Além do número previsto de 1,6 milhão de pessoas na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), o show gratuito da cantora Lady Gaga deve trazer ainda um forte significado político à noite deste sábado (3). Ativista pela liberdade de gênero, a cantora, que movimentou caravanas de diferentes estados à capital carioca, é conhecida por trazer discursos anticonservadores às apresentações.
“A Lady Gaga é extremamente importante para a cultura pop e para a música em si. E ela tem essa coisa da teatralidade, da dramaticidade e de usar isso para realmente fazer pensar, questionar, provocar, mas também para criar um universo para o qual ela transporta as pessoas que consomem o trabalho dela”, antecipa o pesquisador Leonardo Rodrigues, mestre em história da arte e especialista em cultura pop. Para Rodrigues, o show representa uma “catarse coletiva” para os fãs.
O pesquisador destaca, ainda, que o trabalho da artista não pode ser dissociado do discurso político. “Ela é uma figura que fala muito sobre as questões LGBTQIAPN+. Inclusive no Grammy, quando ela recebeu o prêmio, ela fez questão de fazer um discurso destacando a importância das pessoas trans em resposta às medidas do governo do Donald Trump de revogar direitos”, explica, em referência à fala da cantora em fevereiro deste ano. Na ocasião, Gaga dedicou um dos mais importantes prêmios da música à comunidade transexual.
O professor Thiago Soares, pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coordenador do Grupo de Pesquisa em Comunicação, Música e Cultura Pop (Grupop), observa também que o “encantamento” que a diva exerce sobre a comunidade de fãs tem uma raiz geracional. “Essa relação das pessoas LGBT com o que entendemos hoje como ‘divas pop’, mesmo antes, com as divas da ópera, sempre existiu. Pessoas gays, transexuais, travestis, têm uma relação histórica com essa figura, esse elemento da mulher forte. O que a Lady Gaga tem de diferente, então? Possivelmente que ela está incluída na geração millennial, cujas agendas ativistas são muito mais explícitas”, explica.

“Desde as primeiras aparições como artista, em 2008, ela que é uma mulher branca, cis, até então em relacionamentos heterossexuais, passa a encampar essa agenda de identidade de gênero, de ativismo de gênero, de ativismo trans”, diz. Outro traço artístico que, segundo o pesquisador, ajuda a explicar o elo entre os fãs e a ídola, é o fato de que Lady Gaga se apresente como “um ídolo frágil”: “Ela se vulnerabiliza. Ela se expõe como, entre aspas, monstruosa. Isso gera também uma empatia, mobiliza um afeto que é também parte dessa geração”, afirma Soares.
‘Mobilização dos fãs é um tipo de ativismo’
Para a técnica de tecnologia da informação Laura Caetano, que aguarda o show no Rio de Janeiro, a celebração de pessoas LGBTQIAPN+ na capital carioca, neste contexto, é por si um ato político. “É injusto reduzir o que está acontecendo aqui no Rio a uma simples movimentação de entretenimento. É diversão, sim, é pela arte, sim. Mas por que isso seria menos ativismo?”, questiona. “Só quem viveu uma vida se escondendo sabe a importância de se exibir.” Bissexual e militante, Caetano mora no Recife (PE) e diz que viajou para o show, mas também para “viver a atmosfera da cidade”.
Para o evento, que recebeu o apelido de “Gagacabana”, é esperada uma movimentação de R$ 600 milhões na economia carioca e cerca de 240 mil turistas, o que atrai também visibilidade às causas defendidas pela popstar. “Essa oportunidade de ver um show da Lady Gaga no Brasil, depois de tanto tempo, e de graça em Copacabana, realmente vai ser algo histórico”, diz Leonardo Rodrigues. A última apresentação da artista no Brasil ocorreu em 2012, há 13 anos.