Após mais de uma década de contratos ilegais de arrendamento em terras indígenas no Paraná, um acordo firmado na última terça-feira (29) marcou o início da transição para um novo modelo de produção agrícola sustentável na Terra Indígena (TI) Ivaí, localizada em Manoel Ribas (PR).
O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi assinado entre o Ministério Público Federal (MPF), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), a Associação Comunitária Indígena Laranjal (Acil) e a comunidade indígena Ivaí. A assinatura ocorreu após consulta prévia, livre e informada à comunidade, com a presença da presidente da Funai, Joênia Wapichana, e de lideranças Kaingang.
O objetivo central do TAC é substituir os contratos de arrendamento, prática considerada ilegal, por um modelo de produção gerido diretamente pela comunidade indígena. A mudança busca garantir a autonomia territorial, alimentar e econômica da TI Ivaí, onde práticas irregulares de arrendamento ocorrem desde meados dos anos 2000.
A Constituição Federal garante o usufruto exclusivo das terras pelos povos indígenas e proíbe qualquer tipo de ocupação, posse ou exploração por terceiros, tornando nulos tais contratos. O Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/1964) também veda arrendamentos em áreas públicas, como terras indígenas.
Segundo o MPF, o arrendamento na TI Ivaí não gerava benefícios à comunidade e, ao contrário, comprometia sua estrutura social e colocava em risco a posse direta dos Kaingang. O TAC reconhece a nulidade desses contratos e exige seu cancelamento imediato.
Para viabilizar a produção autônoma, o acordo prevê a implementação do Plano de Aplicação do Projeto Comunidade Indígena Ivaí-Grónum, financiado com recursos da Renda do Patrimônio Indígena. O plano detalha ações para o ano de 2025, como o cultivo de 300 hectares com milho, feijão preto, feijão carioca e mandioca, além da correção do solo com calcário.
Também estão previstas a compra de implementos agrícolas — como plantadeira, adubadeira, debulhador e trator — e de dois veículos tipo pick-up para apoio às atividades. Haverá ainda intercâmbio com o povo Terena para troca de conhecimentos sobre o cultivo da mandioca e contratação de engenheiro agrônomo para assistência técnica.
O TAC estabelece uma série de condicionantes à Acil e à comunidade, como a proibição do uso de transgênicos e do desmatamento para abrir novas áreas de cultivo. O uso de defensivos agrícolas deverá seguir normas de segurança, com descarte adequado de embalagens e distância mínima de 250 metros entre áreas pulverizadas e moradias.
A associação também deverá apresentar um sistema de repartição justa dos resultados das lavouras, aprovado em assembleia. Benfeitorias construídas irregularmente por não indígenas dentro do território serão incorporadas ao patrimônio da União, com usufruto da comunidade.
O acordo terá vigência de três anos, com possibilidade de prorrogação. A execução será acompanhada e monitorada pelo MPF e pela Funai.