Mais de 6,3 mil crianças e adolescentes foram resgatadas de situações de trabalho infantil no Brasil entre 2023 e abril de 2025, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A maioria dos casos, 86%, envolvia as piores formas de exploração, com risco à saúde, acidentes e até mortes. Procuradora do MTE e ex-coordenadora nacional de combate ao trabalho infantil, Elisiane Santos relaciona a permanência dessa violação de direitos à precarização do trabalho para os adultos.
“Se nós temos crianças e adolescentes trabalhando, é porque nós temos também uma condição muito precarizada do trabalho adulto”, afirma Santos, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato. “A maioria das famílias onde existe trabalho infantil vive situações em que crianças e adolescentes terminam ingressando nesse trabalho para ajudar na renda”, explica.
Em 2015, o Brasil assumiu o compromisso de eliminar o trabalho infantil até 2025, alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Para a procuradora, o resultado está longe de ser alcançado. “Nós já tínhamos uma meta anterior que não foi atingida. Infelizmente, não será atingida mais uma vez”, avalia.
Desmonte de políticas afastou Brasil de meta da ONU
Elisiane Santos indica que, apesar dos avanços desde os anos 1990, quando 9,6 milhões de crianças eram exploradas, houve uma estagnação no combate ao trabalho infantil durante o governo anterior, do ex-presidente Jair Bolsonaro (PT), resultado da descontinuidade de políticas públicas. Durante sua gestão, Bolsonaro insinuou que o trabalho infantil não prejudicaria crianças.
Segundo ela, a reversão dessa realidade exige uma série de medidas para o país enfim atingir o fim do trabalho infantil. Entre elas, Santos destaca geração de renda para famílias vulneráveis, políticas afirmativas como a Lei da Aprendizagem (que determina que todas as empresas no Brasil com mais de sete empregados contratem jovens aprendizes), ampliação da educação integral e ações de combate ao racismo e à desigualdade de gênero.
“[O trabalho infantil] é uma realidade muito perversa, que afeta principalmente crianças negras e em situação de vulnerabilidade social”, aponta a promotora. “A maior parte dessas crianças vem de famílias chefiadas por mulheres negras. E muitos casos acontecem nas cadeias produtivas, de forma invisível, onde grandes empresas se beneficiam do trabalho precarizado”, destaca.
De acordo com ela, o racismo culmina na naturalização da exploração. “Tem muitos casos óbvios, mas estamos tão acostumados que não vemos. Crianças trabalhando em barracas de praia, nos semáforos, ou ‘ajudando’ em casas, quando, na verdade são responsáveis por todo o trabalho doméstico. É trabalho infantil. E a nossa atuação é para proteger, não punir essas famílias”, diz.
Como denunciar?
A denúncia é importante para que o Ministério Público do Trabalho possa atuar. Casos de trabalho infantil podem ser informados pelo site www.mpt.mp.br ou pelo Disque 100, que encaminha a informação à rede de proteção da criança e do adolescente.
Para ouvir e assistir
O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira, uma às 9h e outra às 17h, na Rádio Brasil de Fato, 98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.
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