Para analistas, racismo, cortina de fumaça e demonstração de força explicam intervenção de Trump em Washington

A justificativa alegada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para intervir na segurança pública da capital do país, Washington D.C., é vista como falsa por analistas ouvidos pelo Brasil de Fato. Enquanto o republicano afirma que a cidade vive onda de violência – desmentida por dados oficiais – os especialistas afirmam que um combo de racismo, demonstração de força sobre rivais políticos e a criação de cortina de fumaça explicam a atitude.

Na segunda-feira (11), Trump determinou o envio de 800 militares da Guarda Nacional para “limpar” Washington dos crimes das “gangues violentas”. Embora os números oficiais mostrem uma redução nos crimes violentos em Washington, os republicanos afirmam que esta cidade governada pelos democratas tem altos índices de criminalidade e de pessoas sem teto.

James Green, pesquisador estadunidense da Brown University, ressalta que a maioria dos moradores da capital dos EUA era composta por negros, da década de 1950 até 2011, quando figura em pouco menos de 50%. “E Trump é profundamente racista”, diz ele ao Brasil de Fato.

“Ele acha que o povo negro é inferior, tem mostrado isso em muitos momentos de sua trajetória.”

Green lembra a primeira vez que o atual presidente dos EUA virou manchete de jornais, quando em 1973, a Trump Management, empresa de sua família da qual ele era presidente, foi processada por discriminar negros que tentavam alugar algum de seus imóveis em Nova York.

Pablo Victor Fontes Santos, do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Rio de Janeiro (Uerj) disse que a história dos EUA é marcada por projetos de higienização ou eugenistas – de supremacia racial.

“Donald Trump pode maximizar o processo de manutenção desses grupos extremistas radicais supremacistas brancos”, afirma ele. A higienização proposta por Trump ficou evidente quando ele declarou que ‘Os sem-teto precisam sair imediatamente’ de Washington D.C. e ‘queremos nossa capital de volta’”, avalia Santos.

Para a BBC o diretor executivo da Coalizão Nacional para os Sem-Teto dos Estados Unidos, Donald Whitehead, disse que as pessoas em situação de rua são mais propensas a serem vítimas de crimes do que cometê-los. Mas, ao fazer o anúncio Trump disse que “também nos livramos das favelas (…) Estamos nos livrando delas. Sei que não é politicamente correto”, admitiu o magnata de extrema-direita.

Escândalo sexual

Outro motivo para a decisão seria desviar a atenção do escândalo sexual conhecido como Caso Epstein. Nesta semana, um juiz em Manhattan rejeitou o pedido do governo Trump para liberar transcrições de depoimentos do grande júri no caso Ghislaine Maxwell, cúmplice de Jeffrey Epstein.

A recusa em divulgar os documentos aumenta a pressão sobre o governo Trump, que já havia recuado de uma promessa de liberar novas informações sobre o caso. A morte de Epstein na prisão, em 2019, e suas ligações com figuras poderosas -incluindo Trump – , têm alimentado teorias da conspiração há anos.

O caso continua a gerar controvérsia e debate público, com o governo atual enfrentando críticas por sua falta de transparência em relação às investigações sobre Epstein e seus associados. A decisão judicial reforça a dificuldade em acessar informações relacionadas ao caso, mantendo em sigilo detalhes cruciais da investigação.

James Green diz que “Trump está na defensiva por muitas questões, entre elas o Caso Epstein, e ele está querendo desviar a discussão”. As repercussões do caso vêm rachando até a base trumpista, que exige respostas. Por isso os analistas apontam que Trump tenta driblar o constrangimento apresentando uma imagem de líder forte, que lida com firmeza com a segurança pública.

Recado para o presente e o futuro

As análises apontam que o magnata de extrema-direita pode, ao mesmo tempo em que manda um recado de truculência a adversários políticos, estar também preparando terreno para um possível golpe de Estado em 2028. O objetivo seria se manter no poder, caso não consiga mudar a Constituição para permitir um terceiro mandato (ele já exerceu um, entre 2017 e 2021).

“Talvez estejamos observando o nascimento de uma nova ordem, na qual os EUA não defendam mais o multilateralismo, mas, sim, o esfacele”, aponta Pablo Victor Fontes Santos.

James Green diz acreditar que Trump “esteja ensaiando o uso de forças controladas por ele, sejam tropas da Guarda Nacional na Califórnia, ou funcionários da imigração, para se defender caso ele tente mesmo permanecer no poder pela força”.

De qualquer forma, o anúncio de Trump é repleto de dados falsos – a criminalidade em Washington D.C. vem diminuindo, não aumentando, e não chega nem perto da proporção anunciada. “É parte da estratégia da extrema direita de confundir e falsear a História”, diz o professor da UERJ.

“Eles buscam com esses mecanismos avançar em agendas caras a estes que se reconhecem em Trump, grupo que envolve as Big Techs e que usam o discurso da liberdade de expressão ou da sua ausência para justamente reiterar sua política autoritária”, diz Pablo Victor Fontes Santos.

A intervenção federal em Washington D.C. deve durar ao menos um mês e o republicano disse que o modelo pode ser repetido em outras partes do país.

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