O Brasil consolidou-se como o maior polo de inovação da América Latina. As startups locais atraíram investimentos de quase R$ 14 bilhões em 2024. Fintechs, healthtechs e empresas focadas em IA lideraram em faturamento e investimentos. Uma nova fronteira se abre e redefine o futuro da inovação: as deep techs.
O ecossistema brasileiro de startups é dominado por 82,7% de soluções B2B e B2B2C, que otimizam processos empresariais. Casos como iFood, com 110 milhões de pedidos mensais, Caju, que revolucionou a gestão de benefícios e reduziu em 75% o tempo gasto pelas empresas, e a Loggi, que aprimorou a logística para PMEs, exemplificam essa força. Contudo, 65,1% das startups brasileiras nunca receberam aporte financeiro, e a internacionalização ainda é limitada, com apenas 2,6% operando fora do país.
As deep techs são startups baseadas em avanços científicos e de engenharia, que buscam solucionar problemas complexos e sistêmicos, como saúde global, segurança alimentar e energia limpa. Globalmente, o setor quadruplicou entre 2016 e 2020 para mais de US$ 60 bilhões, com projeção de atingir até US$ 200 bilhões em 2025.
Embora a Europa enfrente desafios de financiamento, fundos focados em deep tech nos EUA e Europa têm demonstrado rentabilidade superior (17% vs. 10%) em comparação com fundos de tecnologia em geral. Em 2023, 25% das 16 saídas de startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão pertenciam ao setor de tecnologia avançada. O Brasil pode liderar esse setor e há alguns fatores que favorecem a ascensão:
- Políticas públicas e o Novo Marco: O Marco Legal das Startups simplifica processos e estimula investimentos em parcerias com Finep, BNDES, Sebrae e CNI. Além disso, a IA lidera em faturamento e aportes, e ESG se alinha com a missão das deep techs em sustentabilidade, saúde e energia limpa.
- Universidades como berços de Inovação: O Brasil é o 14º em volume de publicações científicas, com USP, UNICAMP e ITA como protagonistas, responsáveis por 95% da produção.
- Capital Paciente: O investimento em deep techs na América Latina cresceu 44 vezes entre 2020 e 2022, com startups brasileiras recebendo R$ 1,5 bilhão em 2024, alta de 20% sobre 2023.
- Talentos e a busca por parcerias: há espaço para profissionais de TI atuarem em modelos de negócio não tradicionais, transformando P&D em produtos tangíveis. Empresas como Petrobras, Grupo Fleury e Raízen já criaram programas de inovação aberta.
- Hubs de Inovação como catalisadores: O Brasil conta com hubs que conectam as deep techs ao mercado e a fundos de investimento, como Cubo Itaú em São Paulo, o Porto Digital em Recife e os novos hubs de fruticultura digital em Petrolina-Juazeiro.
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A integração entre ciência, mercado e governo, aliada a um novo ciclo de investimentos, cria oportunidades para que as deep techs deixem de ser nicho e se tornem motores do desenvolvimento econômico e social. O Brasil vê nas deep techs – startups baseadas em ciência, engenharia e pesquisa aplicada – o epicentro dessa transformação. Elas oferecem soluções disruptivas para desafios complexos em áreas como saúde, energia, agronegócio e indústria. O relatório “Global Risks 2025” do Fórum Econômico Mundial, destaca que 60% das ameaças críticas ao planeta exigirão avanços científicos profundos para serem resolvidas, algo que apenas empresas com DNA deep tech podem entregar.
Há potencial para que o país seja líder global, incluindo capital intelectual, biodiversidade, redes de pesquisa consolidadas e programas públicos. O Brasil mapeou 875 deep techs, liderando a América Latina, com uma forte concentração em biotecnologia (40% do total) e soluções para saúde humana e agronegócio (metade das deep techs). Elas enfrentam um “vale da morte” de P&D, com 70% falhando antes de sair do laboratório devido à falta de financiamento para escalar protótipos. Há uma assimetria de informações entre fundadores e investidores, além de obstáculos como a legislação e a burocracia que inibem o crescimento e escalonamento.
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A experiência europeia mostra a importância de políticas públicas estruturadas para pesquisa, financiamento e escalabilidade. Fundos de investimento focados em deep tech nos EUA e Europa têm obtido rentabilidade superior à dos fundos de tecnologia em geral (17% contra 10%), demonstrando o potencial de retorno para o capital de risco. Para posicionar o Brasil como protagonista global da inovação, são necessárias ações coordenadas e imediatas:
- Fortalecer a articulação entre universidades, setor privado e governo com iniciativas como o protocolo de Deep Techs da FINEP que conta com mais de 20 instituições e visa uma política pública nacional para o setor.
- Ampliar o financiamento, com mais recursos não reembolsáveis e modelos mistos que permitam às startups escalarem suas soluções.
- Conectar ciência e mercado, incentivando a formação empreendedora de cientistas e a transferência de tecnologia da academia para empresas.
- Formar talentos em áreas de ciência “dura” como física, química, biologia e matemática, essenciais para abastecer o ecossistema de deep techs.
- Simplificar o ambiente regulatório, reduzindo burocracia e acelerando processos, além de integrar regulações digitais como Drex, Pix e Open Finance.
O futuro da inovação será construído por quem conectar ciência, mercado e propósito. Com biodiversidade única, capacidade técnica e um ecossistema em evolução, o Brasil pode transformar conhecimento científico em soluções de impacto real e duradouro e ser referência global em deep techs.
Cauê Dias Silva, Head de Inovação da NTT DATA Brasil
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