Reintegração de posse: um olhar humanizado sobre o processo

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Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

*Artigo escrito por Maísa Porto, administradora e diretora de Gente e Gestão no IDEIAS

Os processos de reintegração de posse são marcados por complexidade, especialmente quando envolvem grupos em situação de vulnerabilidade. Este cenário geralmente traz duas grandes bandeiras que se encontram frente a frente de maneira firme e conflituosa: o direito à propriedade e a preservação dos direitos humanos.

O desafio da transformação da visão para ambos os lados entra em campo e, embora cumprir as leis seja essencial, é importante que as ações sejam conduzidas com empatia, planejamento e respeito aos direitos dos cidadãos envolvidos.

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Reintegração de posse e o momento de resistência

Estes, por outro lado, se encontram normalmente em um momento de resistência e muitas vezes de desconhecimento dos ritos relacionados ao processo.

O contexto vivido em diversas ocupações irregulares é regido por lideranças com narrativas convincentes, mas que escondem seus verdadeiros interesses e atos ilícitos.

Com perfis autoritários, elas blindam as famílias de forma que não sejam concedidos espaços para a comunicação sem intermediários.

Diante disso, é importante buscar alternativas que priorizem o diálogo, a transparência e que compreendam tal contexto e suas complexidades.

Traçar esse plano de ação com um olhar mais sensível é o primeiro passo para uma reintegração humanizada, baseada em uma abordagem acolhedora e centrada no diálogo.

No formato de reintegração de posse humanizada, a transparência é primordial durante o processo, proporcionando um ambiente de compreensão mútua, dando espaço para o entendimento e à formação do senso crítico das pessoas impactadas.

Um pilar fundamental para gerar a consciência do processo – o porquê da sua importância, os impactos socioambientais de uma ocupação ilegal – entre outros fatores, reduzindo resistências ou conflitos violentos.

Medidas para minimizar impactos

Outro ponto essencial dessa abordagem é a implementação de medidas que minimizem impactos físicos, econômicos e emocionais do coletivo.

Entre elas, apoio emergencial, como transporte, acomodações temporárias e assistência financeira, propiciando condições dignas para transição.

Além disso, a organização e o registro detalhado das benfeitorias e dos bens pessoais devem ser preservados e devidamente registrados, demonstrando um compromisso genuíno com a responsabilidade social e o respeito aos envolvidos.

Conjuntamente, as instituições envolvidas direta e indiretamente no processo, como conselho tutelar, secretarias de assistência social, órgãos ambientais, equipes de saúde, assistência social e demais profissionais capacitados, têm papel fundamental para viabilizar a promoção da cidadania às pessoas deslocadas. Da mesma forma, o apoio do policiamento, militar e civil, é imprescindível.

Preservação dos direitos humanos

Para além do caráter somente cumpridor de decisão judicial, os valores sociais e de preservação dos direitos humanos devem ser compartilhados entre todos que participam da operação.

Um exemplo sobre como o processo de reintegração de posse conduzido de forma humanizada pode ressignificar impactos é um caso emblemático para o time IDEIAS que ocorreu com um idoso abordado durante uma dessas ações no norte do Espírito Santo.

Abordado pela equipe de técnicos sociais, apurou-se que ele vivia em situação de rua, sem renda e sem vínculo com familiares devido ao alcoolismo, além de não possuir nenhum documento pessoal. Uma situação degradante, mas infelizmente, mais comum do que se possa imaginar.

Idoso acolhido por rede de apoio social

A abordagem humanizada não só proporcionou que o senhor fosse acolhido pela rede de apoio social, mas possibilitou a implementação de ações efetivas como regularização e emissão de todos os seus documentos pessoais, inclusão em programas de transferência de renda, aproximação e retomada do vínculo com suas filhas, além de encaminhamento para acompanhamento psicológico, psiquiátrico e medicamentoso.

Quando as reintegrações são conduzidas com um olhar humanizado, conforme citado acima, o processo alcança resultados transformadores e positivos que vão além da mediação de conflitos.

Ao aliar planejamento, diálogo e medidas de apoio, essas ações demonstram que é possível cumprir as exigências legais sem negligenciar o cuidado humano, ressignificando impactos, valorizando as comunidades e o território.

Maísa Porto é administradora e diretora de Gente e Gestão no IDEIAS
Maísa Porto é administradora e diretora de Gente e Gestão no IDEIAS. Foto: Acervo pessoal
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