O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) atualizou, na semana passada, a previsão da safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas, que deve totalizar 340,5 milhões de toneladas em 2025. A informação, que foi motivo de comemoração pelo governo, despertou críticas de setores do agronegócio, por uma suposta incapacidade de armazenamento da colheita. Segundo os representantes do setor, o país só teria capacidade para armazenar 40% da safra deste ano.
Mas a conta não é tão simples assim, segundo o presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto. “Não é uma conta simples, a gente não pode computar simples assim. Nós colhemos 305 milhões de toneladas e temos capacidade para 213 milhões. Não é essa conta”, refuta Pretto, agregando que parte da produção já é escoada ao mercado consumidor, não necessitando, portanto, de armazenamento a médio prazo.
“Nós precisamos continuar investindo, tanto poder público como setor privado, em novos armazéns. É o que a Conab está fazendo. A Conab está fazendo sua parte. Eu falei das 27 unidades armazenadoras que foram fechadas no governo passado. Estamos fazendo investimentos de recuperação dos 64 que temos. Fizemos uma parceria com a Itaipu Binacional. Agora fechamos um contrato com o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], que vai permutar nove imóveis que a Conab tem, com alto valor imobiliário, que estão desativados, porque foram constituídos há anos atrás, quando eram perímetros rurais daquela cidade, e agora a cidade cresceu e não é mais possível ser usada para armazenamento. E nosso investimento até aqui já chega a quase 40 milhões com recurso da Conab nos nossos armazéns”, explica Pretto.
O Produto Interno Bruto (PIB) do agronegócio atingiu R$ 2,72 trilhões em 2024, um crescimento de 1,81% na comparação com 2023, segundo dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea). Mesmo com toda essa pujança econômica, o setor agrícola recebe incentivos fiscais que vão desde a compra de insumos até a isenção da cobrança de impostos sobre exportação. Ainda assim, a mídia comercial, ligada ao agro, tem tratado de colocar na conta do governo a responsabilidade pela suposta — e relativa — incapacidade de armazenamento de alimentos no país.
Para Anderson Amaro, coordenador do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA), a posição do setor empresarial do agro revela a atuação parasitária que, tradicionalmente, esse grupo estabelece com o Estado.
“O agronegócio brasileiro, em especial, sempre foi um verdadeiro sanguessuga, parasitas. Ou seja, dependem, sempre dependeram e dependem do apoio e do subsídio do governo brasileiro, ou seja, do Estado brasileiro, dinheiro do contribuinte, dos trabalhadores e trabalhadoras que contribuem para o desenvolvimento de políticas públicas importantes no nosso país”, avalia.

Diego Moreira, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), considera que o agronegócio não vem fazendo os investimentos em infraestrutura consoante com o volume de crédito e financiamento público que acessam. O Plano Safra deste ano chegou aos R$ 516,2 bilhões em crédito em incentivos da agricultura e pecuária empresarial no Brasil.
“Então, ao mesmo tempo que você tem um investimento gigante, recorde do Estado brasileiro nesse setor, esse setor não corresponde com a construção de infraestrutura e a logística necessária para fazer com que essa mercadoria seja estocada”, avalia.
Tarifaço: é preciso fazer do limão, uma limonada
Por sua vez, o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, esclarece que a ampliação de compras públicas, prevista na medida provisória com medidas de enfrentamento ao tarifaço dos Estados Unidos a produtos brasileiros, não impacta a capacidade de armazenamento, por se tratarem, sobretudo, de alimentos perecíveis, que precisam ser consumidos em um curto espaço de tempo.
“Esses produtos perecíveis não são armazenáveis. Produtos perecíveis têm que ir direto para o consumidor final. Ou ele vai para o mercado interno, ou ele vai para alimentação escolar, ou ele vai para o Programa de Aquisição de Alimentos [PAA], ou ele vai para os hospitais, para as Forças Armadas, enfim, ele tem que ir direto, não pode ser armazenado”, destaca Teixeira.
Já Moreira acredita que esse é momento para que o governo fomente o mercado interno, promova a alimentação de qualidade e invista na pequena agricultura, que produz a maioria dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros.
“Nós estamos enxergando esse momento como uma oportunidade de fortalecimento do mercado interno, de construir uma política nacional de abastecimento. Esse debate não estava tão posto antes do tarifaço, agora ele vem para a mesa com muita força: a ideia de construir um programa de agroindústria para a agricultura familiar, para produção de alimento, a ideia de armazéns populares voltados lá para as cooperativas, lá no campo, e voltar a reestruturar os armazéns e a capacidade de armazenagem da Conab, para que ela possa se tornar essa grande estatal dos alimentos”, propõe o integrante do MST.
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