
Pavimentação e expansão agrícola são fatores que ameaçam sobrevivência da Jacquemontia verae. Planta descoberta às margens de rodovia pode desaparecer em GO; veja vídeo
Uma nova espécie de planta foi oficialmente descrita para a ciência: a Jacquemontia verae, encontrada no Cerrado de Quirinópolis, em Goiás. O anúncio foi publicado no último mês de maio na revista científica Phytotaxa e representa um avanço significativo no conhecimento sobre a biodiversidade brasileira.
A descoberta é fruto de uma pesquisa iniciada em junho de 2019, durante um levantamento florístico na Serra da Fortaleza, na zona rural de Quirinópolis.
Apesar de recém-descoberta, já foi observado que a Jacquemontia verae oferece recursos florais para várias espécies de abelhas
Isa Lúcia de Morais
A planta foi identificada inicialmente pela bióloga e pesquisadora Isa Lúcia de Morais, da Universidade Estadual de Goiás, que, ao desconfiar de tratar-se de uma espécie ainda não descrita, enviou registros e amostras para os especialistas em táxon André Luiz Moreira, da Universidade Estadual de Feira de Santana, e Mayara Pastore, do Instituto Tecnológico Vale – Desenvolvimento Sustentável.
Após um longo e rigoroso processo de análise, que incluiu coleta de material botânico, ilustração científica e elaboração de artigo, a espécie foi oficialmente reconhecida seis anos depois
A descoberta é fruto de uma pesquisa iniciada em junho de 2019, durante um levantamento florístico na Serra da Fortaleza, na zona rural de Quirinópolis
Isa Lúcia de Morais
Relação ecológica e ameaça ao habitat
Apesar de recém-descoberta, já foi observado que a Jacquemontia verae oferece recursos florais para várias espécies de abelhas, desempenhando um papel relevante na manutenção desses polinizadores essenciais aos ecossistemas.
No entanto, a planta corre sérios riscos de extinção. O único local conhecido de ocorrência é uma área não protegida, sob crescente pressão de desmatamento, especialmente devido à expansão da pecuária e da monocultura.
A planta foi identificada inicialmente pela bióloga e pesquisadora Isa Lúcia de Morais, da Universidade Estadual de Goiás
Marlon Lopes Costa
“Além disso, as obras de pavimentação da rodovia GO-401, iniciadas em 2022, estão modificando drasticamente a paisagem, afetando diretamente o habitat da espécie”, aponta a pesquisadora.
Diante dessa situação, os especialistas avaliam, de maneira informal, que a Jacquemontia verae se encontra em estado Criticamente em Perigo (CR).
Como medidas urgentes, sugerem a criação de unidades de conservação na região e o desenvolvimento de iniciativas para coleta de sementes e cultivo em áreas de restauração.
O que diferencia a Jacquemontia verae?
A Jacquemontia verae pertence ao gênero Jacquemontia, que agora passa a contar com 67 espécies reconhecidas no Brasil, sendo 44 endêmicas – ou seja, exclusivas do território nacional.
A nova planta se diferencia de outras espécies semelhantes do mesmo gênero, como a Jacquemontia fruticulosa e a Jacquemontia heterotricha, por algumas características botânicas específicas.
O único local conhecido de ocorrência da planta é uma área não protegida, sob crescente pressão de desmatamento, especialmente devido à expansão da pecuária e da monocultura
Isa Lúcia de Morais
“Uma das principais distinções é a ausência de tricomas glandulares pedunculados, que são pequenos pelos com glândulas presentes em outras espécies, mas inexistentes na J. verae”, explica Isa Lúcia de Morais.
“Outra diferença marcante está na inflorescência, que na nova espécie apresenta um arranjo conhecido como dicásio, com pedúnculos – hastes que sustentam as flores – visivelmente mais longos”, completa a bióloga.
Além dos aspectos morfológicos, há também uma diferença importante na distribuição geográfica dessas espécies. A Jacquemontia verae foi encontrada, até o momento, apenas em uma única população localizada em Quirinópolis, no interior de Goiás.
Distribuição geográfica da Jacquemontia verae
Artigo científico
Já a J. fruticulosa ocorre no Paraguai e no estado de Mato Grosso do Sul, enquanto a J. heterotricha está presente na Argentina e nos estados brasileiros do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás.
Importância para a ciência e conservação
A descoberta da Jacquemontia verae não apenas enriquece o catálogo da flora brasileira, como também reforça a importância da preservação do Cerrado, o bioma mais devastado no Brasil em 2023, segundo levantamento do MapBiomas.
Atualmente, o Cerrado abriga 47 espécies do gênero Jacquemontia, consolidando-se como o domínio fitogeográfico de maior diversidade para este grupo de plantas.
“Descrever uma nova espécie é fundamental para compreender a biodiversidade e suas interações ecológicas, além de permitir a formulação de estratégias de conservação”, explica Isa Lúcia de Morais.
A Jacquemontia verae pertence ao gênero Jacquemontia, que agora passa a contar com 67 espécies reconhecidas no Brasil, sendo 44 endêmicas
Isa Lúcia de Morais
A expectativa é que, com a divulgação científica e o envolvimento da sociedade, a Jacquemontia verae não apenas sobreviva, mas se torne símbolo da resiliência do Cerrado e da importância da ciência na defesa do meio ambiente.
Uma homenagem à botânica Vera Klein
O nome da nova espécie é também um tributo: verae, em homenagem à professora Vera Lúcia Gomes Klein, uma das mais importantes botânicas do Brasil, especialmente no estado de Goiás.
Pioneira na área, Vera Klein construiu uma carreira marcada pela dedicação ao estudo da flora brasileira, com ênfase na sistemática vegetal e na participação ativa em eventos científicos nacionais.
“A escolha do nome foi uma forma de reconhecer as contribuições científicas da professora Vera e celebrar sua trajetória inspiradora na botânica brasileira”, destaca Isa.
O nome da nova espécie é também um tributo: verae, em homenagem à professora Vera Lúcia Gomes Klein, uma das mais importantes botânicas do Brasil, especialmente no estado de Goiás
Isa Lúcia de Morais
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