Greve nacional na Colômbia pede aprovação de consulta popular e testa apoio a Petro nas ruas

Colombianos saíram às ruas nesta quarta-feira (28) em paralisação nacional que vai durar dois dias. Os manifestantes pedem a realização de consulta popular para que a população escolha se quer reformas trabalhistas e na saúde. 

O protesto foi convocado pelo próprio governo e contou com a adesão da Central Unitária de Trabalhadores (CUT) e de outros sindicatos, organizações políticas e movimentos populares. A ideia é pressionar o Senado para aprovar a proposta do presidente Gustavo Petro de realizar uma consulta popular. 

Milhares de colombianos foram às ruas e bloquearam estações de transporte público. Até o momento, as manifestações afetaram ao menos 850 mil habitantes da capital, segundo a empresa responsável pelos ônibus de Bogotá, Transmilenio. Cidades como Medellín, Cali e Bucaramanga também aderiram ao movimento desta quarta e quinta-feira. 

Até a publicação desta reportagem, não haviam sido registrados confrontos entre policiais e manifestantes. O governo, no entanto, se preocupa com a possibilidade de infiltrados que causem violência. Durante a convocação, Petro pediu que as manifestações fossem pacíficas, mas o ministro da Defesa, Pedro Sánchez, alertou que as forças de segurança vão garantir o livre direito de se manifestar, mas que “existem ameaças que podem alterar a ordem pública, o que constitui uma violação da lei”. 

Ao todo, cerca de 36 mil policiais foram destacados para acompanhar as manifestações em todo o país. Os manifestantes também bloquearam algumas avenidas de maior fluxo nas cidades que participam das marchas.

O professor de Relações Internacionais da Universidade de Antioquia Javier Sanchez entende que essas mobilizações serão um termômetro para medir o atual apoio popular do governo. Ele diz que, até agora, os atos conseguiram retomar parcialmente esses projetos de lei que fracassaram, mas que o êxito definitivo vai depender do tamanho das mobilizações de quarta e quinta-feiras. 

Sanchez acredita que a oposição no congresso se preocupa tanto com essa mobilização como com a consulta popular pelo potencial de se tornarem canais para a esquerda colombiana.

Reformas de Petro

O presidente havia proposto a consulta com 12 perguntas, mas o projeto foi derrubado pelo Senado. Em resposta, Petro apresentou outro projeto com 16 perguntas e convocou uma mobilização dos colombianos para pedir apoio à realização da pesquisa. O objetivo é ouvir a população sobre as reformas trabalhista, da saúde e da aposentadoria. 

Todas essas reformas faziam parte do programa de governo de Petro durante a campanha eleitoral que deu a vitória ao colombiano. Esse ponto é fundamental para o professor Javier Sanchez. Para ele, a população votou em Petro tendo essas reformas como pauta e é direito do presidente cobrar que o seu projeto, que foi escolhido pela população, seja impulsionado.

“As diferentes reformas sociais são parte das propostas que Petro apresentou na campanha eleitoral quando se tornou presidente. E o povo votou por esse programa, ou seja, votou por propostas de mudança, especialmente aquelas que recuperam direitos para os trabalhadores e aposentados que foram retirados por diferentes reformas de recorte neoliberal. É direito de Petro querer que essas reformas sejam aprovadas”, disse ele ao Brasil de Fato.

Sanchez fala principalmente de duas reformas. A trabalhista de 1990, chamada de lei 50, flexibilizou os contratos trabalhistas a favor dos patrões. Foram permitidos contratos com períodos determinados, ampliação da jornada de trabalho por meio de acordo e criou a possibilidade da terceirização de serviços. A outra é a lei 100 de 1993, que privatizou o sistema de saúde e de pensões na Colômbia. 

As reformas propostas por Petro foram apresentadas há dois anos e visam mudanças estruturais. A trabalhista tem como ponto principal o aumento da estabilidade para os trabalhadores, dando prioridade a contratos permanentes, na contramão do que muitos países vêm fazendo nos últimos anos, inclusive o Brasil, que aprovou uma maior flexibilização nos contratos de trabalho.

Na Saúde reduziria a participação privada na gestão de hospitais e postos de saúde. Para Petro, isso reduziria a corrupção no setor, melhoraria o atendimento aos bairros e cidades sem unidades de referência e ampliaria o atendimento primário. A única reforma aprovada foi a da aposentadoria. Ela passará a valer em 1º de junho, mas ainda é analisada pela Corte Constitucional. O texto muda a forma de contribuição dos trabalhadores dentro do sistema da previdência.

Para transferir essa discussão do Senado para a população, a ideia do governo era realizar uma consulta popular para ouvir em 16 perguntas a opinião da população sobre essas reformas. Se aprovada na consulta, o Executivo e o Legislativo são obrigados a transformá-las em lei, decreto ou resolução. É papel do governo também ampliar os debates das leis aprovadas para adequá-las à Constituição.

Para Sanchez, a meta do Senado ao reprovar as propostas é evitar que Petro acumule força política para as eleições presidenciais de 2026. Mesmo que não seja candidato, o analista avalia que o grupo Pacto Histórico ganhe força para o pleito se as reformas forem aprovadas.

Petro já disse que, mesmo que o Senado não aprove a segunda proposta de consulta, o Executivo determinará a realização dessa votação por meio de decreto. Isso, no entanto, criaria um problema jurídico, já que as consultas não podem ser realizadas sem a aprovação do Legislativo. 

No mesmo dia em que rejeitou a consulta popular, o plenário do Senado decidiu retomar a discussão da reforma trabalhista, que passará por uma comissão pela terceira vez para ser analisada. Para setores do Pacto Histórico, no entanto, essa pode ser uma forma de a oposição promover uma reforma “totalmente desidratada” e sem os pontos pedidos por Petro e pelos movimentos populares. 

Para Javier Sanchez, as mobilizações de rua também têm esse papel de pressionar o Senado para que as reformas contemplem todos os pontos fundamentais demandados pela população. 

“Há consonância e identidade nos propósitos do Petro com os trabalhadores colombianos. A greve nacional tem vários objetivos: pressionar o Congresso que não avaliou que, diante dessas derrotas do governo, Petro sairia com uma proposta mais audaciosa de consultar o povo. Isso dá ao governo uma pedagogia sobre a consulta e tem efeitos eleitorais, porque antecipa o processo de 2026. A oposição também comete o erro porque dá a Petro a possibilidade de ele fazer uma agitação política para as eleições que daria chance para os progressistas na Colômbia”, concluiu.

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