
Termômetro marca 43ºC durante onda de calor na Europa, em 1º de julho de 2025
REUTERS/Benoit Tessier
Preservar as florestas não será suficiente: as populações de aves tropicais diminuíram drasticamente devido ao calor extremo relacionado às mudanças climáticas, segundo um estudo publicado nesta segunda-feira (11) na revista “Nature Ecology & Evolution”.
A intensificação do calor extremo “causou uma redução de 25% a 38%” das populações de aves tropicais entre 1950 e 2020, em relação a uma situação na qual não tivesse ocorrido a mudança climática, concluíram esses cientistas baseados na Europa e na Austrália.
“As conclusões são bastante sérias”, comentou à AFP o autor principal do estudo, Maximilian Kotz, do Centro Nacional de Supercomputação de Barcelona e do Instituto de Pesquisa sobre a Mudança Climática de Potsdam (PIK).
Kotz afirmou que as aves nos trópicos enfrentam agora, em média, 30 dias de calor extremo por ano, contra apenas 3 durante o período de 1940 a 1970. A comunidade científica estima que as mudanças climáticas provocadas pelo homem tornam as ondas de calor mais intensas e prováveis em todo o mundo.
“Isso tem consequências muito importantes sobre a maneira como concebemos a conservação da biodiversidade: proteger habitats intactos é fundamental, mas sem enfrentar as mudanças climáticas, não será suficiente para as aves”, ressaltou.
Um pássaro pousa no Lago Suchitlan coberto por uma espécie de planta aquática (Pistia stratiotes) em Suchitoto, El Salvador, em 12 de agosto de 2025.
Marvin RECINOS / AFP
“Perto dos limites”
“Este estudo destaca o quão complexo é mitigar a mudança climática e a perda de biodiversidade”, declarou à AFP Aimee Van Tatenhove, do laboratório de ornitologia da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, que não participou do estudo e disse ter ficado “surpresa” com os números divulgados.
Para chegar a essa conclusão, os cientistas analisaram dados de observação de mais de 3 mil populações de aves em todo o mundo e utilizaram modelos estatísticos para isolar os efeitos dos climas extremos de outros fatores.
Cerca de metade das espécies de aves se encontra em regiões tropicais ricas em biodiversidade. Esses animais de plumagem colorida também prestam serviços indispensáveis aos ecossistemas, como a dispersão de sementes de plantas.
Mas os que vivem nessas regiões podem já estar “perto dos limites” de tolerância às altas temperaturas, que podem provocar golpes de calor (hipertermia) ou desidratação, destacam os autores.
Os cientistas não fornecem números por espécie de ave, mas citam, por exemplo, um estudo anterior que documentou o declínio de algumas delas em uma floresta do Panamá: o caça-moscas-real-amazônico e sua crista vermelha, o martim-pescador-verde ou o surucuá-de-barriga-amarela.
Numerosos fatores
Os episódios de calor extremo, cuja frequência tem aumentado, representam a principal ameaça, mais do que o aumento médio das temperaturas ou das chuvas, explica o estudo.
O declínio das populações de aves no mundo todo também está relacionado a outros fatores já evidenciados em numerosos estudos científicos, como espécies invasoras, perda de habitat devido ao desmatamento, uso de pesticidas ou caça.
No entanto, as conclusões do estudo “questionam a visão de que as pressões humanas diretas até agora têm sido o principal fator dos impactos sobre as populações de aves, em vez das mudanças climáticas nas regiões tropicais”, insistem os autores.
“O desmatamento tem um impacto evidente”, enquanto “é mais difícil ver os efeitos imediatos das temperaturas extremas”, que exigem a análise de conjuntos de dados de longo prazo, afirmou Aimee Van Tatenhove.
Mas todos esses fenômenos merecem ser compreendidos, sublinhou a pesquisadora: “Por que focar em um único fator quando são muitos os que levam as espécies à extinção?”
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