Artista que deixou as pessoas ‘fazerem qualquer coisa com ela’ fez outra performance que ‘poderia tê-la matado a qualquer momento’

Artista que deixou as pessoas 'fazerem qualquer coisa com ela' fez outra performance que 'poderia tê-la matado a qualquer momento'

Marina Abramović, uma das artistas mais influentes e corajosas do mundo, construiu sua carreira explorando os limites do corpo e da mente em experiências que desafiam o convencional. Duas de suas obras iniciais, em particular, destacam-se não apenas pela ousadia, mas pela forma crua como colocaram sua vida literalmente nas mãos de outros.

Em 1974, em Nápoles, Abramović realizou “Ritmo 0”. A proposta era direta e perturbadora: durante seis horas consecutivas, ela permaneceria imóvel enquanto o público presente poderia usar livremente qualquer um dos 72 objetos dispostos sobre uma mesa.

A seleção era intencionalmente ambivalente. De um lado, oferecia itens inócuos ou agradáveis: rosas frescas, um pincel, perfume delicado, frutas saborosas. Do outro lado, colocava nas mãos dos espectadores ferramentas de potencial violência: tesouras afiadas, navalhas, agulhas, uma corrente pesada e até uma pistola carregada.

O que começou com gestos tímidos – alguém colocando uma rosa em sua mão, outro passando perfume – rapidamente escalou. A passividade da artista parecia funcionar como um convite perverso. Roupas foram cortadas e removidas. A pele foi arranhada e cortada.

O momento mais aterrador ocorreu quando um participante colocou a arma carregada na mão de Marina, apontou-a para sua própria cabeça e posicionou seu dedo no gatilho. A fronteira entre observação e agressão, entre arte e violência real, dissolveu-se completamente naquela sala. Ao final das seis horas, a artista estava fisicamente marcada e emocionalmente exausta, testemunhando a face mais sombria da liberdade concedida.

Marina Abramović arriscou sua vida com a performance ‘Rest Energy’ em 1980 (Marina Abramovic Institute)

Marina Abramović arriscou sua vida com a performance ‘Rest Energy’ em 1980 (Marina Abramovic Institute)

Apenas três anos depois, em 1977, Abramović e seu parceiro artístico e amoroso, o alemão Ulay (Frank Uwe Laysiepen), apresentaram “Energia em Repouso”. Esta performance, apesar de durar apenas quatro minutos, condensou uma tensão quase insuportável. O cenário era minimalista: Marina segurava firmemente o corpo de um arco, inclinando-se para trás com todo o seu peso. Ulay, de frente para ela, segurava a corda do arco, tensionada ao máximo, com uma flecha de ponta aguçada apontada diretamente para o coração de Marina.

A única coisa impedindo a flecha de se cravar em seu peito era o equilíbrio perfeito e a força muscular contínua de ambos. Um microfone amplificava o som acelerado de seus batimentos cardíacos, ecoando na sala como um metrônomo de pânico. O título, “Energia em Repouso”, fazia uma referência irônica à famosa equação de Einstein (E=mc²), pois não havia repouso algum naquele momento.

Cada músculo tremia sob esforço. Cada respiração era calculada. A vida de Marina dependia exclusivamente da força, do controle e da concentração inabalável de Ulay – e vice-versa, pois qualquer desequilíbrio repentino poderia ter consequências fatais para ambos.

Felizmente, Marina sobreviveu (YouTube)

Felizmente, Marina sobreviveu (YouTube)

Abramović descreveu estas como suas duas obras mais perigosas. Em “Ritmo 0”, entregou seu corpo ao controle absoluto e imprevisível do público. Em “Energia em Repouso”, sua vida pendia da confiança extrema e da resistência física compartilhada com seu parceiro. O final da performance com Ulay foi tão intenso quanto sua execução.

Lentamente, com músculos falhando, eles aliviaram juntos a tensão da corda, abaixaram o arco e recuaram. O silêncio que se seguiu não era apenas a ausência de som, mas uma onda palpável de alívio que tomou conta dos artistas e da audiência, testemunhas involuntárias de um pacto de confiança levado ao seu limite absoluto. Essas performances permanecem como marcos brutais e fascinantes na história da arte performática.

Esse Artista que deixou as pessoas ‘fazerem qualquer coisa com ela’ fez outra performance que ‘poderia tê-la matado a qualquer momento’ foi publicado primeiro no Misterios do Mundo. Cópias não são autorizadas.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.