
O avanço da telessaúde tem transformado a forma como a população acessa serviços médicos no mundo todo. O modelo, que se consolidou durante a pandemia de covid-19, hoje abrange desde terapias psicológicas até consultas em especialidades como neurologia e cardiologia, e já é visto como parte do futuro da saúde.
A possibilidade de atendimento à distância reduz deslocamentos, otimiza o tempo de pacientes e profissionais e, em alguns casos, contribui para a diminuição de filas no sistema de saúde.
Pelas vantagens oferecidas, calcula-se que, até julho deste ano, 20 mil pessoas já tenham sido atendidas nesta modalidade, no Espírito Santo.
De acordo com o professor de Medicina da Faesa, Marcelo Dalla, a telessaúde deve ser entendida como um conceito amplo, que vai além da telemedicina. Cada área da saúde adota o recurso de acordo com suas regras éticas e normativas próprias.

Na medicina, por exemplo, a primeira consulta ainda precisa ser presencial, enquanto outras profissões, como a psicologia e a nutrição, já podem iniciar o acompanhamento remotamente.
“As profissões têm códigos de ética diferentes. A maneira que o psicólogo, o médico, o nutricionista fazem atendimentos, têm diferença, mas a distância é a mesma coisa, por isso, que a gente vai ver termos como telemedicina, telepsicologia, telenutrição, de acordo com a profissão que tem regras próprias”.
O professor destaca que o atendimento virtual vem se mostrando uma estratégia eficaz para acelerar o acesso a especialistas. Em determinadas áreas, é possível reduzir ou até eliminar filas em poucos meses, porque os profissionais conseguem adiantar encaminhamentos e resolver demandas mais rapidamente.
Há especialidades em que, em 60 dias, é possível eliminar a fila. Por quê? Você vai conectando com as pessoas, vendo o caso, o profissional vai adiantando o atendimento e vai resolvendo o problema.”
Marcelo Dalla, professor de Medicina
Outro impacto observado está nas situações de urgência e emergência. Em alguns casos, o uso da telessaúde contribui para reduzir tanto a mortalidade quanto as sequelas em atendimentos críticos.
Dalla explica que, nesses casos, a rapidez é determinante para o desfecho. “No caso de urgência, quanto mais rápido você fizer o atendimento, melhor. Então, com o atendimento à distância, ganhamos tempo. Cada minuto que a gente ganha em urgência e emergência, decide se a pessoa morre ou não”.
Além da rapidez no atendimento, estudos recentes têm apontado a conectividade como um fator essencial para a saúde pública. Para o professor, o acesso à internet já pode ser considerado um determinante social de saúde, com impacto comparável a outros fatores básicos.
“Conectividade é tão importante quanto saneamento, transporte e alimentação. Ter acesso à telessaúde e à telemedicina melhora a saúde da população e reduz a mortalidade”, afirmou.
Conexão e telessaúde no ES
Entendendo a conexão como parte fundamental para garantir o bem-estar e a saúde das pessoas, vale pontuar que, no Espírito Santo, segundo dados da PNAD contínua 2024, divulgados pelo IBGE e pelo Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), 93,3% dos domicílios têm acesso à internet. Isso coloca o Estado na 14ª posição nacional em termos de acesso domiciliar à rede.
Sendo assim, o serviço de teleconsultas, ofertado atualmente em todos os 78 municípios capixabas, conforme o governo estadual, se mostra acessível e possível de ser incluído no dia a dia da população.
Hoje, a telemedicina, no Estado capixaba, funciona como uma das estratégias do Sistema Único de Saúde (SUS) para ampliar o acesso à saúde especializada, especialmente em regiões afastadas dos grandes centros e estruturas.
O serviço inclui até 19 especialidades, incluindo cardiologia, dermatologia, neurologia, gastroenterologia, psiquiatria, reumatologia, otorrinolaringologia, urologia, hematologia, nefrologia e neuropediatria, e são três modalidades de atendimento:
Aceitação e futuro da telessaúde
Além de disponibilizar especialidades que, muitas vezes, têm filas demoradas no sistema presencial, há outras características da telessaúde que agradam aos pacientes, inclusive aqueles que moram perto de unidades de saúde.
Devido à dificuldade de mobilidade, pesquisas de satisfação mostram que o atendimento remoto tem boa aceitação, tanto no interior capixaba quanto na Grande Vitória, principalmente entre os idosos.
Nas cidades com ampla estrutura de saúde, o professor da Faesa explica que esse resultado se dá, principalmente, porque, para pessoas com dificuldade de locomoção, mesmo morando perto de unidades de saúde, o deslocamento é um empecilho.

Já a aluna do terceiro período de Medicina da Faesa, Analu Fritz Viana, que é do interior capixaba, conta que, muitas vezes, os pacientes enfrentam horas de viagem com a saúde debilitada para conseguir atendimento:
Eu já tive a experiência de acompanhar as pessoas que vinham com a saúde bem debilitada, que precisam fazer todo esse trajeto para uma consulta… É bem doloroso. Então, acredito que a telemedicina veio justamente para isso, pelo menos, para diminuir esse desgaste.”
Analu Fritz Viana, aluna de Medicina
O teleatendimento, então, resolve questões de deslocamento, ao mesmo tempo em que é capaz de aproximar pacientes e profissionais, segundo Dalla:
“Às vezes, os médicos ficam voltados ao computador para preencher informações administrativas e ficam de costas para a pessoa. E com a câmera não tem jeito: é o olho no olho, aquela proximidade que a gente fala. Então, ao invés de afastar, de ter preconceitos ou dúvidas, o sistema de informação aproxima”.
Experiência do paciente
A paciente Taise Nanuque, que começou a utilizar o sistema de telessaúde durante a pandemia, em sessões de terapia, concorda. Tanto é que ela incorporou o recurso à rotina e afirma que, em muitos casos, a atenção recebida foi maior do que em consultas presenciais.
Segundo Taise, os médicos dedicaram mais tempo para ouvir sua história e a de seu filho no sistema remoto, o que resultou em atendimentos mais detalhados e humanizados:
“Na minha experiência, a consulta online foi muito melhor do que a presencial. Meu filho já foi avaliado, por vídeo mesmo, por questões de saúde, e o médico teve tempo de conversar, de procurar saber o histórico, de querer entender”.

Para a paciente, no entanto, a principal vantagem da telemedicina está na economia de tempo e na praticidade. Por isso, hoje ela recorre tanto a atendimentos gerais quanto a especialistas de diferentes áreas.
Eu não posso ficar saindo sempre por causa do meu trabalho. Então, ajuda muito nessa questão do tempo: não pegar trânsito para ir, para voltar, não enfrentar atrasos na sala de espera. No online, é só entrar e aguardar ser chamada.“
Taise Nanuque, paciente
Outro ponto de destaque é a possibilidade, em algumas plataformas, de escolher os profissionais e conseguir verificar informações sobre sua formação e especialidade antes do atendimento. Para Taise, esse recurso amplia a confiança no serviço e reforça a sensação de proximidade com o médico.
Desafios na prática e na formação
Embora apresente resultados positivos, a telessaúde ainda traz desafios. Um deles diz respeito à comunicação em situações sensíveis. Durante a pandemia, por exemplo, houve casos em que familiares tiveram de se despedir de pacientes internados em UTIs por meio de telas.
Para o professor Dalla, ainda que a distância possa parecer impessoal, a tecnologia ofereceu uma alternativa em momentos difíceis. “Foi uma ferramenta dolorosa, mas necessária para garantir proximidade quando o contato presencial não era possível”, disse.
Outro obstáculo está relacionado ao exame físico. Ainda que nem todas as práticas possam ser realizadas virtualmente, a evolução dos equipamentos já permite avanços significativos.
“As câmeras atuais conseguem oferecer imagens da garganta, por exemplo, mais nítidas do que o olho humano. Isso mostra que algumas áreas do exame físico já são mais resolutivas à distância do que no presencial”, explicou.
Para o professor e demais especialistas, então, não há dúvida de que a telessaúde permanecerá como parte da rotina do setor, integrando também a inteligência artificial que pode ampliar ainda mais as possibilidades, agregando qualidade aos diagnósticos e oferecendo mais opções de atendimento.