O movimento “Não ao Aterro, não ao Lixão”, de Viamão, e as entidades Conselho Indigenista Missionário do RS (Cimi-Sul) e Ação Ambiental, esta com sede em Curitiba, apresentaram na Promotoria de Justiça de Santo Antônio da Patrulha uma denúncia contra Gabriel Simioni Ritter, diretor-técnico da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (Fepam). A denúncia sustenta que, desde sua nomeação, em abril de 2024, Ritter emitiu vários documentos a favor da empresa RAC RS Ambiental LTDA, na qual ele já trabalhou e tem relações comerciais com um dos sócios.
A denúncia pede ao Ministério Público do RS que o diretor-técnico seja afastado imediatamente do cargo na Fepam, que seja aberto um processo administrativo interno no órgão para apurar as irregularidades apontadas e que todos os atos praticados e documentos assinados por Ritter a favor da empresa RAC RS Ambiental sejam considerados nulos. Ele já havia sido funcionário da Fepam entre janeiro de 2015 e janeiro de 2019, chegando a ocupar a presidência interina da fundação num determinado período.
Para embasar a denúncia, documentos apresentados pela Ação Ambiental mostram que, no dia 31 de julho de 2023, Ritter participou de uma reunião na Fepam sobre o aterro sanitário de Santo Antônio da Patrulha como representante da empresa RAC RS Ambiental.
As ligações societárias dele também são apontadas na denúncia, ao mostrar que Riiter é sócio da empresa Barra do Telha Geração de Energia Elétrica SPE LTDA, junto com Marcelo Silveira Neto – que, por sua vez, é sócio-diretor da empresa Cedro Inteligência Ambiental LTDA. A questão, segundo a denúncia, é que a empresa Cedro Inteligência Ambiental LTDA presta serviços para a empresa RAC RS Ambiental confeccionando estudos ambientais apresentados nos processos que tramitam na Fepam.
“O representante legal da empresa Cedro Inteligência Ambiental LTDA junto a Fepam é o senhor Marcelo Silveira Neto, que também figura como sócio do senhor Gabriel Simioni Ritter, que por sua vez é diretor da Fepam. Considerando a inequívoca ligação entre os senhores Gabriel Simioni Ritter e Marcelo Silveira Neto, visto que são sócios na empresa privada Barra do Telha Geração de Energia Elétrica SPE Ltda, e ainda mais a participação do senhor Gabriel Simioni Ritter qualificado como representante da empresa privada RAC RS Ambiental LTDA em reunião realizada na Fepam em 31 de julho de 2023, todos os atos administrativos chancelados pelo senhor Gabriel Simioni Ritter devem ser revogados, cancelados e anulados, conforme for o caso”, afirma trecho da denúncia, protocolada no último dia 24 de abril.
Conforme a denúncia, desde sua nomeação em abril de 2024, Ritter emitiu vários documentos a favor da empresa RAC RS Ambiental LTDA, como licença de operação, autorização geral, declaração de aprovação de termo de referência para elaboração de Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), e autorização para manejo de fauna silvestre.
“Ao analisar alguns dos documentos acima relacionados, encontramos elementos que colocam as referidas decisões sob suspeita, inclusive sobre a sua legalidade. Por exemplo, a Licença de Operação (LO) nº 01264 / 2025 autorizou a RAC RS Ambiental LTDA a realizar escavação para a retirada de material de cobertura dentro do empreendimento, atendendo a pedido da empresa, sendo que a referida autorização resultará na criação de uma grande cratera, elencando uma série de questionamentos sobre a possível utilização futura dessa área escavada”, afirma a denúncia.
“Em relação a Autorização Geral AUTGER Nº 00470 / 2024, a análise concluiu que ela contraria a Portaria Fepam nº 409/2024, alterada pela Portaria Fepam nº 419/2024 onde a determinação era muito clara de que para o recebimento de Resíduos Sólidos do Desastre Natural o empreendimento deveria ter local apropriado. Chama a atenção o fato de que a Portaria Fepam nº 409/2024, alterada pela Portaria Fepam Nº 419/2024 foi assinada pelo senhor Gabriel Simioni Ritter, a época Diretor-Presidente em exercício da Fepam. Como a empresa RAC RS Ambiental LTDA não possuía uma área adequada para o recebimento dos Resíduos Sólidos do Desastre Natural, uma alternativa para o problema foi a emissão da Autorização Geral AUTGER No 00470 / 2024”, diz outro trecho da notícia de fato feita ao MP/RS pela Ação Ambiental.
E conclui: “Levando em consideração que uma possível ampliação do aterro sanitário da empresa RAC RS Ambiental LTDA está proibido por determinação judicial, a emissão da Autorização Geral AUTGER Nº 00470 / 2024, assinada pelo senhor Gabriel Simioni Ritter descumprindo condicionante da LO nº 01264 / 2025, favoreceu irregularmente essa empresa. Lembramos que foi na empresa RAC RS Ambiental LTDA, que o senhor Gabriel Simioni Ritter prestou serviços no ano de 2023, e como comprovado por documentos oficiais mantém laços societários com o Diretor Presidente da empresa Cedro Inteligência Ambiental LTDA, senhor Marcelo Silveira Neto, que representa interesses da RAC RS Ambiental LTDA nos processos administrativos que tramitam junto a Fepam”.
Já o trecho da denúncia apresentada pelo movimento “Não ao Aterro, não ao Lixão” e o Cimi-Sul levanta suspeita com relação aos processos de licenciamento Nº 0047100567203 e 0047600567237 e a Licença Única Nº: 03027/2023. Segundo os denunciantes, os fatos envolvendo estas licenças, uma vez devidamente comprovados, “contaminam com o vício da nulidade absoluta tais processos administrativos, nulidade passível de ser arguida judicialmente, sendo o que desde já se requer”.
Os dois primeiros processos de licenciamento se referem ao polêmico projeto de instalação do aterro metropolitano em Viamão, na Fazenda Monte Verde, entre Cantagalo e Passo D’Areia, enquanto a Licença Única trata dos empreendimentos do empresário Arlindo Bianchini em trazer resíduos de soja transgênica e cinzas para incorporar no solo de suas fazendas.
“Por outro lado e na mesma linha de raciocínio, a situação levanta igualmente suspeição de mesma magnitude contra a Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (FEPAM) enquanto autoridade ambiental licenciadora, na medida em que uma vez comprovados os referidos fatos, o órgão ambiental teria falhado no dever de prestar proteção suficiente no que diz com o cumprimento não somente de suas obrigações e responsabilidades administrativas como de sua missão institucional de velar pela proteção ambiental”, destaca trecho da denúncia, recebida pelas procuradoras Roberta Morillos Teixeira e Ana Marchesan.
Procurada pela reportagem, a Fepam afirmou não ter conhecimento da denúncia contra o diretor-técnico Gabriel Ritter. “Em caso de eventual pedido de esclarecimento por órgãos de controle ou de processo judicial, a instituição se manifestará nos meios próprios”, diz nota da fundação.
Procurado pela reportagem, o Ministério Público informou que vai solicitar uma análise ao Grupo de Assessoramento Técnico da instituição a fim obter subsídios para o expediente em tramitação.