O governo do estado de São Paulo terá que pagar multa no valor de R$ 2 milhões a título de danos morais coletivos, por incentivar adolescentes da rede estadual de ensino a trabalharem em atividades proibidas, em jornada além do permitido e a desvirtuar estágio.
Segundo uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), escolas públicas estaduais de Porto Feliz (SP) intermediaram a contratação de estudantes para trabalhar em empresas da cidade. Os contratos, no entanto, eram feitos sem o registro de menor aprendiz e com jornada de trabalho acima do permitido.
A investigação apontou que alguns dos jovens contratados exerciam atividades ilegais para pessoas menores de 18 anos.
As provas coletadas pelo Ministério Público do Trabalho revelaram que os estudantes trabalhavam nos ramos da construção civil, fazendas, mecânicas, indústria têxtil, marcenaria, empresa de borracha, e exerciam atividades como ajudante de caminhão, babá e cuidador infantil.
Ao menos três adolescentes de 15 anos que pediram mudança para o período escolar noturno trabalhavam sem contrato de aprendizagem e em jornada além do permitido (um deles com jornada de 10 horas diárias).
Além disso, o MPT constatou que as escolas fomentaram o desvirtuamento de estágio, uma vez que pelo menos sete adolescentes de 17 anos estavam trabalhando sem contrato formalizado.
No Brasil, a idade mínima permitida para trabalhar é de 16 anos. Na condição de aprendiz, os adolescentes podem trabalhar a partir dos 14 anos. Trabalho noturno, perigoso e insalubre são proibidos para menores de 18 anos.
“Nesse cenário ficaram evidenciadas as irregularidades, bem como o papel fundamental do Estado nas aludidas contratações realizadas ao arrepio da lei, ora atuando como intermediário, ora fomentando as contratações”, afirma o procurador Gustavo Rizzo Ricardo.
A decisão da justiça, determinada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, é em 1ª instância.
O juiz Valdir Rinaldi da Silva, do Juizado Especial da Infância e Adolescência (Jeia) de Sorocaba, também impôs ao réu a obrigação de averiguar, por ocasião de pedidos de alteração de turno escolar, a regularidade de contratações apresentadas por estudantes e familiares e comunicar aos órgãos competentes em caso de suspeita de irregularidade. A decisão deve ser divulgada em todas as escolas estaduais do Estado de São Paulo.
Porto Feliz fica a cerca de 100 quilômetros da capital paulista e tem pouco mais de 56 mil habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O município conta com cinco escolas estaduais.
A Diretoria de Ensino (DE) de Itu, responsável pela região, manifestou-se ao MPT, informando que as escolas estão inseridas em “contexto social/financeiro vulnerável”, e que “o salário do aluno tem sido a única fonte de renda para suprir carência alimentar” nas famílias, uma vez que muitos pais se encontram desempregados.
A DE pontuou ainda que “existe um processo mais elaborado para contratação de menor aprendiz e que não são todos os alunos que conseguem aprovação”, ficando responsável por fomentar a contratação de estudantes da rede pública por empresas de Porto Feliz.
Estado rejeita ajuste de conduta
Ainda de acordo com o MPT, a justiça propôs ao governo do estado a assinatura de termo de ajuste de conduta (TAC), mas o ente público manifestou desinteresse, justificando que a responsabilidade pela supervisão e acompanhamento do estágio é “compartilhada com os demais atores envolvidos em todo o processo”.
O estado informou ainda que enfatizou à Diretoria de Ensino da região de Itu para atuar com maior rigor e verificar se as empresas que aderiram ao estágio estão cumprindo com as obrigações.
“O Estado apenas se ateve à questão do estágio irregular e nada manifestou sobre as situações que estavam demonstrando exploração de trabalho infantil, mascaradas sob a roupagem da aprendizagem, além de trabalho proibido para menores de 18 anos”, finalizou o procurador.
O prazo para o cumprimento das obrigações impostas pela sentença é de 120 dias a partir da intimação do réu, sob pena de multa diária de R$ 5 mil por item. A indenização de R$ 2 milhões será destinada para projeto indicado pelo comitê de combate ao trabalho infantil do TRT-15. Cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.
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