A Ocupação Povo Maravilha, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), completa um mês de resistência e mobilização com 200 famílias no Rio de Janeiro nesta próxima terça-feira (1º). Além da demanda por moradia, a ocupação evidencia que as pessoas mais vulneráveis foram excluídas das últimas grandes políticas urbanas da cidade.
Projetos de revitalização que ao longo dos anos não tiveram contrapartida de interesse social e, segundo a pesquisadora Taísa Sanches, do Observatório das Metrópoles, foram responsáveis “por uma enorme privatização de terras públicas” na região que abrange o centro e a zona portuária.
“Denominar a ocupação de Povo Maravilha é uma forma de demonstrar a exclusão da população mais pobre no projeto de cidade representado no [projeto] Porto Maravilha e centralizar o povo como eixo de qualquer política urbana”, afirma Sanches do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ) ao Brasil de Fato.
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Na última semana, a Justiça Federal adiou a audiência de reintegração de posse da ocupação Povo Maravilha para 17 de julho. Para Gabriel Siqueira, Coordenador Nacional do MTST, esse é um importante passo para avançar na negociação do terreno com a autarquia federal Docas S.A (PortosRio).
“A gente vem de um mês de mobilização e vitória, já tivemos uma reunião histórica com o prefeito Eduardo Paes em que ele disse a favor da construção de um empreendimento na Minha Casa, Minha Vida. Conquistamos uma mesa de negociação com as Docas para estudar viabilidade de permuta de terrenos no local para construir esse empreendimento, e agora conseguimos uma vitória judicial ao adiar a conciliação para que a gente tenha tempo de chegar até ela com uma proposta na mesa”, disse Siqueira.
Em entrevista ao Brasil de Fato, a pesquisadora Taísa Sanches, do INCT Observatório das Metrópoles, analisa que as mais recentes políticas de revitalização urbana na capital carioca resultaram em especulação imobiliária e exclusão.
A reportagem procurou a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico (SMDUE) para um posicionamento sobre os projetos urbanísticos. O texto será atualizado se houver retorno.
Leia a entrevista completa:
Brasil de Fato – Como avalia a importância dessa ocupação, especialmente na zona portuária do Rio?
Taísa Sanches – A ocupação é de fundamental importância, justamente por reivindicar o direito à moradia em uma cidade que não considerou projetos de habitação social em suas mais recentes políticas urbanas.
Ocupar a região portuária, especificamente, é uma forma de mostrar a toda população que um grande número de pessoas na cidade não tem acesso à moradia, e que os investimentos imobiliários realizados na localidade não consideram tais pessoas.
O Programa Reviver Centro, por exemplo, não impõe como obrigatória a construção de habitação de interesse social na área central da cidade, o que poderia ter sido realizado como contrapartida junto ao empresariado responsável pela construção dos novos empreendimentos, por exemplo.
Estudos recentes da rede Observatório das Metrópoles mostram que os empreendimentos construídos na área central são majoritariamente destinados a investidores que buscam receber renda de aluguel por temporada, aproveitando-se dos eventos cada vez mais comuns na cidade.

O próprio nome, Povo Maravilha, faz referência a um projeto que não acolheu a demanda por moradia popular na região.
A Operação Porto Maravilha, por sua vez, foi responsável por uma enorme privatização de terras públicas no Porto, sem nenhum retorno para a população mais vulnerabilizada.
Desta forma, a ocupação realizada pelo movimento social lança luz às desigualdades persistentes em nossa cidade, relacionadas especialmente a falta de acesso à moradia, direito fundamental dos cidadãos.
Ter acesso à moradia, um endereço, representa um passo fundamental para o acesso a uma grande gama de direitos. Neste sentido, denominar a ocupação de Povo Maravilha é uma forma de demonstrar a exclusão da população mais pobre no projeto de cidade representado no [projeto] Porto Maravilha e centralizar o povo como eixo de qualquer política urbana.

A proposta do MTST no terreno é de construir um empreendimento a partir do Minha Casa, Minha Vida Entidade, como avalia essa modalidade dentro do programa?
Esta modalidade representa uma vitória dos movimentos sociais e oferece a possibilidade de que ocupações sejam revitalizadas a partir das necessidades dos próprios moradores e de seu esforço coletivo.
Na cidade do Rio de Janeiro, temos exemplos bastante exitosos deste modelo, tais como a Ocupação Manuel Congo e a Ocupação Vito Gianotti, ambas localizadas na região central.
Como a política habitacional pode mudar esse cenário de déficit de moradia popular no centro da Rio?
A política habitacional deve incentivar a construção de moradias populares na área central da cidade do Rio de Janeiro, onde há infraestrutura consolidada, e reconhecer as ocupações existentes, oferecendo a infraestrutura necessária para que seus moradores tenham acesso a uma qualidade de vida digna.
O projeto Porto Maravilha e o Reviver Centro amargam a vergonhosa marca de entrega de zero habitações de interesse social até o momento, pelo poder público.
O post Ocupação do MTST completa um mês no centro do Rio: ‘povo no eixo da política urbana’, avalia pesquisadora apareceu primeiro em Brasil de Fato.