A zona de conforto é, para muitos, o destino natural da carreira. Seguir o caminho traçado, repetir fórmulas conhecidas e buscar aprovação constante parece garantir uma tranquilidade conveniente. Mas a verdade é que os grandes movimentos de transformação nunca nasceram da prudência. Eles sempre foram fruto de quem ousou caminhar no limite, no fio da navalha, onde o risco e o desconforto são presenças constantes.
É nesse território instável que se revelam as lideranças genuínas, não aquelas moldadas por discursos suaves e motivação instantânea, mas as forjadas na fricção, na recusa em aceitar o medíocre como suficiente. Liderar não é administrar consensos, e sim desafiar zonas de acomodação. Nesse processo, o preço muitas vezes é o isolamento, a crítica, a incompreensão.
Em ambientes corporativos habituados à proteção das chamadas “placentas organizacionais” — essas zonas de falsa segurança — qualquer tentativa de ruptura soa como ameaça. A reação imediata é a defesa, o ataque ou a desqualificação de quem propõe o incômodo. Pensar diferente exige sair da redoma, reconhecer que há caminhos ainda não explorados e verdades ainda não ditas. E isso demanda uma coragem que nem todos estão dispostos a sustentar.
O mercado, no entanto, segue repleto de sinais de que a covardia tem seu custo. Dados da Gallup mostram que 85% dos profissionais no mundo não se sentem engajados em seus trabalhos. Não por falta de competência, mas por falta de propósito, de espaço para criar, de líderes que desafiem e estimulem. É sintomático que ambientes excessivamente confortáveis terminem produzindo profissionais desmotivados, acomodados e, em última instância, improdutivos.
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Há uma diferença brutal entre motivação e atitude. A primeira é passageira, muitas vezes alimentada por jargões ou recompensas superficiais. A segunda exige convicção, disposição para o enfrentamento e resiliência diante da dor que as rupturas carregam. A atitude transforma, porque nasce da crença profunda de que vale a pena enfrentar o desconforto em nome de algo maior. E, não raro, essa transformação só ocorre quando se está disposto a sangrar, a suportar o julgamento e a crítica.
Caminhar no fio da navalha não é devaneio. É uma escolha consciente de quem entende que só há evolução real quando se desafia o óbvio. Não há espaço para o conformismo em quem enxerga além do imediato. Quem suporta a dor da verdade conquista o poder da transformação. Quem aceita o corte descobre, enfim, a própria forma.
E talvez o que falte hoje não sejam líderes corajosos, mas contextos que suportem essa coragem. O mundo corporativo ainda prefere o previsível, mesmo que isso custe o engajamento, a inovação e o próprio futuro. No fundo, continua sendo mais seguro afastar os que desafiam a lógica confortável, mesmo que sejam justamente esses os que poderiam construir algo verdadeiramente grandioso. Às vezes, é preciso se cortar para, finalmente, encontrar quem se é.
Evandro Lopes, CEO da SLComm.4
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