Os cursos superiores de medicina, direito, odontologia, enfermagem e psicologia devem ser ofertados exclusivamente no formato presencial. A medida, determinada pelo decreto da Nova Política de Educação a Distância (EAD), assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na manhã desta segunda-feira (19), em Brasília, também determina que os demais cursos da área de saúde e licenciaturas deverão ser ofertados nos formatos presencial ou semipresencial (híbrido)
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), o foco do novo marco regulatório é “o estudante e a valorização dos professores: a garantia de infraestrutura nos polos, a qualificação do corpo docente, a valorização da interação e mediação para uma formação rica e integral, independentemente da distância física.”
Na cerimônia no Palácio do Planalto, o ministro da Educação, Camilo Santana, disse que o marco regulatório traz regras mais claras para garantir qualidade da oferta.
“Nós acreditamos que a educação a distância pode proporcionar ao estudante uma experiência rica quanto aos demais cursos, desde que haja um efetivo compromisso de todos com o processo de ensino e aprendizagem, que se estabelece nesse modelo”, diz Camilo Santana.
As instituições de ensino superior terão dois anos de transição para adaptação gradual dos cursos.
Novidades
De acordo com o ministro Camilo, as principais novidades da política são:
as aulas online ao vivo deverão ter um máximo de 70 alunos por professor ou mediador pedagógico, para valorização destes profissionais;
criação do modelo semipresencial, com atividades presenciais físicas e atividades virtuais ao vivo (síncronas) mediadas.
mais atividades presenciais e avaliações, com infraestrutura física e tecnológica adequada nos polos EAD.
Os polos de EAD serão reconhecidos como espaços acadêmicos de apoio, devendo atender a requisitos mínimos de infraestrutura física e tecnológica, como salas de coordenação, ambientes de estudo, laboratórios e acesso à internet. Não será permitido o compartilhamento de polos entre instituições de ensino superior.
O decreto cria, ainda, o cargo de mediador pedagógico, com formação compatível com o curso e vínculo formal com a instituição de ensino. O número destes profissionais deverá ser informado no Censo da Educação Superior, anualmente. A função de um mediador pedagógico será diferente da do tutor, que era limitada a tarefas administrativas.
Outra determinação do decreto é a existência de pelo menos uma avaliação presencial a cada disciplina curricular, que deverá representar a maior parte da nota final, inclusive em cursos EAD.
Formatos das aulas
O decreto permite a modalidade semipresencial para cursos superiores, a exemplo dos cursos de licenciatura e da área de saúde, que poderão ser ofertados nesse formato, mas que terão limites para a carga horária virtual.
Em resumo, os três formatos contemplados pelo novo marco regulatório são:
presenciais: caracterizado pela oferta majoritária de carga horária presencial física, com limite de até 30% de EAD;
semipresenciais: atividades presenciais físicas (estágio, extensão, práticas laboratoriais) e virtuais ao vivo (síncronas) mediadas, além de carga horária a distância;
a distância: caracterizado pela oferta preponderante de carga horária a distância. Antes, não havia limite mínimo para atividades presenciais. Com o novo decreto, este limite mínimo passa a ser de 20% atividades presenciais e/ou online (síncronas) mediadas, com a exigência de provas presenciais.
O controle de frequência dos estudantes é obrigatório.
Relembre
Em junho de 2024, o MEC suspendeu a criação de novos cursos de graduação a distância, novas vagas e polos até 10 de março de 2025.
A medida teve o objetivo de reformular os referenciais de qualidade da EAD e criar um novo marco regulatório para oferta de cursos de graduação na modalidade EaD pelas instituições de ensino superior.
EAD em números
O MEC aponta que, no período de 2018 a 2023, os cursos a distância cresceram 232% no país.
Em 2023, o número de ingressantes em cursos EAD foi o dobro dos ingressantes nos cursos presenciais. De acordo com o Censo da Educação Superior 2023, divulgado em outubro de 2024 pelo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, na modalidade de EAD, a oferta de vagas foi de 77,2% (19.181.871); já as presenciais representaram 22,8% (5.505.259).
Se considerada somente a rede pública de ensino superior, a maior parte dos ingressos ocorreu nas graduações presenciais: 85% (481.578). Os outros 15% (87.511) são alunos de cursos à distância.
Na rede privada, a situação se inverte: 73% (3.226.891) dos ingressos em cursos de ensino superior foram na modalidade EAD, enquanto 27% (1.198.012) ingressaram em cursos presenciais.
Dos 5.570 municípios do Brasil, 3.392 deles têm estudantes matriculados em cursos de EAD. Esses municípios representam 93% da população brasileira. As informações são da Agência Brasil.
Repercussão
“Mais uma vez, o MEC toma decisões sem explicar o que, de fato, irá melhorar. Esse decreto é ruim, pois a tendência é de limitar o acesso a uma parcela da população, aumentando o preço e diminuindo a capilaridade entre, por exemplo, os estudantes de áreas remotas que enfrentam restrições logísticas. Hoje, em qualquer cidade com mais de 10 mil habitantes existe oferta de EAD, e ela chega inclusive nas aldeias indígenas e nas comunidades quilombolas, onde o presencial não chega”, avalia Francisco Borges, mestre em Educação e consultor de gestão e políticas públicas voltadas ao ensino da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT).
Borges destaca que o novo decreto também determina o limite de 70 alunos por turma em aulas ao vivo por vídeo, o que, na visão do consultor, não se justifica devido aos avanços que as próprias plataformas digitais proporcionaram nos últimos anos. “Qual a diferença entre uma aula online com 70 pessoas ou com 100 ou 120, se o chat é mediado por Inteligência Artificial, com respostas imediatas e filtradas? Se, em caso de dúvidas, os alunos podem acessar apostilas e outros conteúdos digitalizados, sem precisar sair do computador? O MEC, a meu ver, não incentiva o bom uso da tecnologia a favor da educação”, completa.
Dados do último Censo da Educação Superior mostram que, entre 2012 e 2023, a oferta de cursos de graduação à distância no Brasil cresceu 700%. O atual Ministro da Educação, Camilo Santana, frequentemente mostra preocupação com esse aumento, questionando principalmente a qualidade dos cursos online. Por outro lado, Francisco Borges defende que não há qualquer indício que aponte para isso, ressaltando o papel da Educação à Distância para a inclusão social.
“Estamos falando de um cenário que democratizou o acesso à educação. Por muito tempo, o ensino superior presencial se apresentava como uma alternativa inviável para uma realidade social em consolidação, pois o deslocamento do trabalho para a unidade de ensino, por exemplo, é um obstáculo muito grande, pois cabe destacar que a maioria dos estudantes no ensino superior é formada por adultos trabalhadores. Manter uma agenda de 4 ou 5 dias de aulas em sala, por mais de 3 horas, é uma variável de inadequação à realidade de uma sociedade pós pandemia – que se habituou ao remoto e ao uso das chamadas de vídeo até para as atividades sociais e de trabalho”, afirma o consultor da Fundação FAT.