
Neste 25 de julho, Dia do Escritor, uma iniciativa realizada em 2019 pela professora Vanuzia Batista Santos, da Escola Municipal Chico Mendes, em Feira de Santana, merece ser lembrada como exemplo de que a escrita pode ir além das paredes da sala de aula e transformar vidas. Com o projeto “Cartas e E-mails: Encurtando Distâncias”, a docente resgatou a prática da troca de correspondências para conectar afetivamente estudantes de duas escolas públicas, promovendo a leitura, a escrita e valores como empatia e respeito.

A proposta surgiu do desejo de unir o aprendizado formal à emoção e ao afeto que a escrita pode carregar.
“O projeto teve como objetivo principal resgatar práticas de leitura e escrita com valor afetivo e histórico. Quisemos também desenvolver competências de leitura e escrita de forma significativa, além de fortalecer vínculos e incentivar a empatia”, explica Vanuzia.

Mesmo em plena era digital, o encantamento dos alunos foi imediato.
“Em um contexto em que as redes sociais priorizam mensagens rápidas e curtas podemos afirmar que venha a ser uma verdadeira batalha, a disputa de um teclado com um lápis, muito desafiador, mas nada impossível. Quando podemos deixar claro para o nosso estudante que a escrita autoral é muito diferente de mensagens curtas como as das redes sociais, permite que o aluno coloque sua voz, sentimentos, opiniões e vivências no papel. Isso contribui para o desenvolvimento da autoconfiança, da consciência de si e da capacidade de se posicionar no mundo”, pontuou.

Ao Acorda Cidade, a professora relatou que muitos alunos nunca haviam escrito ou recebido uma carta, o que despertou curiosidade e entusiasmo.
“Saber que havia um destinatário real esperando pela carta tornou a atividade mais envolvente. E a expectativa pela resposta motivou ainda mais os estudantes. Os estudantes puderam compreender a evolução dos meios de comunicação, perceberam o quanto a carta foi importante na vida de muitas pessoas no passado, muitas vezes era a única forma que tinham de mandar e receber notícias de amigos e parentes que moravam distantes. Com o avanço da tecnologia houve uma grande transformação nessas relações”, relata.

A ação envolveu alunos da Escola Municipal Chico Mendes e de uma escola do povoado Lagoa da Caiçara, no município de Serra Preta. A parceria com a Secretaria de Educação de Serra Preta foi fundamental para viabilizar a conexão entre os estudantes das duas localidades.
“Foi um trabalho conjunto, com apoio da equipe pedagógica da escola parceira e das famílias, que permitiu que esse projeto se tornasse uma vivência marcante. Posso afirmar que a escola parceira foi uma verdadeira coautora. Ela compartilhou da mesma missão: transformar a experiência em um aprendizado significativo, colaborativo e humano para todos os envolvidos. Enfim, com o apoio logístico da Prefeitura Municipal de Serra Preta e a devida autorização dos responsáveis dos estudantes foi possível promover esse momento incrível e emocionante”, contou.

O ponto alto do projeto foi o encontro presencial entre os estudantes. “Foi um dos momentos mais emocionantes. Ver os alunos se encontrando com quem trocaram cartas e e-mails, trocando sorrisos, abraços e até mimos… Foi inesquecível. Eles presentearam seus colegas com um chaveiro em forma de envelope, com o nome do projeto”, relembrou a professora.

Além da emoção, o projeto promoveu avanços concretos no aprendizado. Segundo a professora, os alunos tiveram a experiência de escrever com responsabilidade para algupem real e comunicar com uma intenção clara .

“Deu a eles motivação autêntica para escrever bem, organizar ideias e se expressar com clareza, de forma respeitosa e gentil pois, o respectivo destinatário, tratava-se de alguém que ainda não conhecia pessoalmente. Ao saber que alguém vai ler sua carta, os estudantes revisavam com mais cuidado, buscando clareza, correção ortográfica e coerência textual, um exercício natural de reescrita e aprimoramento”, afirmou.
Vanuzia também acredita que projetos como esse podem, sim, revelar novos talentos, já que muitos alunos se destacaram com seus textos e recitais, além disso, o projeto estimulou a criatividade e o prazer pela escrita.
“Diferente de atividades escolares muito técnicas ou engessadas, esse tipo de projeto permite ao estudante escrever com emoção, inventar, descrever, narrar, refletir e sonhar. Isso favorece o surgimento do prazer pela escrita e o desejo de se expressar artisticamente.Tivemos, inclusive, a participação da grande poeta, professora da rede municipal, Cláudia Gomes, que emocionou a todos com sua presença e sua poesia.”
Após o sucesso da iniciativa, a professora seguiu inovando. Em 2022, criou o projeto “Na trilha do Cordel”, no qual os estudantes estudaram as regiões do Brasil e apresentaram suas pesquisas em forma de poemas. Em 2023, o foco foram os patrimônios históricos e culturais de Feira de Santana.

“Cada turma escreveu coletivamente um cordel sobre lugares marcantes da nossa cidade. Foi tão significativo que fomos convidados para uma entrevista na TV Feira.”
Em 2024, Vanuzia coordenou o projeto “Navegando no Mundo da Leitura”, envolvendo toda a escola. As séries foram divididas por gêneros textuais: contos, poesias e crônicas.
“Os meus alunos do 6º ano criaram contos incríveis, como um inspirado no Castelo Garcia D’Ávila, em Praia do Forte. Eles ficaram fascinados com a história e criaram um conto coletivo emocionante.”
Hoje, Vanuzia sonha com um novo projeto, voltado exclusivamente para a poesia. “Sou encantada pela escrita de versos. Vejo na poesia um espaço de liberdade, onde podemos expressar alegrias, tristezas e sonhos”, compartilhou.

Apesar dos desafios enfrentados na educação pública, a professora mantém a esperança e o entusiasmo.
“A realidade das escolas hoje é desafiadora, mas não podemos desistir. Eu sigo firme na busca por levar uma educação de qualidade, acreditando no poder transformador da escrita e da leitura. Nosso papel é despertar o prazer de aprender e mostrar aos nossos estudantes que eles são capazes.”
Neste Dia do Escritor, histórias como a de Vanuzia nos lembram que incentivar a escrita nas escolas é semear futuros leitores, pensadores e autores. E que uma carta, um e-mail ou até um poema podem, sim, encurtar distâncias inclusive as da desigualdade.
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