
Orquestra embala clássico do suspense em sessão de cinema especial em Bauru
A noite do dia 14 de agosto, em Bauru (SP), foi marcada pelo encontro do clássico com o inovador. O Teatro Municipal recebeu o Cine Concerto, promovido pelo Sesc, que apresentou o clássico filme “Psicose” (1960), embalado pela Orquestra Almai, da capital paulista.
O suspense já conhecido conta a história de Marion Crane, uma mulher que, após roubar 40 mil dólares, foge e decide passar a noite em um hotel à beira da estrada, gerenciado pelo famoso Norman Bates.
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Os jogos psicológicos e sombrios da narrativa do filme fazem dessa estadia um horror, seguido por uma trama policial que prende o telespectador do início ao fim. Outro grande fator que contribui para o terror de Alfred Hitchcock ser tão inesquecível é sua trilha sonora, que ganha um novo destaque com a proposta imersiva do Sesc.
O longa foi acompanhado pelos músicos da orquestra ao vivo, trazendo a icônica trilha sonora original de Bernard Herrmann. As tensões e emoções do filme foram bem representadas pela orquestra paulista, que levou o público ao deleite.
Filme ‘Psicose’ foi exibido em Bauru (SP)
Divulgação
Não é a primeira vez que o Sesc Bauru oferece uma experiência assim. No início deste ano, houve uma sessão de “Central do Brasil” (1999), que teve a mesma proposta de dar vida ao filme com o apoio da orquestra Cine Mancini. A exibição, na ocasião, foi no auditório da unidade.
A proposta de trazer tais mostras não deve ficar restrita apenas aos dois filmes. A animadora cultural Etiene Amaro conta que, a ideia, é trazer novos longas nacionais e internacionais periodicamente.
“O Sesc Bauru tem pensado mostras de cinema sempre temáticas em uma programação mensal, com exibições em que a música e os espaços alternativos combinem a magia do cinema, como a gente conhece, com propostas inovadoras”, conta.
Sessão foi acompanhada pela orquestra ao vivo em Bauru
Reprodução/TV TEM
A sessão
A sala cheia do Teatro Municipal “Celina Lourdes Alves Neves”, com todos os ingressos vendidos, traduz a importância do local para a cidade. Construído no início dos anos 2000, o teatro passou os últimos dois anos sem receber ninguém na plateia, devido à reforma pela qual passava na estrutura e climatização.
Foi reinaugurado em maio deste ano e receber a sessão do filme de Hitchcock é uma forma de restabelecer o local como um importante ponto de cultura da cidade, reunindo um público de diferentes gerações.
“É um clássico atemporal. A gente tem aqui desde pessoas 60+ que vêm para sentir aquela nostalgia, como também pessoas jovens que vêm conhecer de pertinho como é essa mística do Hitchcock, com essa nova proposta que é realmente inesquecível”, relata Etiene.
No meio dos espectadores, a musicista Giovana Contador estava assistindo a “Psicose” pela primeira vez. Apesar disso, já havia passado pela sensação de acompanhar a trilha sonora de um filme ao vivo, em São Paulo, quando assistiu à exibição de “O Senhor dos Anéis”.
“É um primor o Sesc trazer esse espetáculo para Bauru. Eu estou super feliz de ter aqui na minha cidade um tesouro como o Teatro Municipal.”
Além disso, ela aproveitou sua formação para destacar a importância da trilha sonora para um filme. Ver a música ser desenhada ao vivo toca dentro dela diferente de como se estivesse assistindo a uma obra normal. Sua relação com o espetáculo também se engrandece com o fato de conhecer alguns músicos da orquestra e poder afirmar o talento de cada um deles.
“Os filmes de terror, se não tivessem uma trilha sonora, intervalos específicos, escalas e acordes específicos, não dariam medo na gente.”
Para quem não está acostumado, vivenciar esse estilo de exibição cinematográfica pode até mesmo ser interessante para aguçar os próprios sentidos, ao receber muitas informações que precisam ser captadas. É o que acredita a artista visual Daiana Terra, que também estava na plateia do filme.
Foi o segundo contato com esse estilo de exibição cinematográfica. Isso porque ela também esteve presente na exibição de “Central do Brasil”, em fevereiro deste ano.
“Quando eu vejo o filme com a orquestra, a experiência amplifica. Às vezes eu até fico perdida. Será que olho para a tela? Será que olho para a orquestra? E eu não estou acostumada, assim como muitas pessoas, imagino.”
Hoje, com os streamings, não existe a condição de escuta em casa, com várias coisas acontecendo ao mesmo tempo. Já na apresentação, as pessoas estão imersas, ouvindo a música, vendo o filme e se impactando.
Com todos os atributos do espetáculo, a combinação da orquestra com o filme se torna um casamento de um par perfeito e mexe com todos os que têm a oportunidade de acompanhar.
Teatro ficou lotado para sessão do projeto que une cinema e música em Bauru
Reprodução/TV TEM
União entre som e vídeo
O diretor Alfred Joseph Hitchcock é estudado desde o século passado até os dias de hoje. Sua obra, que por si só demonstra sua força, é potencializada pelo tratamento ao vivo que a orquestra dá ao produto.
É no cerne dessa ideia que surgiu o projeto Cine Concerto, no qual os diálogos e sound effects do filme são mantidos, como no cinema, e apenas a música é executada ao vivo.
Anselmo Mancini, diretor e idealizador do projeto, vem pesquisando há mais de dez anos esse tipo de exibição. Teve a oportunidade de fazer um projeto de doutorado sobre o assunto, além de pesquisar e desenvolver sua técnica de execução.
Para ele, essa imersão que resgata músicas de filmes antigos é um dos principais pontos para atrair espectadores. “Jamais um filme como ‘Psicose’ ia lotar um cinema como hoje, que temos um teatro lotado justamente pela experiência ao vivo”, diz.
Ele acrescenta que não é fácil produzir todo o evento, pois exige bastante ensaio e atenção aos múltiplos detalhes.
“Desde a transcrição das partituras das músicas originais, tem também um trabalho de som e edição dele para que possa ser viabilizada a execução do ao vivo, além de um sistema de sincronização no qual temos todos os detalhes de entradas e saídas das músicas.”
O maestro tem uma tela na qual possui pequenos detalhes em forma de compasso, o andamento da trilha, a faixa que será tocada naquele momento, dentre outros aspectos. Todo o trabalho é feito para reproduzir a música ao vivo, de forma idêntica ao filme.
O maestro Alexey Ogalla, ao mesmo tempo em que realiza um sonho de fazer “Psicose”, coordena toda a sincronização da música com o filme por meio da pequena tela à sua frente.
“Eu preciso olhar para essa tela, porque lá existem informações, como pistas para saber a hora que vamos entrar. Vejo no time code. Então, vou acompanhando tudo isso e lendo as partituras, além de dirigir as músicas ao mesmo tempo.”
O sucesso é tão grande que a orquestra já viajou para todo o Brasil e outros países. Os filmes apresentados são diversos: dos clássicos aos atuais, passando até mesmo pelos desenhos animados.
“Psicose”, em especial, marca quem assiste também pela trilha sonora, que fica na memória de qualquer um. Para Anselmo, isso não ocorre à toa.
“A música do Bernard Herrmann é, além de densa e tensa, uma música de belíssima expressividade. É uma aula de orquestração. As pessoas saem de olhos arregalados pelo impacto que aquilo dá ao vivo”, conta.
A memória afetiva que a música traz, impulsionada pela experiência promovida pela orquestra, é vivenciada pelo violinista Alessandro Oliveira. Ele é um dos músicos da Almai e é apaixonado pela trilha sonora de “Psicose”. Com o projeto, ele teve a oportunidade de estar no palco, embalando o filme.
O preparo dos músicos é árduo. Inicialmente, eles precisam assistir ao filme várias vezes, para ter algumas referências visuais e auditivas, além de estudar as partituras junto do maestro. São muitos os ensaios de sincronização.
“É uma imersão muito grande para nós também, ainda mais para a gente que está tocando esse filme clássico, que, por muitas vezes, já escutei a trilha. Sentimos ela na pele”, finaliza.
Exibição do filme ‘Psicose’ acompanhada da orquestra em Bauru
Reprodução/TV TEM
*Colaborou sob supervisão de Mariana Bonora
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