Após maior eleição interna da história, PT encara missão de reeleger Lula e construir um futuro sem ele

O 17º Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), finalizado neste domingo (3) em Brasília (DF), marcou a posse de Edinho Silva como novo presidente nacional da sigla. A escolha foi resultado do maior Processo de Eleições Diretas (PED) da história petista, que teve a participação de mais de 548 mil filiados em todo o país. Agora, a legenda chega ao segundo semestre de 2025 com dois grandes desafios à frente: garantir a reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva em 2026 e conduzir o partido à construção de uma nova referência política para o futuro.

Em discurso durante a cerimônia de posse, Lula foi direto ao apontar o tamanho da tarefa. Prestes a completar 80 anos, disse viver seu melhor momento político e pessoal, mas garantiu que só será candidato novamente se estiver em plenas condições de saúde. “A alternância de poder é saudável, mas não podemos permitir que a extrema direita volte a governar o Brasil”, afirmou, em referência ao bolsonarismo.

Lula também fez um chamado à coesão interna do partido e defendeu o retorno de figuras históricas à Direção Nacional, como José Dirceu e José Genoíno. Para o presidente, o PT precisa recuperar seus vínculos com a classe trabalhadora e manter sua centralidade no cenário político: “Esse partido, tantas vezes questionado, desde que se conquistou o direito de votar para presidente, sempre foi primeiro ou segundo colocado”.

Com apoio da tendência majoritária Construindo um Novo Brasil (CNB), Edinho Silva venceu o PED com ampla vantagem e terá pela frente a missão de construir unidade em um cenário em que, além da polarização política, o próprio PT passa por disputas internas.

Apesar de o novo diretório nacional já ter sido escolhido, a composição da Executiva Nacional segue indefinida e deve refletir um arranjo político conduzido por Edinho com base na proporcionalidade definida nas urnas.

“O desafio do Edinho é canalizar a força de seu campo político para fortalecer a unidade do partido e da militância frente ao desafio de derrotar a extrema direita e reeleger Lula”, afirma Leidiano Farias, delegado no encontro e membro Direção Nacional do Movimento Brasil Popular. Segundo ele, a definição da Executiva busca também um equilíbrio funcional e político que reafirme a hegemonia da CNB.

Para Jessy Dayane, secretária adjunta da Juventude da Presidência da República e também delegada do encontro, o desafio não está apenas na construção de uma nova liderança, mas na capacidade do partido de seguir conectado com a classe trabalhadora.

“O PT precisa continuar sendo esse instrumento que representa o projeto da classe no Brasil”, afirma. Ela vê no processo de renovação política – com a eleição de figuras jovens como Rosa Amorim, Maíra do MST e Luna Zarattini, entre outros nomes – uma sinalização de que esse movimento já está em curso.

Durante o encontro, também foram reafirmadas bandeiras históricas do partido e atualizadas suas prioridades programáticas. Estiveram no centro dos debates a defesa de um Estado palestino, a denúncia do genocídio em Gaza e pautas nacionais como a taxação de super-ricos, a defesa da soberania, o combate às desigualdades, o fim da jornada 6×1 no setor do comércio e a retomada das políticas sociais, como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida e o programa Pé de Meia.

PT entre dois ciclos: a última candidatura de Lula e a sucessão que virá

O tema da sucessão de Lula esteve presente nos discursos e bastidores do encontro nacional. Edinho Silva, o novo presidente do partido, frisou que o momento é “o mais importante da história do PT”, diante da necessidade de renovar quadros e garantir o futuro do projeto petista sem sua principal liderança.

Na fala de Lula, essa preocupação apareceu de forma clara. Ele afirmou que vive com energia de 30 anos, mas que não será candidato se não tiver “100% de saúde” e não enganará nem o partido nem o povo. Ao mesmo tempo, discursou firme em tom de campanha. “Se eles não estão gostando do que fizemos em três mandatos, que se preparem para o quarto”, disse, arrancando aplausos.

A ideia de que o “sucessor de Lula” será uma construção coletiva foi comum às fontes do partido e analistas ouvidos pelo Brasil de Fato. “O sucessor do Lula não é uma pessoa. É um conjunto de possibilidades de líderes. É o próprio PT e as relações que ele construiu com a sociedade”, resume Vitor Quarenta, membro da Direção Nacional entre 2017 e 2025 e integrante da tendência CNB.

Jessy Dayane também recusa a lógica de uma substituição individual. Para ela, o que está em jogo é a renovação de um programa capaz de unificar a militância e manter o vínculo com os setores populares. “A liderança do Lula é insubstituível. O que precisamos é garantir que o partido continue sendo essa referência da classe trabalhadora”, afirma.

Para José Antonio Moroni, do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a sucessão de Lula exigirá mais do que nomes. Segundo ele, será necessário construir uma nova forma de fazer política. “Não devemos pensar em substituir o Lula, mas em criar alternativas que se construam de forma coletiva, a partir das lutas do povo negro, das mulheres, dos territórios. Uma outra forma de exercer poder.”

Organização, trabalho de base e enfrentamento à extrema direita

Se a sucessão de Lula é um desafio de longo prazo, o PT também enfrenta urgências. Entre elas, a necessidade de ampliar sua presença territorial, aprofundar o trabalho de base e se fortalecer para disputar hegemonia na sociedade. O alerta foi feito por várias correntes internas e dirigentes durante o encontro nacional.

Jessy Dayane avalia que o enfrentamento à extrema direita exige, antes de tudo, um PT enraizado nas periferias e conectado com a realidade do povo. “É um desafio programático e de base. O PT precisa atualizar seu programa e reforçar sua referência nas classes trabalhadoras, com mais militância e mais presença nos territórios”, diz.

A avaliação é semelhante à de Leidiano Farias, da Direção Nacional do Movimento Brasil Popular. Para ele, o partido vive um dilema histórico: derrotar a extrema direita nas urnas e, ao mesmo tempo, preparar o ciclo pós-Lula. “O PT precisa reafirmar sua função como instrumento político da classe trabalhadora. Sem Lula e sem uma liderança da mesma estatura histórica, o partido só manterá seu peso se aprofundar sua face militante e ampliar sua inserção territorial”, afirma.

No mesmo sentido, José Antonio Moroni afirma que o bolsonarismo criou raízes populares, o que exige do PT um novo salto organizativo. “O partido precisa deixar de ser apenas uma máquina de disputas por estrutura e voltar a ser um espaço de lutas, causas e utopias. Só assim pode se diferenciar da direita”, alerta.

Nova fase exige menos burocracia e mais ação política

A posse de Edinho Silva marca o início de um novo ciclo na condução do PT. Com ampla hegemonia da tendência Construindo um Novo Brasil (CNB), a direção eleita tem agora o desafio de reorganizar o partido e evitar erros diante de um cenário político frágil. “Recai sobre o PT a responsabilidade de derrotar a extrema direita no Brasil. O momento é de risco”, afirma Vitor Quarenta.

A expectativa é de que o presidente conduza o processo com equilíbrio político e foco em fortalecer a estrutura partidária. “O protelamento busca um arranjo que combine o bom funcionamento da instância com a reafirmação da hegemonia da CNB”, explica Leidiano Farias.

Quarenta, que também publicou um artigo com balanço do PED, defende que o partido precisa ir além da “postura combativa” e construir uma nova ofensiva política. “Manter os punhos cerrados, mas tirá-los dos bolsos”, escreveu. Para ele, o PT corre o risco de se tornar apenas gestor institucional, perdendo vigor enquanto organização militante.

A militância, segundo ele, precisa estar no centro das definições estratégicas do partido, e a nova direção deve pavimentar caminhos para que a base assuma papel dirigente. “Que saibam colocar a combatividade em movimento, saltando para além das barricadas recuadas em que estamos entrincheirados atualmente.”

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