Vinte oito dias após ser anunciado pelo presidente Donald Trump, o tarifaço dos EUA contra as exportações de produtos brasileiros para o mercado estadunidense entrou em vigor. A partir de meia-noite desta quarta-feira (6), empresas americanas que comprarem produtos brasileiros pagarão 50% de taxa sobre eles ao governo, a não ser que esses produtos estejam numa lista de 694 exceções definidas pela Casa Branca.
A taxação tende a encarecer produtos brasileiros nos EUA, tornando a venda deles mais difícil. No Brasil, isso deve afetar a atividade de empresas e colocar empregos em risco. Parte desses impactos, aliás, já é sentido pela economia nacional.
O Brasil vende para os EUA cerca de 23% de todas as pedras naturais usadas para fabricação de bancadas e pias de cozinha e banheiro, por exemplo. Aproximadamente 82% de toda exportação dessas pedras sai por portos do Espírito Santo. No sul do estado, mais de 900 empresas integram essa cadeia de exportação, que envolve mineradoras, processadoras de mármore, exportadores e outras.
O presidente da Associação Brasileira de Rochas Naturais (Centrorochas), Tales Machado, disse que cerca de 100 empresas estão hoje praticamente paradas. “São empresas pequenas, com dez ou 15 funcionários, que trabalham diretamente com exportação”, explicou. “Essas aí estão em situação bem complicada.”
Tales contou que, logo que o tarifaço foi anunciado, no último dia 9, mudanças no setor começaram a ocorrer. Primeiro, algumas empresas anunciaram demissões. No dia 30, Trump oficializou o tarifaço e revelou uma lista de exceções. A pedra quartzito foi isenta do tarifaço. Mesmo assim, mármore, granito e ardósia seguem taxadas. Por conta disso, todos esperam que o volume total de pedras exportado venha a cair.
“A mineração desse tipo de pedra foi afetada no Brasil inteiro”, acrescentou Machado. “Todos os investimentos estão paralisados.”
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Mármore e Granito do Espírito Santo (Sindimármore), Amarildo Lugão, disse que tem recebido alertas de demissões no setor e disse que vai buscar as empresas para garantir os direitos dos trabalhadores. “As empresas que fizeram demissões em massa serão acionadas pela Sindimármore na Justiça”, disse Lugão.
Além das pedras naturais, foram incluídos no tarifaço a exportação brasileira de café, carnes, frutas, roupas e calçados, entre outros. Segundo o governo brasileiro, 36% das exportações brasileiras para os EUA serçao sobretaxadas.
O Sindicato da Indústria de Calçados de Franca (Sindifranca) informou que o tarifaço pode reduzir as exportações de suas filiadas em US$ 15 milhões no ano (cerca de R$ 82,5 milhões) e comprometer entre 1,2 mil e 1,5 mil postos de trabalho na região.
A Associação dos Produtores e Exportadores de Hortifrutigranjeiros e Derivados do Vale do São Francisco (Valexport) informou que o tarifaço afeta uma cadeia que gera 1,2 milhão de empregos na região, sendo 250 mil diretos e outros 950 mil indiretos. Tassio Lustoza, gerente executivo da associação, disse que os impactos tendem a ser sentidos nas próximas semanas, quando a colheita de manga para exportação teria que ser intensificada. “O pico da exportação deveria acontecer em setembro. Aí o tarifaço deve afetar”, afirmou.
Isentos também sofrem
Entre as 694 exceções do tarifaço definidas por Trump estão a exportação brasileira de aço e ferro, aeronaves e madeira. Apesar da isenção, no entanto, a notícia do tarifaço também prejudicou esses setores.
Reinaldim Barboza, presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário do Estado do Paraná (Fetraconpar), disse que sua entidade representa 82 mil trabalhadores. Desses, cerca de 42 mil trabalham no processamento de madeira, que em grande parte é exportada para os EUA.
Assim que o tarifaço foi anunciado, cerca de 10 mil trabalhadores tiveram que suspender seu trabalho. Parte deles foi demitida e parte entrou em férias.
Ele explicou que parte das empresas do setor já sofria com a concorrência vinda de outros países. Bastou a notícia do tarifaço surgir para que elas decidissem reduzir a produção. Segundo Barboza, apesar de a taxação ter sido cancelada para elas, provavelmente parte dos empregados não deve mais voltar ao trabalho.
“Trump muda de ideia toda hora. Traz muita instabilidade para economia e o mundo”, reclamou o sindicalista. “Isso afeta o trabalhador.”
Ernane Geraldo Dias, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Sete Lagoas (MG), viu o mesmo acontecer. Uma das empresas que atua na cidade desligou seu forno de processamento de ferro após o tarifaço. Deu férias a quem tinha direito e licença remunerada para quem não tinha para evitar demissões antes de ser excluída da taxação. Entre 130 e 140 trabalhadores foram afetados.
“Vamos ver se na retomada em 1º de setembro esta empresa volte a funcionar normalmente”, disse Dias, que se diz apreensivo quanto ao futuro dos cerca de 5 mil metalúrgicos da região.
Governo prepara medidas
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou na quinta (31) que há “casos dramáticos” de impactos do tarifaço no Brasil. Por isso, segundo ele, o governo segue tentando negociar com os EUA a reversão total da medida anunciada por Trump como uma retaliação ao Brasil por conta dos processos judiciais contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acusado de tentar dar um golpe depois de perder a eleição.
O governo também discute internamente medidas para conter os impactos do tarifaço. Empréstimos emergenciais, abatimento de impostos e até compras governamentais de produtos que deveriam ser exportados estão em discussão.
O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que também é ministro dos Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, disse que as medidas devem ser anunciadas pelo governo assim que o tarifaço entre em vigor – isto é, nesta quarta.
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