Defensoria pede R$ 10,1 milhões de Porto Alegre por tragédia na Pousada Garoa

A Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS) ajuizou, na quarta-feira (13), uma Ação Civil Pública (ACP) de R$ 10,1 milhões contra a Prefeitura de Porto Alegre e o proprietário da Pousada Garoa. O incêndio, ocorrido em abril de 2024, matou 11 pessoas e deixou outras 15 feridas em um local que acolhia moradores de rua e pessoas em extrema vulnerabilidade. A pousada vendia vagas para a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc). Em dezembro do mesmo ano, a Polícia Civil indiciou três pessoas por incêndio culposo: o proprietário, o então presidente da Fasc e uma fiscal do órgão.

Com 92 páginas, a petição é assinada pelos defensores públicos Gizane Mendina, do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos, Marco Antônio Vieira e Sá, subdirigente do núcleo, e Felipe Kirchner, do Núcleo de Defesa do Consumidor e de Tutelas Coletivas. O documento reúne relatos de testemunhas, registros de ofícios cobrando providências do Executivo, atendimentos prestados a familiares e sobreviventes. Também denúncia condições insalubres e inseguras e aponta falhas no monitoramento da qualidade e segurança das unidades contratadas pelo município.

Pedidos da ação

A DPE/RS solicita que os réus sejam condenados a pagar R$ 10,1 milhões ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor (Fecon/RS) e indenizações individuais: no mínimo 400 salários mínimos por morte, R$ 50 mil por danos psicológicos e outros R$ 50 mil por danos existenciais a cada sobrevivente.

O órgão também requer que, em até 20 dias úteis, a prefeitura implemente o programa Moradia Cidadã para as vítimas que necessitam de habitação ou apresente um plano individualizado para garantir moradia digna e segura a todos os sobreviventes, junto de um plano específico de atendimento.

Responsabilização

Em entrevista ao Brasil de Fato, a defensora Gizane Mendina explicou que a decisão de ingressar com a ação se deve “à gravidade das consequências do incêndio”, que resultou em 11 mortes e pelo menos 15 feridos, e “às graves falhas estruturais da pousada, as quais foram apontadas pelo inquérito policial e os laudos”.

Ela destacou que a ação também se baseia no “dever de fiscalização que a prefeitura tinha em relação àquela pousada”, já que, por meio da Fasc, o município tinha contrato para acolher pessoas em situação de vulnerabilidade e “deveria fiscalizar as condições de segurança”.

Sobre a influência do contrato na responsabilização, Mendina afirmou que “a relação contratual entre a Fasc e a Garoa é fundamental para determinar a responsabilização do município”. Segundo ela, ao firmar o contrato, a prefeitura assumiu “o dever legal e contratual de fiscalizar de forma criteriosa, contínua e permanente as condições de segurança e a integridade das pessoas acolhidas”.

“A responsabilidade é ainda maior pelo fato de serem pessoas em situação de extrema vulnerabilidade”, disse. Esse dever incluía não apenas verificar normas de prevenção contra incêndio e adequação das instalações, mas também “apontar a possibilidade de correção de eventuais irregularidades que fossem detectadas durante a execução do contrato”.

No entanto, constatou-se que “o prédio funcionava com estrutura precária, improvisada, sem o Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PPCI) atualizado, sem rotas de fuga e evacuação adequadas”, o que agravou as consequências do incêndio. “Essa relação é fundamental, porque há a indicação de uma omissão por parte do município em relação à fiscalização dessas condições”, afirmou.

Sobreviventes

A defensora informou que a Defensoria Pública constatou que a maior parte dos sobreviventes continuam em situação de extrema vulnerabilidade. Após o incêndio, a Defensoria enviou ofícios à Fasc solicitando informações sobre o atendimento prestado e identificou que “no mínimo um terço das pessoas ainda está em situação de rua, ou vive em moradias precárias, abrigos, casas de passagem, moradias improvisadas”.

“Muitas vítimas ouvidas pela Defensoria Pública também relatam essa mesma situação de insegurança quanto ao direito à moradia”, disse Mendina. Por isso, a ação pede medida urgente para “garantir uma moradia digna e estável a essas pessoas sobreviventes que não estão usufruindo desse direito”, além de acompanhamento psicossocial e atendimento médico integral. “Muitas delas ainda têm sequelas físicas por conta do incêndio, muitas delas com problemas respiratórios.”

“Esse contexto, o descaso com a situação atual de alguns dos sobreviventes, também leva a Defensoria a pedir medidas urgentes e reparatórias”, pontua.

“Muitas delas ainda têm sequelas físicas por conta do incêndio, muitas delas com problemas respiratórios”, destaca defensora – Foto: Luís Gomes/Sul21 | Foto: Luís Gomes/Sul21

Prevenção

Para evitar novas tragédias, Mendina defendeu medidas estruturais que assegurem segurança e dignidade nos espaços de acolhimento. Isso inclui “fiscalização rigorosa e contínua dessas unidades, exigência de alvarás, cumprimento de Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PPCIs), verificação de saídas de emergência, manutenção de extintores, hidrantes e instalações elétricas”.

Ela ressaltou ainda a importância de “verificar condições de higiene, acessibilidade e capacidade de ocupação, além da capacitação das equipes para prevenção e resposta a emergências”. Segundo a defensora, a integração dessas medidas, com monitoramento constante e respostas rápidas em situações de perigo, é “absolutamente necessária para preservar a dignidade humana das pessoas em vulnerabilidade nos espaços de acolhimento”.

Expectativas

Com pedidos liminares apresentados, a expectativa da DPE/RS é que “o juízo analise esses pedidos e acolha as demandas urgentes que dizem respeito à criação de um plano individualizado de atendimento para as vítimas sobreviventes, no que toca ao atendimento psicossocial e também ao direito à moradia”.

Os próximos passos incluem a citação dos réus para responderem à ação. Ao final, a Defensoria espera responsabilização “com a condenação ao pagamento das indenizações às vítimas sobreviventes, aos familiares das vítimas fatais pelos danos morais sofridos, e também o acolhimento do pedido de indenização por dano moral coletivo”.

CPI da Pousada

A tragédia levou à criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara de Vereadores de Porto Alegre. A CPI foi proposta pelo vereador Pedro Ruas (Psol) em 6 de janeiro de 2025, um mês após a conclusão e encaminhamento do inquérito policial ao Ministério Público, contando com as 12 assinaturas de todos os integrantes dos partidos de oposição. A instalação da comissão ocorreu em 26 de fevereiro.

Em junho, a Câmara votou o relatório oficial da CPI, que responsabilizou o proprietário André Kologeski da Silva e isentou os agentes públicos de culpa. No entanto, o presidente da CPI, vereador Pedro Ruas (Psol), apresentou um relatório divergente, incluindo o prefeito Sebastião Melo, o ex-secretário de Desenvolvimento Social Léo Voigt e o ex-presidente da Fasc Cristiano Rorato como responsáveis pelas mortes e feridos no incêndio.

*Com informações da Ascom DPE/RS.

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