Autismo e os desafios diários da paternidade atípica

Autismo
Foto: Freepik

*Artigo escrito por Pollyana Paraguassú, presidente da Associação dos Amigos dos Autistas do Espírito Santo (Amaes)

A presença paterna costuma ser retratada em imagens de abraços calorosos, apoio constante e momentos de afeto. Mas, para muitas famílias atípicas – aquelas que convivem com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) – essa presença também carrega desafios, ausências e profundas reflexões sobre o significado real do cuidado e do compromisso.

Falo não apenas como presidente da Amaes desde 2016, mas como mãe atípica há 21 anos, vivendo a aventura diária de criar um filho autista.

É dessa vivência, aliada ao meu trabalho na associação, que tiro a força para defender a inclusão e apoiar outras famílias.

Desde 2001, a Amaes atua promovendo dignidade e inclusão para pessoas com autismo e seus familiares no Espírito Santo, beneficiando hoje mais de 2 mil pessoas e realizando, em média, 7.500 atendimentos mensais.

E com a minha experiência, posso dizer que em lares atípicos, a figura paterna enfrenta grandes desafios.

A pesquisa da Fiocruz, realizada em 2019, nos revela que cerca de 1 em cada 3 pais se afasta ou abandona o núcleo familiar nos dois primeiros anos após o diagnóstico de autismo do filho.

É um número que machuca, mas que também ressalta o valor inestimável dos pais que permanecem e assumem o papel de protagonistas na vida dos seus filhos.

Entre os que ficam, há homens que não se limitam a “estar por perto”: eles participam das terapias, reorganizam a rotina, vibram com pequenas grandes conquistas e se tornam verdadeiros defensores da inclusão.

Eles se reinventam. É isso que vejo todos os dias na Amaes, acompanhando de perto algumas famílias com pais, avôs e tios que estão presentes, ativamente envolvidos na rotina dos filhos com TEA, mostrando que o cuidado e o amor são tarefas compartilhadas.

O diagnóstico de TEA costuma ser um divisor de águas. É comum que o primeiro impacto venha acompanhado de medo e insegurança: “Será que ele vai sofrer? Será que vai ser feliz?”.

Mas é nesse instante que se abre a oportunidade para uma escolha: recuar ou avançar. Avançar significa buscar informação, entender que o laudo não muda quem aquele ser humano é, e sim ajuda a compreendê-lo melhor.

Segundo o Censo 2022 do IBGE, 2,4 milhões de brasileiros declararam ter diagnóstico de autismo, 1,2% da população. Esse dado reforça que estamos falando de uma realidade presente em milhões de lares. E nesses lares, o pai tem um papel insubstituível.

Olhemos com gratidão e respeito os homens que enfrentam o desconhecido de mãos dadas com seus filhos. Pais que aprendem a celebrar vitórias que muitos não percebem, que se emocionam com um olhar, um gesto ou uma palavra que demorou para ser dita.

A maternidade e a paternidade atípica não é fácil. Ela exige coragem, paciência e a capacidade de ressignificar sonhos. Mas, para aqueles que a abraçam, ela também oferece algo raro: a chance de viver um amor que transforma.

Foto: Pollyana Paraguassú, presidente da Associação dos Amigos dos Autistas do Espírito Santo (Amaes)
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