
No dia 5 de novembro de 2021, poucas horas antes do acidente de avião que tiraria sua vida, Marília Mendonça pegou o celular e decidiu ligar para alguns fãs. Era parte da divulgação de “Fã-Clube”, música do projeto Patroas, com Maiara e Maraisa. Para quem atendeu, foi uma surpresa inesquecível. Mas o melhor dia da vida daqueles fãs se tornou também o pior.
Essa relação próxima com o público não era novidade. Desde o início da carreira, Marília fez questão de derrubar a distância entre palco e plateia. Responder mensagens, entrar em grupos de WhatsApp, mandar áudios descontraídos (às vezes até depois de umas doses) era parte da rotina. “Ela colocava o fã em primeiro lugar”, lembra Chayeni Fiorelli, fotógrafa e criadora do primeiro fã-clube da cantora.
O quarto episódio do podcast “Marília – o outro lado da sofrência”, do g1, mostra como a relação intensa e próxima de Marília Mendonça com os fãs ajudou a impulsionar sua carreira, inspirou o projeto ousado Todos os Cantos e deixou marcas profundas no público após sua morte (ouça abaixo ou na sua plataforma de áudio preferida).
Marília Mendonça panfleta, cumprimenta e convida fãs para show em Teresina
Reprodução
Mas o que parecia apenas espontâneo também foi um pouco estratégico. Gustavo Marques, que cuidava do marketing da cantora, diz que Marília entendia o valor desse vínculo e transformou isso em combustível para o projeto mais ousado da carreira: “Todos os Cantos”. A ideia nasceu de um sonho e virou uma turnê-surpresa com shows gratuitos, panfletagem nas ruas e repertório inédito.
“Todos os Cantos” se tornou um dos projetos mais emblemáticos da música brasileira recente. Em 2018, reuniu 18 músicas gravadas em 17 cidades diferentes. A proposta inicial era passar por todas as 26 capitais e pelo Distrito Federal, mas a pandemia interrompeu o plano. O sucesso foi imediato e rendeu um Grammy Latino.
Mas a ligação com os fãs não se limitou aos grandes eventos com esses. Marília se mostrava como era: tênis, short jeans, zero preocupação com o “padrão” esperado para uma estrela pop. Essa identificação ajudou a consolidar seu espaço na música sertaneja e criou uma legião de admiradores que a tratavam como amiga.
Fãs de Boa Vista em foto com a cantora Marília Mendonça
Arquivo Pessoal
Após a morte de Marília, Chayeni Fiorelli chegou a trabalhar como fotógrafa de Lauana Prado, mas deixou o cargo em duas semanas. Reviver o ambiente dos palcos trazia lembranças dolorosas da amiga, e ela decidiu se afastar desse tipo de trabalho.
A morte repentina deixou um vazio difícil de preencher. Para muitos, ouvir certas músicas ainda é impossível. A psicóloga Júnia Drumond explica: “O luto é particular. Não se mede a dor do outro nem se compara. A gente precisa respeitar”.
Hoje, a lembrança de Marília segue viva nas vozes que cantam suas composições e nas histórias de quem viveu (mesmo que por poucos segundos) a chance de estar perto dela. Entre os fãs, persiste um consenso: no que depender deles, o legado permanece.
Marília Mendonça faz show em Balneário Camboriú (SC) em 2019
Guma Miranda/Divulgação