
O criador de animais Fernando Salomão, antes de uma das cirurgias de transplanto de rim que enfrentou na cidade de São Paulo.
Acervo pessoal
O quarto transplante de órgãos realizado pelo apresentador Faustão nesta semana, em São Paulo, levantou uma discussão sobre o motivo de uma pessoa já transplantada uma vez conseguir receber novos órgãos no Brasil com agilidade.
O protetor de animais Fernando Salomão, de 45 anos, desmistifica o debate. Ele passou por três transplantes de rins ao longo dos últimos 25 anos e deu um depoimento sobre o caso.
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Aos 20 anos, ele passou pelo primeiro procedimento. Uma infecção urinária maltratada comprometeu o funcionamento do rim e o colocou na fila dos transplantes, onde permaneceu por nove meses.
Os exames médicos concluíram que a mãe de Fernando, Maria Aparecida Fernandes, era compatível com o filho, e ela foi sua primeira doadora.
Atualmente, Maria tem 70 anos, uma vida ativa e nunca teve problemas de saúde em decorrência da doação.
Já o filho, Fernando, sofreu um AVC aos 30 anos e precisou novamente de um rim novo. Foi 1 ano e meio na fila novamente, que terminou com um final feliz e um novo rim.
Mas em 2019, durante a pandemia da Covid-19, foi contaminado, entubado e mais uma vez teve a falência do rim transplantado. Novamente, voltou à fila de espera por doadores.
Nesta última vez, foram 4 anos e meio de espera até receber o terceiro órgão. Ele explica que a espera foi grande porque, nesse intervalo, conseguiu se manter estável fazendo sessões de hemodiálise até quatro vezes por semana.
“É uma grande bobagem e uma falta de conhecimento quem acha que a espera por um órgão no Brasil depende do dinheiro que alguém tem. Graças a Deus, consegui três órgãos e tive outros amigos que também fizeram mais de uma cirurgia de transplante”, afirmou.
“Tudo depende da situação de saúde em que você se encontra. No meu caso, nesta última vez, eu fiquei quase 4 anos e meio na fila, mas porque a minha condição de saúde me mantinha vivo, bem de saúde e ativo com as sessões de hemodiálise que realizava por semana”, contou Salomão.
“Era uma vida dura porque não podia passar mais de três dias sem me ligar à máquina. Não podia viajar, ir para longe por mais de dois dias. Mas o que as pessoas precisam saber é que a nossa prioridade aumenta conforme a nossa condição de saúde piora. Transplantar vários órgãos não é coisa de rico, é de quem realmente precisa sobreviver e só tem esta opção para se manter vivo.”
E emendou: “No caso do Faustão, por exemplo, todo mundo que recebe um transplante de coração tem prioridade na fila de outros órgãos, porque é a única forma de manter essas pessoas vivas, caso elas necessitem. Na hemodiálise, conheci vários outros transplantados de coração que passaram pela mesma situação e, com o passar do tempo, nem a diálise resolveria o problema de não houve prioridade no transplante”.
Recuperação da 3ª cirurgia
Antes do terceiro transplante, Fernando Salomão fazia quatro sessões semanais de hemodiálise, por conta da falência dos rins transplantados anteriormente.
Reprodução/Redes Sociais
As três cirurgias de Fernando Salomão foram feitas no Hospital dos Rins na cidade de São Paulo, que é referência mundial nesse tipo de transplante.
O último órgão recebido por Salomão foi há cerca de cinco meses, de um doador geneticamente compatível de Sergipe. Tudo, a transferência do órgão, a cirurgia e o tratamento, foi bancado pelo SUS, segundo o criador de animais.
Desde então, ele precisa fazer acompanhamento a cada 15 dias na capital paulista, mesmo morando em Bragança Paulista, no interior.
Salomão se diz feliz com a nova oportunidade de viver. A longa espera pelo novo órgão fez com que ele valorizasse ainda mais o convívio com a família e seus mais de 300 animais, que recolhe de situações de abuso, violência e abandono.
“Nesses 25 anos, minha vida esteve seriamente em risco por três vezes. E o amor aos animais foi sempre a minha razão de viver e continuar esperando. Foi por eles e pela minha família, principalmente a minha mãe, que me deu um rim, que eu enfrentava as quatro sessões por semana de hemodiálise”, desabafou.
“É uma dádiva para mim, por Faustão, para os outros tantos transplantados no Brasil termos conseguido um órgão. No meu caso, três diferentes. E estar aqui para poder celebrar a vida. Não sou rico como o Faustão e também fui agraciado com as doações compatíveis. E isso é motivo para celebrar.”
Recuperação de Faustão
Faustão passa por transplante de fígado e retransplante renal em SP
O apresentador Fausto Silva, de 75 anos, foi submetido a dois novos transplantes de órgão na quarta-feira (7). Desde o início do seu tratamento de saúde, em 2023, foram quatro transplantes no total.
Desta vez, o apresentador teve um transplante de fígado e um retransplante renal realizados no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.
De acordo com o boletim médico, os órgãos, provenientes de um único doador, foram considerados compatíveis pela Central de Transplantes do Estado de São Paulo, que acionou a instituição para a realização dos procedimentos.
Faustão está internado no Einstein desde 21 de maio por conta de uma infecção bacteriana aguda com sepse.
Em agosto de 2023, ele tinha sido submetido ao primeiro transplante, de coração, que aconteceu no mesmo hospital e com grande sucesso. Seis meses depois, em fevereiro de 2024, ele teve que passar pelo primeiro transplante de rim. Nesta semana, ele passou por outro transplante de rim e também de fígado.
O apresentador Fausto Silva, o Faustão, em uma de suas internações em São Paulo para transplante de órgãos.
Reprodução/Instagram
👉 Esse quarto transplante de órgão a que Faustão foi submetido levantou curiosidade sobre como funciona a fila para os transplantes de órgãos no Brasil. Confira abaixo.
Como funciona a fila do transplante?
De acordo com o Ministério da Saúde, o país possui atualmente o segundo maior programa público de transplante de órgãos, tecidos e células do mundo, mas o grande volume de procedimentos faz com que a quantidade de pessoas ainda precise passar por uma lista de espera.
No ano passado, o país ultrapassou, pela primeira vez, a marca de 30 mil transplantes de órgãos e tecidos realizados em um único ano, de acordo com o Sistema Nacional de Transplantes (SNT).
Foram 30,3 mil procedimentos em 2024. Cerca de 85% dos procedimentos foram realizados pelo SUS, que destinou R$ 1,47 bilhão à área no ano passado — valor 28% superior ao de 2022.
Parte dessa marca histórica veio do estado de São Paulo, onde Fausto Silva mora.
Até esta quarta-feira (8), o Brasil já tinha feito 5.755 transplantes de órgãos em 2025.
O rim foi o transplante mais realizado (3.847), seguido pelo fígado (1.516) e coração fica em terceiro, com 248 transplantes realizado neste ano.
Na lista dos estados, São Paulo puxa com 1.166 feitos, seguindo de MG 430 e RJ 345 transplantes feitos no ano.
Transplante sendo realizado em hospital
Arquivo Pessoal
Quais são os critérios de prioridade?
A Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) aponta que a lista de espera dos pacientes gerida pelo SUS prioriza, entre outros fatores: a gravidade da doença e crianças, que são prioridade tanto em caso de o doador ser uma criança como quando concorrem diretamente com adultos.
A localidade do paciente e a compatibilidade genética também é outro fator importante na decisão de quem receberá o órgão, além do tipo sanguíneo do doador e do receptor dos órgãos.
A lista para transplantes é única e vale tanto para os pacientes do SUS quanto para os da rede privada, explica o Ministério da Saúde.
Segundo a pasta, “a lista de espera por um órgão funciona baseada em critérios técnicos, em que a tipagem sanguínea, compatibilidade de peso e altura, compatibilidade genética e critérios de gravidade distintos para cada órgão determinam a ordem de pacientes a serem transplantados”.
Quando os critérios técnicos são semelhantes, a ordem cronológica de cadastro, ou seja, a ordem de chegada, funciona como critério de desempate. Pacientes em estado crítico são atendidos com prioridade, em razão de sua condição clínica.
A pasta diz que são eventos determinantes de prioridade na fila de doação as seguintes situações dos pacientes:
a impossibilidade total de acesso para diálise (filtração do sangue), no caso de doentes renais;
a insuficiência hepática aguda grave, para doentes do fígado;
necessidade de assistência circulatória, para pacientes cardiopatas; e rejeição de órgãos recentes transplantados.
Confira o passo a passo da fila de transplantes
Veja abaixo o passo a passo de como funciona o processo de recebimento de órgãos na fila do SUS, segundo informações do Ministério da Saúde e da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos:
A lista funciona por ordem cronológica de cadastro, ou seja, por ordem de chegada;
Também é levado em consideração a gravidade do quadro – quem necessita de internação constante (com uso de medicamentos intravenosos e de máquinas de suporte para a circulação do sangue) tem prioridade em relação à pessoa que aguarda o órgão em casa;
Tipo sanguíneo – um paciente só pode receber um órgão de um doador que tenha o mesmo tipo sanguíneo que ele;
Porte físico – alguém alto e mais pesado não pode receber o coração de um doador muito mais baixo e magro que ele;
Distância geográfica – o órgão precisa ser retirado do doador e transplantado no receptor em um intervalo de até 4 horas, isso é chamado de tempo de isquemia, o tempo de duração deste órgão fora do corpo, ou seja: não é possível fazer a ponte entre duas pessoas que estejam muito distantes uma da outra.
O tempo de isquemia, inclusive, determina se um carro ou avião será usado para o transplante, com custos arcados pelo SUS;
Fila de transplante de órgãos passa de 50 mil pessoas pela primeira vez no Brasil
Faustão em foto de 2023
Reprodução/Redes sociais