O número de postagens com ameaças a escolas nas redes sociais cresceu 360% nos últimos quatro anos, segundo pesquisa divulgada nesta semana pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O estudo, produzido em parceria com a empresa de monitoramento Timelens, identificou uma escalada preocupante da violência digital que afeta alunos, professores e diretores de escolas em todo o país.
O levantamento analisou 1,2 milhão de menções em redes sociais, fóruns, na deep web, YouTube e Google, com conteúdos relacionados a ataques a escolas, discurso de ódio e ameaças diretas. Apenas entre janeiro e maio deste ano, foram registradas mais de 88 mil menções violentas contra integrantes da comunidade escolar. Em 2024, o número havia sido de 105 mil, enquanto, em 2021, não passava de 44 mil.
Além do crescimento numérico, o estudo mostra uma mudança preocupante no ambiente de circulação desses conteúdos. Em 2023, 90% das postagens violentas estavam restritas à deep web. Em 2025, esse percentual caiu para 78%, o que indica maior exposição e circulação dessas mensagens na internet aberta, sem qualquer tipo de filtro.
Discursos de ódio em expansão

Esse movimento já era perceptível desde 2019, afirma Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). “Com a ascensão da extrema-direita, postar discurso de ódio se tornou simbolicamente aceito, o que é absurdo, mas infelizmente também foi um fato”, afirma ele, que coordenou o GT de Educação na equipe de transição do governo Lula e foi relator do grupo de trabalho do Ministério da Educação (MEC) que produziu em 2023 o documento Ataques às Escolas no Brasil – análise do fenômeno e recomendações para a ação.
Chama a atenção o quanto os comentários que exaltam autores de ataques a escolas proliferaram nas redes sociais nesse período. Se em 2011 – ano do massacre de Realengo – apenas 0,2% das mensagens continham esse tipo de apologia, em 2025 esse índice já chega a 21%. Muitos comentários retratam os agressores como vítimas de bullying que agiram em “legítima defesa” ou mesmo como heróis de uma “vingança justa”.
A violência também tem recortes de gênero. Embora a vitimização por cyberbullying atinja igualmente meninos e meninas (12% em ambos os grupos), meninos são os que mais praticam ofensas – 17% admitiram esse comportamento, contra 12% das meninas.
A pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Manoela Miklos, destaca a urgência de compreender esse desequilíbrio e alerta para o crescimento da violência contra meninas e mulheres no ambiente digital.
O ressentimento como mola propulsora

Segundo Renato Dolci, diretor de dados da Timelens, o cenário revela um novo ecossistema: “meninos solitários, hiper conectados e emocionalmente desamparados estão encontrando nas redes um caminho que começa com acolhimento e termina em radicalização”. Dolci entende que a violência online cresceu porque encontrou público, linguagem, recompensa e impunidade.
Daniel Cara, vê o ressentimento como principal motor dessa radicalização. “O objetivo (de quem profere esses discursos de ódio) é se vingar do ressentimento causado por experiências frustrantes nas escolas”, afirma.
Segundo o professor da USP, isso evidencia um vínculo direto com a extrema direita. “Por ora, absoluto. E, dificilmente, isso muda. A resposta violenta ao ressentimento é – historicamente – um método da extrema direita”, registra. A história de Hitler na Alemanha é um exemplo cabal disso, compara.
O estudo também abordou o tema da sexualização precoce. Entre meninas do 9º ano, a proporção que já teve relação sexual subiu de 19% em 2015 para 22,6% em 2019.
Entre os meninos, houve leve queda (de 35% para 34,6%), o que, segundo os pesquisadores, gera pressão adicional para que “acompanhem” o comportamento das colegas.
Outro dado preocupante mostra que menos da metade das meninas está satisfeita com a própria imagem corporal.

Prevenção e cultura de paz
Em resposta ao avanço da violência nas escolas, o estudo destaca como positiva a atuação do programa Escola que Protege, do MEC.
A iniciativa busca fortalecer a prevenção e a resposta a episódios de violência no ambiente escolar por meio de formação de profissionais, apoio psicossocial a comunidades afetadas e incentivo à cultura de paz.
Segundo o pesquisador Cauê Martins, do FBSP, a integração entre dados, políticas públicas e ações interministeriais – envolvendo MEC, Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e Polícia Federal – é essencial para enfrentar os riscos. “A combinação de ameaças abertas, celebração da violência e ausência de apoio emocional está corroendo o bem-estar de milhares de adolescentes”, alerta.
Daniel Cara ressalta ainda que tanto no relatório da transição de governo, quanto no relatório elaborado no MEC, já constava a recomendação de responsabilização das big techs por não retirar postagens criminosas. “É uma decisão acertada (a do STF). Está em ambos os relatórios, inclusive. Era uma demanda nossa desde 2022”, conclui ao lembrar o julgamento que ocorre na corte.
Penas maiores
O Senado aprovou projeto de lei que aumenta as penas para crimes cometidos nas dependências de instituições de ensino. O objetivo da alteração é inibir agressões e ataques a estudantes, professores e demais funcionários escolares. O PL 3.613/2023 altera o Código Penal e a Lei dos Crimes Hediondos para endurecer as penas de crimes cometidos em instituições de ensino, como lesão corporal dolosa e homicídio. O texto segue para sanção presidencial.
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