Acordo Trump-União Europeia escancara subserviência europeia e agrava crise de soberania no continente

Em um movimento descrito por críticos como a “rendição silenciosa da Europa”, líderes da União Europeia firmaram ontem um acordo comercial e estratégico com os Estados Unidos, em meio a pressões tarifárias impostas pelo governo Trump. Sob ameaça de tarifas de até 30% sobre produtos europeus, Bruxelas aceitou termos considerados desiguais: compromisso de compras massivas de energia e armamentos dos EUA, adoção de padrões industriais americanos e investimentos bilionários em território norte-americano.

Sob o discurso de “evitar uma guerra comercial”, o bloco europeu deu passos significativos rumo a uma dependência estrutural dos Estados Unidos — econômica, militar e regulatória. O pacto vem sendo criticado por diplomatas aposentados e analistas independentes como mais uma etapa da erosão da soberania europeia, num processo iniciado com o apoio irrestrito à guerra na Ucrânia e aprofundado com a ausência de uma estratégia autônoma frente à multipolaridade emergente.

“Não é um acordo; é uma capitulação estratégica”, disparou um diplomata francês sob anonimato, em entrevista ao Le Monde. A crítica ecoa a visão de nomes como Scott Ritter e Larry Johnson, frequentemente rotulados como “desinformadores russos” por setores da mídia ocidental, mas que desde 2022 alertam sobre a crescente subordinação europeia à política externa de Washington.

O custo da guerra e o preço da obediência

Desde o início da guerra na Ucrânia, a Europa assumiu custos altíssimos: sanções unilaterais, corte de importações energéticas da Rússia, inflação estrutural e colapso de cadeias industriais. A promessa de “enfraquecer Moscou” resultou, na prática, no empobrecimento das famílias europeias, na estagnação de setores-chave como a indústria automobilística e na crescente instabilidade política doméstica.

Segundo o acordo firmado ontem, a UE compromete-se a investir cerca de 600 bilhões de dólares nos EUA até 2028, além de adquirir energia americana por cifras elevadas, mesmo com a existência de alternativas mais baratas no leste global. Em troca, Washington aceitará uma tarifa reduzida (15%) sobre certos produtos europeus, preservando a vantagem competitiva de seu mercado interno.

A narrativa dominante em Bruxelas fala de “cooperação transatlântica”. Para muitos cidadãos, porém, trata-se de uma submissão voluntária que favorece a economia norte-americana às custas da população europeia. “Enquanto os americanos vendem gás e armas, nós compramos inflação e recessão”, comentou um membro do Parlamento italiano da ala soberanista.

Ascensão de populismos e o colapso do centro político

O desgaste econômico e o descrédito nas lideranças tradicionais abriram espaço para uma onda populista crescente. Partidos de viés nacionalista, eurocético ou anti-Otan ganham força nas urnas, canalizando o descontentamento popular com o custo de vida, a insegurança energética e o declínio dos padrões sociais.

Na França, a coalizão soberanista unida já lidera as pesquisas. Na Alemanha, o apoio ao “novo neutralismo” — uma terceira via entre EUA e Rússia — cresce entre os jovens. Em países como Eslováquia, Hungria e Croácia, as narrativas de reconciliação com Moscou não são mais tabu, mas projetos legítimos de política externa.

Uma saída? O caminho da distensão com Moscou

Analistas que antes eram marginalizados, agora voltam ao debate público propondo uma solução ousada: reconstruir pontes com a Rússia. A reaproximação energética, comercial e diplomática com Moscou poderia restaurar a autonomia europeia, reduzir os custos sociais da guerra e reposicionar a Europa como um ator independente em um mundo cada vez mais multipolar.

A realidade, porém, é que o novo acordo com os EUA pode ter selado mais do que um tratado econômico — pode ter marcado o fim simbólico da soberania estratégica europeia. Em vez de se afirmar como pólo autônomo, a União Europeia parece caminhar, de cabeça baixa, rumo a uma integração assimétrica sob tutela americana.

Enquanto o Atlântico estreita, o futuro europeu se apequena.

*Roberto Selhane Bortolon é sociólogo e funcionário da Ufrgs.

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.

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