
O Espírito Santo é o maior produtor e exportador do Brasil de rochas naturais. Para se ter ideia, no ano passado, as exportações aqui pelo Estado passaram de R$ 6 bilhões. Nesse sentido, foi um aumento de mais ou menos 12,7% em relação ao ano anterior. Os Estados Unidos são o principal destino dessas rochas. Nesse sentido, vendemos para eles quase R$ 4 bilhões.
O ano passado teve uma alta de 16% nesse comércio com os americanos. O que poderia ser um trunfo passou a ser desafio. Isso quando o presidente americano, Donald Trump, anunciou um acréscimo de tarifas de 50% aos produtos brasileiros. Nesse sentido, a medida passa a valer no dia 1º de agosto.
Se a medida for, de fato, adotada, o impacto ao setor vai ser ou pode ser devastador. Ou seja, pode inviabilizar a exportação de rochas capixabas. Essa é a avaliação do vice-presidente da Associação Brasileira de Rochas Naturais, o Centrorochas, Fábio Cruz.
Veja abaixo a entrevista com Fábio Cruz
Qual é o impacto real do tarifaço dos EUA para o setor de rochas?
É enorme, na verdade. Os Estados Unidos são o principal destino das nossas exportações. E pior: são o maior destino dos produtos semiacabados, que têm mais valor agregado, como as chapas. Os blocos, por exemplo, são exportados para a Itália e para a China.
É um problema muito grave. É um desafio enorme. Ainda não sabemos exatamente como as coisas vão ficar.
O que os empresários capixabas podem fazer em relação a essas medidas?
Estamos atuando em duas frentes. Internamente, o Centrorochas participa de comitês junto aos governos federal e estadual. Ou seja, o governo tem escutado o pleito dos produtores de rochas.
No âmbito internacional, estamos dialogando com o Natural Stone Institute (NSI), que representa as empresas importadoras nos EUA, e com a National Association of Home Builders (NAHB). Do mesmo modo, protocolamos uma carta ao governo americano explicando os impactos desse aumento para o setor de construção residencial.
Não parece incipiente esse movimento? Agosto está chegando e houve pouco avanço até agora…
Esse também é o nosso sentimento. Nesse sentido, estamos pleiteando uma extensão de prazo de 90 dias para abrir uma mesa de negociação. A sua percepção está correta: nada efetivo foi feito até agora.
E os empresários americanos? Como está sendo a interação com eles?
Existe uma preocupação grande entre os importadores americanos. Ou seja, muitos trabalham com o produto brasileiro como carro-chefe. Eles estão colaborando na construção de uma voz única para apresentar o pleito da extensão de prazo.
Dos 85% de pedra natural consumida nos EUA que são importados, o Brasil representa de 23% a 24%. Temos um papel estratégico na cadeia de construção residencial deles.
Qual é o impacto disso para o ES?
Temos cerca de 120 mil empregos diretos e indiretos no Estado. Exportamos aproximadamente meio bilhão de dólares por ano só para os EUA. O Brasil todo exporta cerca de 1,3 bilhão.
Ou seja, se conseguirmos uma tarifa equivalente às praticadas para Itália, Índia e China, continuaremos competitivos. Porém, se a tarifa se mantiver em 50%, não sabemos o que pode acontecer.
Existe o risco de vender para a China e ela revender aos EUA?
Sim, mas o presidente americano já avisou que, se isso acontecer e for detectado, haverá uma sobretarifa de mais 50%. Isso é considerado transhipment. Do mesmo modo, esse tipo de triangulação já ocorreu em outros setores, como o de café.
Qual era a projeção para 2025 antes do tarifaço?
Esperávamos um ano recorde para o setor de rochas. Até junho, tínhamos quase 20% de crescimento no faturamento comparado a 2024.
O problema é que, mesmo antes da tarifa entrar em vigor, pedidos já foram suspensos. O impacto no setor de rochas já começou.
Qual a estimativa de perdas?
Em julho, estimamos deixar de exportar 50 milhões de dólares. É uma perda significativa.
Como o Centrorochas vê os cenários prováveis a partir de agosto?
Estamos fazendo tudo que é possível para negociar com os EUA. Também participamos do comitê estadual recém-criado. Além disso, temos convênio com a ApexBrasil para internacionalização e abertura de novos mercados. O Oriente Médio é uma das apostas.
Quais os planos para reduzir a dependência do mercado americano?
Temos um mapeamento de mercados-alvo: Oriente Médio (Emirados Árabes, Qatar, Omã, Arábia Saudita), América Latina, México e o mercado interno. Claro que isso exige adaptação, mas vemos com bons olhos a diversificação.
O ambiente de negócios do ES ajuda nesse contexto?
Sim. O Estado tem avançado muito no comércio exterior. Temos desafios logísticos, mas o governo estadual é muito acessível e colabora com o setor empresarial. Isso não ocorre em todos os estados.
Como vender melhor o ES para fora?
Precisamos assumir com orgulho o que temos. O Estado é encantador. Falta marketing, vender a experiência capixaba como fazem outros países, como a Itália. Temos potencial.
A perda da Vitória Stone FAir para São Paulo foi um baque?
Sem dúvida. A malha aérea e a infraestrutura ainda são entraves para o Estado. Esperamos que, com centros de eventos em construção aqui no Espírito Santo, possamos futuramente trazer a feira de volta para Vitória. Para se ter ideia, em 2026, a edição da feira de rochas em São Paulo vai dobrar de tamanho.
A infraestrutura portuária ainda é um gargalo?
Sim. Temos só um terminal de contêineres (TVV). A logística é complexa, com navios de cabotagem pequenos e escassez de contêineres. O frete é alto e o tempo de trânsito é longo. O porto da Imetame é uma esperança para o futuro próximo.
A produção de rochas pode ser mais manufaturada?
Sim, mas não é simples. Mesmo na Itália, poucos avançaram nisso. O Brasil agregou valor migrando para quartzitos, com maior valor por tonelada. Temos produtos mais valiosos.
Qual o futuro do setor de rochas naturais?
Vejo com muito otimismo. Apesar do desafio atual, o setor de rochas tem potencial gigantesco.
Com alinhamento institucional e diversificação, podemos crescer muito. Hoje temos mais alinhamento entre entidades, setor produtivo, imprensa e governos. Isso é fundamental para superar os desafios.