Aumento no número de deputados contraria discurso de austeridade do Congresso, avalia cientista político

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve evitar sancionar o projeto de lei que amplia de 513 para 531 o número de deputados federais a partir de 2027, aprovado pelo Congresso. A decisão, segundo o professor e cientista político Paulo Niccoli Ramirez, reforça o embate entre o governo e os parlamentares, mas é coerente diante das exigências por cortes no orçamento.

“Se o Congresso e o mercado financeiro pressionam tanto para que ocorram cortes no orçamento e tentar zerar esse déficit fiscal, Lula está mais do que certo. Ele tem todos os argumentos do mundo”, afirma Ramirez em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato. “Esse aumento de deputados é uma questão meramente quantitativa, vai aumentar a base do Centrão. Não há protagonismo real no Congresso, a não ser em pautas polêmicas e ‘bombas’”, acrescenta.

O cientista político também critica a rejeição pelo Congresso do projeto que aumentaria o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para os mais ricos. “Achou-se que o não aumento do IOF iria ofuscar o aumento da quantidade de deputados, votado no Senado. E a vela do bolo seria a manifestação de domingo, com milhares de pessoas nas ruas defendendo anistia ao Bolsonaro. Mas tudo deu errado. Foi uma das raras vezes que a esquerda usou muito bem as redes sociais para se manifestar contra o Congresso e contra essa direita”, avalia.

Segundo ele, a resposta popular mostrou que o Congresso atua em benefício da elite econômica. “O Congresso não propôs nenhuma contrapartida às ideias do governo. Apenas rejeita a sobretaxação dos ricos. É um Congresso que representa os interesses de uma classe economicamente dominante. Então o tiro sai pela culatra”, pontua.

Para Ramirez, o cenário atual se assemelha ao contexto do golpe sofrido pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016, retirada do cargo por não ceder às pressões do setor financeiro e defender políticas sociais. “O PT aprendeu muito com isso e Lula não se submeterá mais a essas chantagens do Congresso. Principalmente agora que falta um ano para a eleição e o seu índice de popularidade caiu, ele se deu conta de que é preciso partir para o debate, não para a violência, mas mostrar quem é quem dentro dos três Poderes”, analisa.

Mobilização popular

O professor destaca a importância da mobilização popular para pressionar o Congresso a aprovar medidas de justiça tributária. Ele cita o modelo colombiano, em que o presidente Gustavo Petro conseguiu aprovar reformas por meio da articulação direta com a população. Para ele, essa é uma das inspirações usadas por Lula na campanha do governo pela taxação dos super-ricos.

“É preciso discutir não só a taxação dos ricos, mas é crucial também a mudança da jornada de trabalho em escala 6×1. […] Temos tecnologias suficientes para prover mais tempo livre ao trabalhador. Os trabalhadores hoje estão sofrendo muito por conta de burnout, depressão… O trabalho flexível também prejudica muito. O cidadão comum precisa de dois, três trabalhos. É preciso pensar em uma melhor qualidade de vida para o trabalhador brasileiro porque isso vai trazer mais custos aos cofres públicos em termos de saúde pública”, alerta.

Para ele, a disputa entre governo e Congresso revela um conflito de classe escancarado. “A pessoa não precisa ser de esquerda, nem de direita. Qualquer pessoa que vai ao supermercado sabe quanto a carga tributária pesa. As sacolinhas cada vez mais caras, boletos chegando… e o Congresso não faz nada”, argumenta. A última pesquisa Genial/Quaest mostrou que 70% dos parlamentares são contrários à redução da jornada de trabalho de quem tem apenas um dia livre na semana.

Para ouvir e assistir

O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira, uma às 9h e outra às 17h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.

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