fez coro a Vandinho ao citar as semelhanças entre os dois partidos: “O PSDB e o Podemos têm afinidades programáticas. Não é só uma junção para ficar maior e sobreviver e ter mais poder de barganha. É uma junção com o propósito de ter um projeto não populista, um projeto de oposição ao governo, mas não um projeto bolsonarista. É um projeto do centro democrático. A expectativa de todos nós, dos mais antigos como eu, é de que a fusão seja apenas o início da construção de um projeto eleitoral para 2026, longe dos extremistas”.

Após a reunião da Executiva nacional, Luiz Paulo reuniu lideranças tucanas em sua casa para informar sobre a decisão. “Vamos acompanhar (…) Nós pretendemos construir o partido para as eleições de 2016, filiar pessoas novas, trazer pessoas que estão fora da militância, afastadas, ajudar na construção das chapas e participar do processo eleitoral”.

Luiz Paulo disse que a questão do número e do símbolo do novo partido estão em negociação, mas isso não lhe tira o sono. “Vejo com tristeza é a situação da política brasileira hoje, com o predomínio dessa polarização que fez e ainda faz muito mal o Brasil”.

Animado com o Plano Real, Luiz Paulo se filiou ao PSDB em 1994. Por conta de divergências internas, deixou o partido por um tempo e se filiou ao Cidadania, onde disputou cargo de deputado federal em 2018, mas sem sucesso. Depois, retornou ao ninho.

Partido encolheu ao longo do tempo”

Max Filho

Integrante desde 2011 do ninho tucano, o ex-prefeito de Vila Velha Max Filho também é a favor da fusão. Membro do diretório nacional da legenda, ele disse que vota a favor, se for convocado.

Segundo ele, o PSDB foi a “grande vítima” da polarização ideológica que reina no País desde 2018. “O PSDB deixou de ser o principal partido de oposição a Dilma e foi anexado ao frágil governo Temer. Foi a grande vítima da polarização ideológica no País”, disse Max.

O ex-prefeito disse que tem acompanhado de longe as negociações sobre a fusão, mas a defende por se mostrar uma saída para a situação que o partido se encontra.

“Defendo a fusão porque o partido encolheu ao longo do tempo. Perdeu protagonismo e a própria reforma partidária que o PSDB defendeu lá atrás, com a adoção da cláusula de barreira, forçou a isso”, avaliou Max.

Desconfiança e afastamento

Já outros tucanos capixabas históricos não veem com tanto entusiasmo a fusão. Ou melhor, não têm esperança de que a junção com o Podemos irá tirar o ninho da “UTI”.

Ex-presidente estadual do PSDB, Jarbas de Assis lamenta o partido ter, segundo ele, mudado de perfil. “Tenho cerca de 20 anos de partido e entrei por acreditar em seu estatuto. A prioridade era a defesa intransigente da democracia e do social, o cuidado com os mais carentes. O que vemos hoje é um partido mais voltado ao liberalismo, o PSDB mudou de perfil”.

Jarbas disse que continua filiado, mas deixou de militar. Disse que está acompanhando de longe as tratativas sobre a fusão. “Ainda estou filiado porque tenho a esperança de que o PSDB volte a ser como ele foi criado”.

Para ele, o novo partido que nascerá da fusão não deve priorizar o campo social. “Estou acompanhando para ver o que vai acontecer. A tendência é que o novo partido seja mais liberal do que social. Então, eu estarei fora disso aí”, disse Jarbas. Ele presidiu o ninho capixaba por três anos.

O advogado Michel Minassa Junior, que também faz parte do ninho desde o seu início, deixou de participar da vida partidária do PSDB há algum tempo. Ele diz que não havia outra saída para o partido, além da fusão.

Estou filiado, mas não estou participando da vida partidária em função das transformações que o PSDB sofreu nos últimos tempos. Pra mim, o partido está respirando por aparelhos, perdeu completamente sua identidade ideológica. Acho que não tinha outra saída, o PSDB está na UTI”, disse o tucano.

Além das mudanças, Minassa avalia que as disputas internas também fizeram mal à legenda. “O conjunto da obra é muito ruim. Hoje, temos alguns membros apoiando a extrema-direita, sendo o PSDB um partido de centro”.

Ele não leva muita fé de que o PSDB volte a ser protagonista na política nacional após a fusão. “Não consigo dimensionar se a fusão vai fazer com que o PSDB retome o protagonismo ou se o transformará num puxadinho de outro partido. Fico triste com o fim do 45, espero que o tucano continue. Vamos aguardar o desenrolar”.

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