Em um Brasil onde mulheres negras seguem sendo alicerces invisibilizados da sociedade, o Festival Latinidades chega à sua 18ª edição como um dos mais potentes movimentos culturais e políticos do país. Reconhecido como o maior festival de mulheres negras da América Latina e Caribe, o evento reafirma seu papel de plataforma de criação, denúncia e celebração. Com o tema “Mulheres Negras Movem o Mundo”, a edição de 2025 acontece entre os dias 23 e 31 de julho e homenageia a intelectual e ativista Lélia Gonzalez. A programação multilinguagens, gratuita será espalhada por diferentes pontos do Distrito Federal.
Mais do que um evento cultural, o Festival Latinidades se consolidou, ao longo de quase duas décadas, como uma afirmação política e poética. A escolha de homenagear Lélia Gonzalez, uma das principais referências do pensamento feminista afro-latino-americano, vem do compromisso do evento com a memória e os saberes produzidos por mulheres negras.
“Não se trata apenas de um festival. Latinidades é um projeto político que denuncia o apagamento das mulheres negras e, ao mesmo tempo, celebra sua centralidade na construção deste país”, afirma Jaqueline Fernandes, idealizadora e diretora-geral do festival.
Ao completar 18 anos, o evento atinge sua maioridade em um país que ainda falha em garantir o básico à maioria de sua população. “Chegar até aqui é, por si só, um ato de enfrentamento. Não é simples manter um projeto negro, liderado por mulheres negras, em uma sociedade que insiste em nos empurrar para as margens”, afirma Fernandes.
“O Latinidades cresce à revelia de um sistema que nos nega e, por isso mesmo, é tão necessário. Porque onde o Estado se omite, nós criamos. Onde o racismo nos silencia, nós respondemos com arte, com pensamento e com ação coletiva.”, destaca a idealizadora do Festival.
Em 2025, o festival escolhe as artes visuais como linguagem central da programação, mas, para Fernandes, o que importa mesmo é o que está por trás da curadoria: “Nosso foco é deslocar os centros de poder. É romper com o pacto narcísico da branquitude que ainda domina os espaços de cultura. É dizer: estamos aqui, pensamos, criamos, lideramos e o mundo se move porque nós o movemos.”
Afrolatinas
Criado em 2008 pelo Instituto Afrolatinas, que é uma organização sem fins lucrativos que atua com arte, cultura e educação para promover a equidade de gênero e raça, o Festival Latinidades nasceu de um incômodo: a ausência de representatividade das mulheres negras em espaços culturais e institucionais, mesmo sendo elas maioria no Distrito Federal. Segundo a PDAD 2021, mulheres negras representam 28,7% da população do DF, superando os demais grupos demográficos.
Fernandes explica que a criação do Latinidades surgiu “da urgência de reconhecer e celebrar o impacto das mulheres negras na sociedade”. Segundo ela, “18 anos não são 18 dias — e sobretudo quando a gente pensa em como ainda é desafiador articular projetos como esse em um país que continua invisibilizando as mulheres negras”.
Desde sua primeira edição, o festival se expandiu para outras cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Goiás, e tornou-se um espaço de encontro entre arte, ativismo, saberes ancestrais e novas gerações. Em 2025, o carro-chefe da programação serão as artes visuais, com três grandes exposições. No entanto, as outras linguagens permanecem: música, cinema, literatura, debates, dança e formação.
“O nosso projeto acontece em torno do Dia da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha, porque essa data é uma reafirmação da nossa existência, da nossa cultura e da nossa contribuição para o Brasil, a América Latina e o mundo”, destaca Fernandes. Ela lembra que a origem da data remonta ao primeiro Encontro Internacional de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas, ocorrido na República Dominicana em 1992.
Programação
A programação do Latinidades 2025 é extensa, gratuita e descentralizada. As atividades ocorrerão em diferentes pontos de Brasília, priorizando a diversidade de linguagens artísticas, a inclusão produtiva e a acessibilidade cultural.
- 23 de julho: Abertura oficial com a exposição Alumbramento, no Sesc Taguatinga. A mostra, com curadoria de Nathália Grilo, reúne artistas visuais negros e indígenas das cinco regiões do Brasil.
- 23 e 24 de julho: No Teatro dos Bancários, o público poderá assistir à peça Pequeno Manual Antirracista, baseada no livro de Djamila Ribeiro, com atuação de Luana Xavier e direção de Aldri Anunciação.
- 25 de julho: Em comemoração ao Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, será realizada a Batalha Afrolatinas – Mulheres Negras Movem o Mundo, reunindo MCs e rappers de todo o país em duelos de rimas com temáticas de identidade e resistência.
- 26 de julho: O Museu Nacional abriga dois momentos-chave: a Feira do Empreendedorismo Negro, voltada para capacitação e trocas entre futuras empresárias do DF, e os shows gratuitos no palco externo, com apresentações de Luedji Luna — que estreia a turnê do álbum Um mar para cada um — além de nomes como Karol Conká, Larissa Luz (em tributo a Gilberto Gil), IAMDDB (rapper portuguesa), Zezé Motta com Malía, Nessa Preppy (Trinidad e Tobago), Duquesa e Isa Marques, promessa musical de Brasília.
A idealizadora do Festival reforça que o Latinidades “é ao mesmo tempo um espaço de afeto e uma plataforma de impacto — e isso só é possível porque construímos com muita escuta, com muita ousadia e com o desejo coletivo de transformação”.
Além das apresentações, a programação conta com oficinas, rodas de conversa, lançamentos literários e iniciativas formativas que visam ampliar o acesso de mulheres negras a oportunidades criativas e econômicas. “O Latinidades é também um projeto de futuro: queremos mais mulheres negras liderando, criando, decidindo e ocupando os lugares que historicamente nos foram negados.”, conclui Fernandes.
A programação completa está disponível no site oficial: Latinidades 2025 | Mulheres negras movem o mundo. Os ingressos são gratuitos e podem ser reservados pela plataforma.
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O post Festival Latinidades celebra 18 anos e reafirma o protagonismo das mulheres negras no Brasil apareceu primeiro em Brasil de Fato.