A atriz paraense Dira Paes é um dos 155 novos componentes do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), conhecido como Conselhão. Eles tomaram posse na manhã desta terça-feira (5), durante a 5ª reunião ordinária do órgão de assessoramento da Presidência da República, realizada em Brasília (DF).
“Somos um país livre, soberano e democrático”, disse a artista, a quem coube a leitura de um manifesto conjunto dos membros do conselho, na presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “A soberania nacional está declarada no artigo 1º da nossa Constituição. O respeito a esse princípio é condição inegociável nas relações com os demais países”, declarou Dira Paes, arrancando aplausos dos mais de 280 conselheiros presentes, entre os novos e os reconduzidos ao cargo.
A defesa da soberania nacional diante da guerra tarifária promovida pelo presidente dos Estados Unidos dominou as falas de autoridades e integrantes do Conselhão.
Em seu discurso, Lula enviou uma série de recados ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao mesmo tempo que defendeu que se estabeleça uma negociação séria, limitada aos aspectos comerciais da relação bilateral, e sem citar nomes, afirmou que a interferência externa “contou com o auxílio de verdadeiros traidores da pátria, que arquitetaram e defenderam publicamente ações contra o Brasil lá nos Estados Unidos”.
“Vários setores da economia são afetados pela covardia dos que se associaram a interesses alheios ao da nossa nação. Proteger a nossa soberania é um objetivo que está acima de todos os partidos e de todas as tendências”, declarou o presidente.
Soberania é reforma agrária
Para Ayala Ferreira, membro do Conselhão e integrante da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), é preciso aprofundar o debate sobre a soberania nacional, para além do aspecto econômico.
“Falou-se muito de uma perspectiva mais geral, uma abordagem mais econômica, do comércio exterior, mas eu senti falta do que poderia ser essa dimensão do que é a integração dos povos como uma resposta contundente a esses ditos donos do poder, que tentam determinar a soberania de um país ou de outro”, avalia. “Nada melhor do que responder um cenário que é de perigo da geopolítica internacional, do que fortalecer o que são os laços de cooperação e de solidariedade entre os povos”, completa.
Segundo a militante sem terra, a paralisia na reforma agrária no governo Lula 3, já amplamente denunciada pelo MST, ainda é um empecilho ao exercício da soberania brasileira.
“Se queremos fazer a defesa da soberania nacional, pensemos na destinação das terras para os sujeitos que vivem dessa relação com a terra. A reforma agrária tem a ver com esse debate, de que as soluções para a crise climática passam pelo reconhecimento dessa diversidade dos sujeitos que têm uma outra relação com a terra e com a biodiversidade”, destacou.
Banqueiro contra juros altos
Membro do Conselhão, o presidente da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Isac Sidney, entregou ao presidente Lula uma carta de intenções sobre o chamado “spread bancário”, que é a diferença entre a taxa de juros que um banco cobra de seus clientes em empréstimos e a tarifa que ele paga aos investidores para captar recursos. Traduzindo, o banqueiro foi duro na crítica à taxa básica de juros no Brasil, que está em 15%. “Juro alto é péssimo”, disse Sidney, ponderando em seguida. “Redução de juros não depende de atos voluntários. O que posso dizer é que não interessa aos bancos uma elevada taxa de juros”.
Segundo presidente da Febraban, a carta entregue ao presidente está centrada em seis temas que visam melhorar as condições de crédito no Brasil: a inadimplência; a prevenção e combate às fraudes; o apoio a micro, pequenas e médias empresas; o acesso a dados e plataformas digitais; questões relacionadas aos custos de tributos na intermediação financeira de crédito; e o fomento à competitividade.
Conselhão: história de participação e diversidade
A ministra da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), Gleisi Hoffmann, responsável pela coordenação do Conselhão, recobrou a história do órgão e seu papel na garantia da participação social na tomada de decisões do governo.
“O Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social foi instituído no primeiro mandato do presidente Lula para elevar o diálogo entre o governo federal e a sociedade brasileira. Ao longo do tempo, a trajetória do Conselhão mostrou o acerto daquela iniciativa pioneira em nosso país, confirmando a efetividade da participação social na definição das políticas públicas”, disse a ministra.

“As expectativas iniciais foram superadas quando se encontraram lado a lado representantes dos mais diversos setores e expressões da vida nacional em todos os campos. Porque o Conselhão fez mais do que assessorar o governo na tomada de decisões, tornou-se instância de reconhecimento e canal de diálogo para a imensa diversidade social que compõe o Brasil”, afirmou Hoffmann, lembrando que partiram do conselho iniciativas de políticas públicas importantes, como o recém criado Crédito do Trabalhador, o Projeto de Lei do Mercado de Carbono e o Pacto da Igualdade Racial, entre outras.
COP 30
Os conselheiros dedicaram boa parte do dia ao debate sobre as mudanças climáticas, com foco na realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP30), marcada para novembro deste ano em Belém (PA). Mesas temáticas, com a participação de quase todos os ministros do governo, debateram a concretização dos investimentos verdes no Brasil e o seu financiamento, o impacto das mudanças climáticas nas populações vulneráveis, a desinformação na democracia e na sociedade em tempos de emergência climática e os desafios da inteligência artificial.
Transformada em pauta negativa após a revelação de casos de extorsão em preços de aluguel na capital paraense, Ayala Ferreira concorda com a gravidade do problema, mas destaca que a atenção dos movimentos está voltada para a mesa de negociações que será instalada em Belém.
“O que está colocado para nós é que a única saída é pelo mercado, pelo tal do crédito de carbono que tem afetado os nossos territórios, por essas negociações que transformam os bens da natureza, a floresta, em valores monetários. O que seria esse fundamental? É o senso de responsabilidade com as futuras gerações “, afirmou Ferreira, que confirmou a participação do MST na Cúpula dos Povos, durante a COP30.
Na mesma linha, Robson Formica, da coordenação nacional do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), falou das expectativas dos movimentos populares com a Conferência do Clima.
“Que não seja apenas um debate de mudanças climáticas do ponto de vista do capital, das grandes corporações que trazem falsas soluções e que agravam a situação e as contradições sociais, econômicas que o povo brasileiro, povo latino-americano e os povos do mundo enfrentam e vivem”, destacou.
Participação
O Conselhão está organizado em 55 frentes de trabalho que discutem diversos temas relacionados à vida nacional e às políticas públicas do governo. Na reunião desta terça, esses entregaram ao presidente Lula um conjunto de propostas que resultaram das discussões internas.
Dessa forma, o presidente assinou o decreto que cria a Política Nacional Integrada para a Primeira Infância (PNIPI), que terá a missão de integrar, de forma coordenada e intersetorial, as políticas públicas voltadas à primeira infância, contemplando áreas como saúde, educação, assistência social, cultura, direitos humanos, justiça, habitação e igualdade racial.
Também foram assinados protocolos de intenção que envolvem ações de qualificação profissional, doação de equipamentos e um conjunto de iniciativas voltadas para a população negra. O presidente também recebeu do grupo voltado para o debate econômico um portfólio de investimentos no Brasil e, como parte da estratégia nacional para a questão digital, o presidente Lula deu posse ao conselho consultivo que irá auxiliar o governo em questões como a regulação da Inteligência Artificial e a regulação das plataformas digitais de mídia.
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